Capital imobiliário avança sobre terra ancestrais, últimas remanescentes da Mata Atlântica do litoral baiano. Indígenas lutam para protegê-las, mas são alvos de milícias. Diante da omissão do Estado, buscam apoio político para a autodemarcação
Por: Alex Hotz | Crédito Foto: Commons.wikimedia.org.
Na região de Prado, Bahia, a Terra Indígena (TI) Comexatibá enfrenta um cenário alarmante de ocupação ilegal, onde empresários do setor imobiliário, com apoio de políticos locais, avançam sobre o território com o objetivo de construir condomínios e loteamentos. Em meio a pressões pela especulação imobiliária e exploração do solo, a TI Comexatibá se torna alvo de interesses comerciais que visam transformar áreas originalmente destinadas a projetos de reforma agrária em empreendimentos privados. Essa ação não apenas desrespeita a destinação original das terras, mas também coloca em risco um dos últimos remanescentes de Mata Atlântica preservada do litoral baiano.
De acordo com relatos na comunidade, um dos principais nomes associados a essa invasão é o vereador Brenio Pires, que utiliza sua influência política para promover seus empreendimentos na área. A denúncia também aponta a presença de empresários influentes da região, como André Moreira Gama, acusado de ordenar o desmatamento de áreas indígenas, além da extração ilegal de areia, o que ameaça nascentes de água essenciais para o ecossistema local e para as comunidades indígenas.
Ameaças ao Meio Ambiente e ao povo Pataxó
O território em questão serve como área de amortecimento para o Parque Nacional do Descobrimento – uma região reconhecida e nomeada de Maturembá pelo povo Pataxó. Essa área possui grande importância ambiental, protegendo espécies endêmicas da fauna e flora e contribuindo para a regulação climática de toda a região. A ocupação irregular e o desmatamento aumentam os riscos ambientais, intensificando a perda de biodiversidade e comprometendo os recursos naturais dos quais as comunidades indígenas dependem. Dessa forma, a necessidade de preservação ambiental vai além da comunidade local, sendo uma questão de interesse público para a manutenção do equilíbrio ecológico de toda a região.
O povo Pataxó tem lutado incansavelmente para proteger suas terras por meio de autodemarcações, em resposta à ausência de ações efetivas por parte das autoridades federais. A comunidade ressalta que o governo federal, através do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), precisa intervir com urgência para impedir a continuidade das invasões. Além disso, os indígenas reivindicam a celeridade na demarcação da TI Comexatibá para assegurar a integridade de seu território e evitar que as ações de especulação imobiliária continuem a avançar.
Conflitos e histórico de violência
O histórico de conflitos na região é marcado por episódios de violência extrema contra os Pataxó, que resistem há décadas para preservar seu território e modo de vida. Em 2022, o jovem Gustavo Silva da Conceição, de apenas 14 anos, foi assassinado durante um ataque armado à TI Comexatibá, um crime que chocou a comunidade e evidenciou a gravidade das ameaças que os indígenas enfrentam. Os ataques aos Pataxó são frequentemente organizados por grupos locais que defendem a ocupação das terras e utilizam redes sociais para incitar violência contra a comunidade, em uma campanha de intimidação que inclui até membros da segurança pública.
De acordo com lideranças Pataxó, esses ataques são parte de uma campanha sistemática de expulsão dos indígenas de suas terras, executada por uma associação de fazendeiros e empresários que visam transformar o território em áreas de monocultura e condomínios de luxo. A Polícia Federal já classifica essas associações como milícias, que utilizam violência e intimidação para afastar os Pataxó da TI Comexatibá.
“É uma tristeza para nós. Um menino levou um tiro no braço, que saiu do outro lado, e não morreu. Mas o outro correu e levou um tiro na nuca, a uns cem metros de distância. É um serviço profissional, que parece miliciano mesmo”, comentou de uma liderança Pataxó na época do ocorrido, que pede para não ser nominalmente identificado.
Urgência de apoio político para a autodemarcação
Para que o povo Pataxó continue a autodemarcação de suas terras e preserve seu território de invasões, é imprescindível o apoio político de toda a sociedade. A comunidade luta com recursos limitados para proteger suas terras e manter a vigilância constante contra as ameaças de invasores. Nesse contexto, o apoio da sociedade e das instituições é essencial para que a autodemarcação avance e para que os Pataxó consigam proteger a última área de Mata Atlântica preservada no litoral sul da Bahia.
É urgente que o governo federal agilize o processo de demarcação oficial da TI Comexatibá, reconhecendo formalmente o direito dos Pataxó sobre o território. Sem uma intervenção efetiva, a comunidade indígena permanecerá vulnerável, e o risco de destruição ambiental e conflitos violentos continuará a crescer, ameaçando tanto a vida dos Pataxó quanto a preservação de um bioma crucial para o equilíbrio ambiental da região e do país.
Publicado originalmente em: https://outraspalavras.net/terraeantropoceno/o-povo-pataxo-sob-o-signo-do-medo/
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