O novo presidente mexicano foi eleito em uma plataforma para acabar com a corrupção e combater a desigualdade. Mas ele não colocou o fim da violência desenfreada contra as mulheres como uma prioridade – o que é urgente, tendo em vista que o feminicídio aumentou 137% nos últimos 5 anos.
Por Lorena Rios Trevino/ Tradução Letícia Bergamini
O presidente Andrés Manuel López Obrador chegou ao poder em 2018 prometendo uma transformação do México após décadas de governo unipartidário e corrupção desenfreada. Ele prometeu democratizar o México e pôr fim às políticas neoliberais devastadoras que dominaram o país nas últimas décadas.
Em um país onde sete em cada dez vivem na pobreza, essa não é uma promessa pequena. Mas a visão do presidente, que coloca os desprivilegiados no centro, tem sido amplamente cega à violência que as mulheres mexicanas enfrentam regularmente. Os mexicanos são bombardeados diariamente com notícias de mortes e desaparecimentos violentos. Mas o assassinato de Ingrid Escamilla, de 25 anos, na Cidade do México em fevereiro, esfaqueada e desmembrada por seu parceiro, chocou o público depois que fotos de seu corpo esfolado apareceram na primeira página de um jornal local e circularam pelas mídias sociais. O vazamento e a publicação subsequente da foto de Escamilla – sob a manchete “Foi culpa do cupido” – provocaram mais indignação.
Feministas protestaram do lado de fora do Palácio Nacional – onde López Obrador realiza diariamente entrevistas coletivas pela manhã – cantando, pintando com spray e ateando fogo na porta da frente do palácio de quinhentos anos para exigir justiça a Escamilla e às mulheres que são assassinadas diariamente. Uma semana após o assassinato da jovem, o corpo de uma menina de sete anos foi encontrado dentro de um saco plástico depois de ser sequestrada e violentada sexualmente na saída da escola. As manifestantes exigiram uma posição clara do presidente, que descreveu o assassinato como “infeliz”, dizendo que as autoridades da cidade estavam investigando.
Em 10 de fevereiro, durante sua entrevista coletiva diária, o presidente convidou o procurador-geral do México para apresentar um enorme cheque de papelão que seu escritório havia recuperado de uma investigação de corrupção no valor de 2 bilhões de pesos. Em vez disso, os repórteres questionaram o procurador-geral sobre o projeto de lei para alterar a definição do que constitui um feminicídio. Mas o projeto de lei rapidamente se desfez devido à reação das feministas, que viram a proposta como uma eliminação, de fato, do feminicídio do código criminal, transformando-o em lesão corporal qualificada. Eles alegaram que este foi um retrocesso na luta mexicana pelos direitos das mulheres e no compromisso com a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, da ONU.
Obrador, claramente descontente, ordenou que os repórteres parassem. “Eu não quero que o único assunto de hoje seja o feminicídio“, disse ele, e prosseguiu com “a questão mais importante acima de tudo”: sua luta contra a corrupção e o crime de colarinho branco. Mas os feminicídios aumentaram 137% nos últimos cinco anos no México; dez mulheres foram assassinadas todos os dias no México em 2018. Em vez de detalhar medidas para acabar com a impunidade que resultam em apenas 3,2% de casos de feminicídio solucionados, Obrador alegou que os protestos eram um ataque orquestrado da oposição de direita.
Saiba mais em: https://jacobin.com.br/2020/05/na-metade-do-mandato-lopez-obrador-ainda-nao-conseguiu-combater-o-feminicidio/
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