Comparado a materiais de origem fóssil, papel parece bem mais ecológico, porém também tem seu custo ambiental. Especialistas aconselham: ainda mais do que reciclar, a meta deve ser combater a cultura do descartável.
Por: Martin Kübler | Sarah Steffen | Crédito Foto: picture alliance / Bildagentur-online/Hermes Images. Especialista recorda: frutas já vêm bem empacotadas pela natureza
Fazer compras no supermercado envolve uma série de decisões, não só em termos de produtos, mas também de embalagem. Frutas e legumes aparentemente idênticos podem estar acondicionados em papelão ou plástico. É comum se pensar que o papel é melhor para o meio ambiente – mas há motivos para duvidar dessa percepção.
Num estudo de 2023, Tatiana Sokolova, professora associada da Escola de Economia e Gerenciamento Tilburg, na Holanda, confirmou que os consumidores veem embalagens de papel como “algo fundamentalmente bom”: “E é absolutamente verdade que papel é mais fácil de reciclar do que plástico. Mas isso não significa que não implique nenhum custo ambiental.”
O setor de polpa de celulose e papel foi responsável por quase 2% das emissões globais de gases causadores do efeito estufa em 2022, de acordo com a Agência Internacional de Energia (AIE), e essa percentagem deverá continuar subindo até 2030. E isso, sem considerar os efeitos do desmatamento.
E não se trata só da produção: Sokolova lembra que embalagens de papel em geral pesam mais do que plástico, portanto os caminhões emitem mais gases-estufa para transportar os artigos até as lojas. E dá mais um exemplo: “Em média, a gente pensa que os copos de papel são bem inofensivos para o meio ambiente. Mas, claro, para conter líquido, em especial líquido quente, eles têm que ser plastificados. Então são bem difíceis de reciclar.”
Maior parte do plástico não é reciclada
A produção de matéria plástica a partir de combustíveis fósseis, como o petróleo bruto, gera cerca de 3,5% das emissões globais de dióxido de carbono (CO2) e outros gases danosos ao clima. E das mais de 400 milhões de toneladas métricas produzidas a cada ano, menos de 10% são recicladas.
Em muitos casos, o lixo plástico da Europa e dos Estados Unidos é transportado por navio para países do Sul Global como Sri Lanka, Malásia ou Indonésia. E mesmo que existam instalações para reciclar papel e plástico, o processo não é assim tão fácil.
“O papelão tende a ser mais reciclável simplesmente porque há instalações para isso em mais locais”, comenta Llorenç Milà i Canals, diretor da Iniciativa Ciclo Vital do Programa Ambiental das Nações Unidas. “Enquanto para muitos tipos de plástico – não é um material único – temos muitos polímeros diferentes, e muitos deles não são reciclados em quase lugar nenhum.”
Polipropileno, poliestireno, polietileno: estas e outras variedades de plástico são materiais diversos, do ponto de vista químico, e têm seus próprios processos de reciclagem, explica Bethanie Carney Almroth, professora de ecotoxicologia e ciências ambientais na Universidade de Gotemburgo, na Suécia.
Um dos métodos mais comuns envolve enxaguar o plástico, fragmentá-lo em pequenos flocos e derretê-lo e fabricar novas pastilhas (pellets) para uso na indústria. “Mas o que a gente tem são esses materiais vindos de várias fontes”: analisando plástico reciclado do Sul Global, Carney Almroth e seus colegas encontraram não só uma miscelânea de substâncias químicas de diferentes plásticos, mas também outros contaminantes, potencialmente perigosos.
“Coisas como pesticidas, produtos farmacêuticos e aditivos alimentares não são substâncias que deveriam estar no plástico, e definitivamente não deveriam ser empregados em materiais para embalagem de alimentos”, enfatiza.
Há alternativas ambientalmente corretas?
Papel pode ser fabricado a partir de árvores cultivadas com responsabilidade, colhidas em florestas geridas e replantadas de modo a beneficiar o meio ambiente. Ou ser produzido inteiramente a partir de material reciclado, em vez de virgem.
Contudo, nem papel nem matéria plástica podem ser reciclados indefinidamente, e às vezes o produto resultante é de qualidade muito inferior ao original, maculado por impurezas como tintas ou contaminantes químicos. Plásticos de milho, açúcar ou resíduos de madeira são também alternativas atraentes, por terem uma pegada carbônica menor. Mas apresentam igualmente problemas.
“A indústria do bioplástico gostaria que ele fosse visto como a alternativa verde, a solução para a poluição plástica”, observa Carney Almroth. “Mas o problema que é às vezes ignorado ou minimizado é que também esses plásticos contêm produtos químicos.”
Substâncias potencialmente tóxicas são adicionadas durante o processo de produção, para estabilizar o plástico ou conferir-lhe determinadas características. Outras podem aparecer como contaminantes ou se formar durante o processamento industrial.
“Não sabemos o que elas são, porque há bem poucos requisitos de transparência e documentação”, e o mesmo pode ser dito das embalagens de plástico, ressalta a ecotoxicóloga. Há ainda outros defeitos, frequentemente ofuscados pelo brilho do que os críticos denominam greenwashing (lavagem verde). Entre eles, a extração das matérias primas, desflorestação, uso da terra e segurança alimentar, pois as safras destinadas aos bioplásticos ocupam terra que poderia estar sendo usada para cultivar alimentos.
Da reciclagem à reutilização
Com tantos fatores a considerar, não é fácil afirmar definitivamente quem é melhor do ponto de vista ambiental, se papel ou plástico. Porém esse dilema simplesmente mascara a questão supraordenada: uma cultura do descarte fora de controle.
“Por serem tão baratos, os plásticos são usados em muitos produtos descartáveis, eles não são projetados para serem reutilizados”, lembra Sokolova.
Em vez de se preocupar com a escolha de um material ou outro, os especialistas sugerem que seria melhor adotar embalagens reutilizáveis, como garrafas de vidro, ou, idealmente, apenas usar menos de tudo.
“Sempre haverá um jogo de vantagens e desvantagens”, diz Milà i Canals, seja nas emissões de gases-estufa, biodiversidade, poluição por microplástico, consumo de água ou incontáveis outros fatores.
“A escolha realmente importante é se distanciar dos produtos descartáveis e adotar os reusáveis. Ou não usar nenhum produto, onde for possível.” Isso inclui evitar os vegetais excessivamente embalados do supermercado, cita o colaborador da ONU: “As frutas já vêm super bem empacotadas pela natureza.”
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