Com entrada em vigor de nova lei, União Europeia tenta diminuir sua dependência em relação à China em materiais vitais para sua transição energética. Mas será que há dinheiro para isso?
Por: Mathis Richtmann | Crédito Foto: Felix Pauschinger/DW. Refinaria da AMG Lithium é apenas primeiro passo no difícil caminho para tornar a UE menos dependente da China
Em Bitterfeld-Wolfen, eles estão acostumados com o processamento químico. Mas uma refinaria de lítio é algo totalmente novo para o parque industrial da cidade situada no leste da Alemanha, que conta com mais de um século de história no setor químico. Seria a primeira refinaria do gênero em toda a Europa.
Enquanto a União Europeia (UE) se esforça para garantir suprimentos suficientes para suas indústrias necessitadas de recursos, a AMG Lithium se estabeleceu em Bitterfeld-Wolfen com o objetivo de desempenhar um papel crucial no plano da UE.
A subsidiária alemã da americana AMG Critical Materials N.V. quer construir uma refinaria de lítio para baterias, visando abastecer o nascente setor de baterias da Europa sem depender dos suprimentos chineses do mineral.
Stefan Scherer, CEO da AMG Lithium, disse à DW que a empresa conseguirá eliminar os intermediários chineses de sua cadeia de suprimentos de lítio até 2028, contribuindo para a ambiciosa meta da UE de se tornar autossuficiente em relação às chamadas matérias-primas críticas. Essas incluem lítio, fósforo e bauxita, assim como os chamados minerais de terras raras, como o nióbio, entre outros 34 elementos.
Estratégia para combater domínio chinês
Nesta quinta-feira (23/05), entrou em vigor a primeira estratégia abrangente de minerais da UE. Chamada de Lei de Matérias-Primas Críticas (CRMA, na sigla em inglês), a regulamentação estabelece referências claras para as capacidades domésticas ao longo da cadeia de suprimento de matérias-primas estratégicas. O objetivo também é diversificar o fornecimento da UE até 2030.
Do consumo anual da UE, pelo menos 10% devem ser extraídos internamente de dentro do bloco. Pelo menos 40% das capacidades de processamento e 15% das capacidades de reciclagem devem estar localizadas na UE. No geral, “não mais do que 65% de cada matéria-prima estratégica em qualquer estágio relevante de processamento deve ser proveniente de um único país terceiro”.
“Para competir geopoliticamente com outros grandes players, como a China e os EUA, é muito importante que o regulamento [CRMA] permita coordenar as necessidades e demandas de diferentes Estados-membros”, disse à DW Melanie Müller, associada sênior do Instituto Alemão para Assuntos Internacionais e de Segurança (SWP).
Atualmente, toda a demanda da UE por ímãs de terras raras, por exemplo, está sendo atendida por exportadores chineses. A China domina os mercados globais de metais por meio da própria mineração, mas principalmente pelo controle do processamento e do refino de matérias-primas.
Enquanto isso, a UE está considerando o domínio da China como uma ameaça às cadeias de suprimentos europeias e à transição verde de vários setores do continente.
Ao apresentar o projeto de lei em março de 2023, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, disse que uma base de matérias-primas domésticas confiáveis é “vital para a fabricação de tecnologias essenciais para nossa twin transition – como geração de energia eólica, armazenamento de hidrogênio ou baterias”.
Questão de tempo e dinheiro
Para aumentar a extração de minerais da UE dos atuais 3% para os desejados 10% até 2030, será necessário abrir uma série de novos locais de mineração.
Mas Alice Yu, analista da S&P Global Commodity Insights, disse à DW que leva “em média, 17 anos para desenvolver uma mina de lítio, desde a descoberta inicial até a entrada em produção”.
E Stefan Scherer, da AMG Lithium, estima que os custos totais de investimento para produzir hidróxido de lítio em uma nova fábrica variariam entre 500 milhões de euros (R$ 2,78 bilhões) e 1 bilhão de euros.
Mas Scherer disse que investir em projetos de commodities é difícil. O preço do lítio, por exemplo, caiu 80% desde 2022. “As pessoas estão muito, muito cautelosas ao investir em projetos de lítio neste momento, por causa do nível de preço atual”, disse ele.
Uma iniciativa conjunta da França, Itália e Alemanha está planejando levantar 2,5 bilhões de euros em financiamento inicial para apoiar projetos de recursos privados. Mas a especialista em commodities Alice Yu duvida que o dinheiro estatal, por si só, estimule os investimentos necessários.
“Se colocarmos esses fundos em perspectiva apenas para o lítio, teremos um investimento ao redor de 5 bilhões de euros apenas para cumprir a meta da UE para 2030”, disse ela.
E se a China decidir participar como investidor em projetos baseados na UE? “Até o momento, a UE tem sido colaborativa em relação ao investimento chinês em capacidade de produção de baterias na UE. Então, se formos analisar o refino de lítio, será que se procurará trabalhar com a experiência e o capital chineses nesse espaço também?”, acrescentou Yu.
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