Por: Mariana Sanches | Crédito Foto: REUTERS/Kevin Lamarque. Trump anuncia novas tarifas de importação nos EUA
Depois de taxar o aço e o alumínio do Brasil, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, agora mira no etanol brasileiro.
Nesta quinta (13/2), a Casa Branca anunciou o que tem chamado de “tarifas recíprocas” e, para justificar a medida, distribuiu uma lista de países e produtos que estariam em condição “injusta” de comércio em relação aos americanos.
O primeiro item da lista é o etanol brasileiro.
“A tarifa dos EUA em etanol é de meros 2,5%. Já o Brasil cobra dos EUA tarifas de exportação de 18%. Como resultado, em 2024, os EUA importaram mais de US$ 200 milhões em etanol do Brasil enquanto exportaram apenas US$ 52 milhões ao Brasil”, diz o documento, que também cita produtos agrícolas da Índia e veículos e mariscos da União Europeia.
De acordo com Trump, mesmo parceiros e aliados “têm tirado vantagem” dos americanos nas trocas comerciais, o que ele pretende consertar com seu novo sistema de tarifas.
Segundo funcionários da Casa Branca, as tarifas serão customizadas de acordo com cada caso, país a país, produto a produto, e por isso o início da cobrança não é imediato, mas acontecerá no “tempo de Trump”, ou seja, em poucas semanas ou, no máximo, alguns meses.
Por enquanto, os órgãos administrativos americanos farão estudos para indicar taxas e medidas de barreira que prejudicariam a competição de produtos dos EUA ao redor do mundo e calibrar a resposta da Casa Branca.
“Para fins de justiça, vou cobrar uma tarifa recíproca, o que significa que qualquer coisa que os países cobrem dos EUA, nós os cobraremos de volta. Nem mais, nem menos. É muito simples”, afirmou Trump, no início da tarde, no salão oval, logo depois de assinar o memorando prevendo as “tarifas recíprocas”.
Segundo o funcionário da Casa Branca que explicou reservadamente à imprensa as implicações do anúncio, porém, Trump está disposto a abrir negociações com cada país e “ficará mais do que feliz de baixar as tarifas caso eles (países) queiram baixar as deles”.
Guerra comercial
Desde a campanha eleitoral, o republicano tem acusado os demais países de competição desleal e injusta em relação aos produtos americanos e tenta atrair indústrias de volta aos EUA ao impor tarifas de importação a produtos estrangeiros.
O anúncio de hoje é mais um passo na guerra comercial que Trump tem ameaçado detonar.
Ele já impôs uma tarifa global de 10% sobre produtos chineses e chegou a assinar uma Ordem Executiva que impunha taxas de 25% aos vizinhos México e Canadá, mas desistiu de implementá-las apenas horas antes da entrada das tarifas em vigor. Ao anunciar medidas contra o aço e o alumínio, no início desta semana, além da China, Trump atingiu México, Canadá, Brasil e Argentina, todos parceiros comerciais importantes do país.
Agora, parceiros como a União Europeia, Japão, Coréia do Sul e Índia, cujo primeiro-ministro, Narendra Modi, visitava a Casa Branca nesta quinta, também estão entre os alvos.
Trump se recusou a especular sobre as possíveis respostas dos aliados às medidas, mas afirmou que espera ver o retorno de “empregos” aos EUA.
“Os empregos vão crescer muito, teremos tremendos empregos, empregos para todos”, disse Trump, que afirmou não esperar ver preços mais altos por muito tempo por conta das medidas. “Vamos ver o que vai acontecer, preços podem subir e depois baixar”, afirmou. Ao lado do presidente, o secretário de comércio dos EUA, Howard Lutnick, afirmou que espera ver o aumento da produção nacional de industrializados.
Economistas temem o potencial inflacionário das medidas do republicano. Em janeiro, a inflação do país já reaqueceu, chegando a seu maior patamar desde agosto de 2023. A tendência, nestes casos, é que o Banco Central dos EUA siga mantendo juros mais altos para conter a subida dos preços.
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A resposta do Brasil
Embora o presidente brasileiro já tenha falado publicamente em reagir no mesmo tom, a negociação tem sido a via adotada pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva para tentar reverter as tarifas de 25% já anunciadas ao aço e ao alumínio do Brasil, e que devem entrar em vigor em março.
“Se Trump taxar os produtos brasileiros, vamos taxar de volta. Minha intenção é melhorar a relação com os EUA, tentando exportar mais. Trump precisa respeitar a soberania dos outros países”, disse Lula, há duas semanas.
Lula e Trump não se falaram desde a vitória eleitoral do republicano, em novembro passado. O presidente brasileiro enviou uma carta de cumprimentos ao republicano. Ambos os líderes já trocaram farpas públicas antes.
Em seu primeiro mandato, Trump já havia anunciado medidas contra o aço, o alumínio e o etanol brasileiros.
Na diplomacia brasileira, havia a expectativa de que o país ficasse para o fim da fila nas tarifas, já que os EUA têm superávit na balança comercial com o Brasil, um dos critérios que têm sido usados pelos conselheiros de Trump para definir os alvos do chamado “tarifaço”. De acordo com dado das Comissão de Comércio Internacional dos EUA, o país registrou saldo positivo de US$ 7,3 bilhões nas trocas com o Brasil em 2024.
A expectativa, no entanto, não tem se confirmado. O Itamaraty foi consultado pela BBC News Brasil sobre a nova medida contra o etanol, mas não respondeu até a publicação desta reportagem.
Segundo a Secretaria de Comércio Exterior (Secex), do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), em 2024, a exportação de etanol do Brasil sofreu uma retração de 24,5% em relação a 2023. E os EUA foram o terceiro destino mais frequente do produto brasileiro, atrás de Coreia do Sul e dos Países Baixos.
A BBC News Brasil entrou em contato com a União da Indústria de Cana-de-Açúcar e Bioenergia (Unica). Evandro Gussi, diretor-presidente da entidade, afirmou “lamentar” a decisão de Trump e disse que os EUA não são um “paraíso de abertura de mercado” como a Casa Branca diz.
“A tarifa de 18% (do Brasil sobre o etanol dos EUA) é uma tarifa que sequer é do Brasil, é uma tarifa do bloco Mercosul ,e fica muito aquém do que aquela que os EUA impõem ao açúcar do Brasil, que recebe uma alíquota de 100% quando entra lá”, afirmou Gussi.
Segundo ele, ao contrário do que parece indicar o atual governo americano, o Brasil segue comprometido com o combate às mudanças climáticas, no qual o etanol seria um elemento estratégico. E disse que a entidade tem discutido com a gestão Lula, especialmente com o vice-presidente Geraldo Alckmin, medidas de resposta à decisão americana.
Publicado originalmente em: https://www.bbc.com/portuguese/articles/c3609xj370ro
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