Pesquisas de opinião com alemães e italianos mostram que reputação dos EUA está em queda, enquanto confiança na China cresce. Reação à pandemia é motivo principal, mas figura de Trump incomoda. Como isso impacta na política externa
Por Noah Barkin | Tradução de Ricardo Cavalcanti-Schiel
Nas últimas semanas a mídia norte-americana vem bombardeando insistentemente que a pandemia de covid-19 teria aberto os olhos do mundo para a verdadeira natureza do regime chinês. Pode até ser verdade, mas na Europa é a resposta dos Estados Unidos à pandemia, e não a da China, que tem deixado profundamente aturdidos tanto os políticos quanto o público em geral.
Uma pesquisa recente da [semigovernamental] Fundação Körber, de Hamburgo, Alemanha, divulgada no dia 18 de maio, é a evidência mais recente. Os resultados são surpreendentes, e deveriam fazer parar para pensar aqueles que em Washington supõem que uma frente robusta e unida de países, liderada pelos EUA e contra a China, emergirá na esteira desta crise.
A pesquisa mostra que os alemães estão agora divididos praticamente por igual sobre ser Washington ou Pequim o parceiro mais importante para o país: 37% escolheram os Estados Unidos e 36% a China. Isso representa uma mudança significativa, em comparação com a última pesquisa da Körber, de setembro de 2019, quando os alemães deram aos Estados Unidos uma vantagem de 26 pontos percentuais sobre a China.
Isso não significa que os alemães estão dando um passe livre para a China. Cerca de 71% concordam que uma transparência maior do governo chinês teria reduzido o impacto ou até mesmo impedido a propagação da pandemia. No entanto, apenas 36% dizem que sua opinião sobre a China piorou, em comparação com 73% que manifestaram que sua apreciação a respeito dos Estados Unidos se deteriorou durante a crise.
O que isso significa? Primeiro, algumas advertências. Poucas pessoas esperam transparência do Partido Comunista Chinês (PCC). Elas têm nos Estados Unidos uma referência mais elevada e, assim, são mais sensíveis às decepções produzidas por Washington. Além do mais, a apreciação dos alemães sobre os Estados Unidos é das mais negativas na Europa desde que Donald Trump assumiu a Casa Branca. Assim também foi com George W. Bush. Só quando ele foi substituído por Barack Obama é que a opinião dos alemães retornou rapidamente para um patamar positivo. A opinião pública alemã sobre os Estados Unidos é volúvel e, com ou sem razão, é severamente influenciada por quem está sentado no Salão Oval [N. do T.: Note-se: essa é a visão de um jornalista norte-americano que circulou pelo mainstream da mídia comercial do seu país antes de ser bolsista, na Alemanha, em um think tank que faz parte da rede de fundações (semi)acadêmicas conservadoras alemãs encabeçada pela Konrad-Adenauer-Stiftung. O presente artigo, portanto, presta-se a ser um texto de alerta aos seus interlocutores americanos, e não necessariamente uma análise crítica de conjuntura].
“A atitude dos alemães em relação aos Estados Unidos já estava em queda livre antes da crise do coronavírus” ― comentou Nora Müller, diretora executiva de assuntos internacionais da Körber-Stiftung. “Dúvidas sobre a gestão da pandemia pelo governo Trump e uma perceptível ausência de liderança global por parte dos Estados Unidos obviamente agravaram esse distanciamento”.
De outra parte, os políticos alemães precisam considerar elementos mais amplos para balancear o relacionamento seja com Washington seja com Pequim. Os Estados Unidos são uma democracia que compartilharia valores essenciais com a Europa. A China, não. Os Estados Unidos [teoricamente] garantem a segurança da Alemanha e de outros países europeus há 75 anos. A China passou grande parte desse período preocupada consigo mesma.
Saiba mais em: https://outraspalavras.net/eurocentrismoemxeque/esse-e-o-inicio-do-seculo-asiatico/
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