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“Fanatismo moral contra o aborto é bandeira do bolsonarismo”

Referência na luta pela descriminalização do aborto, antropóloga Debora Diniz diz que “furacão do ódio” movimentado pelo bolsonarismo inflamou reação fanática em caso de menina estuprada. “É uma cultura de morte.”

No último domingo (16/08), uma criança de 10 anos, grávida, vítima de seguidos estupros desde os 6 anos, pôde finalmente passar pelo procedimento de aborto garantido pela lei brasileira em casos como esse, amparada por uma decisão judicial.

Não sem antes enfrentar um calvário adicional: fanáticos religiosos e antiaborto se juntaram em frente ao hospital para tentar impedir o procedimento, e médicos se recusaram a conduzir o aborto, forçando a menina a viajar para outro estado, onde finalmente realizou a operação. 

A gravidez foi revelada no início de agosto, quando a menina foi a um hospital em São Mateus, no Espírito Santo, queixando-se de dores abdominais. Foi quando relatou que começou a ser estuprada pelo próprio tio desde que tinha 6 anos e que não o denunciou porque era ameaçada. O homem foi indiciado por estupro de vulnerável e ameaça, e acabou preso nesta terça-feira.

O aborto é tratado como crime pelo Código Penal brasileiro, em uma lei de 1940, mas há ressalvas. Estupro e risco de vida estão definidos como exceções desde 1940, e uma decisão mais recente permite o aborto também em casos de anencefalia do feto. 

A DW Brasil conversou com a antropóloga e professora da faculdade de direito da Universidade de Brasília (UnB) Debora Diniz, uma das referências nacionais sobre o tema, para entender por que, mesmo com a lei que garante aborto nesses casos, torna-se difícil ter esse direito atendido. 

Debora Diniz, antropóloga e professora de direito da UnB
Debora Diniz, antropóloga e professora de direito da UnB

Para ela, a ascensão do extremismo de direita no Brasil alavancada pela eleição do presidente Jair Bolsonaro contribuiu para a reação violenta contra a iinterrupção da gravidez da menina de 10 anos. “A questão do aborto, que é uma questão de fanatismo moral, é uma das matérias centrais da eleição do bolsonarismo e desse furacão do ódio que foi movimentado pelas forças bolsonaristas para a eleição”, afirma.

Ela mesma conhece de perto o fanatismo e a violência antiaborto: há alguns anos, precisou deixar o Brasil sob ameaças, após defender a descriminalização em audiência pública no Supremo Tribunal Federal (STF). 

À época, a Corte discutia a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442, protocolada pelo Psol, que procura descriminalizar a interrupção da gravidez até a 12ª semana. Até hoje, o STF não fez o julgamento da questão. 

“Se essa ação já tivesse sido julgada e o aborto, descriminalizado, essa menina não teria passado por essa sequência de maus-tratos do Estado brasileiro”, afirma Diniz.

Saiba mais em: https://www.dw.com/pt-br/fanatismo-moral-contra-o-aborto-%C3%A9-bandeira-do-bolsonarismo/a-54612270

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