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Queimadas na Amazônia estão ligadas a mais de 2 mil hospitalizações em 2019, diz relatório

Além dos danos óbvios à fauna e à flora da Amazônia e da contribuição para as mudanças climáticas, os incêndios no bioma, causados pela ação humana, colocam em risco um outro bem inestimável: a saúde da população.

Mariana Alvim

Este é o alerta de um relatório publicado nesta quarta-feira (26/08) pelas organizações Human Rights Watch, Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM) e Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS).

Para demonstrar os efeitos das queimadas na saúde, a análise mapeou hospitalizações relacionadas à poluição em municípios abrangidos pelo bioma em 2019 — ano que teve o maior pico em área desmatada desde 2017 e a segunda maior alta em focos ativos de incêndio desde 2016, de acordo com dados incluídos no relatório.

O trabalho calcula pelo menos 2.195 hospitalizações por doenças respiratórias relacionadas às queimadas, das quais 467 (21%) envolvendo crianças de 0 a 12 meses e 1.080 (49%) idosos com mais de 60 anos.

“A fumaça é repleta de material particulado, um poluente ligado a doenças respiratórias e cardiovasculares, assim como a mortes prematuras. Crianças e idosos, além de grávidas e pessoas com condições crônicas no pulmão e coração, são especialmente vulneráveis”, explica o documento.

Foi calculado ainda que, em agosto de 2019, aproximadamente 3 milhões de pessoas em 90 municípios da Amazônia foram expostas a níveis de poluição do ar acima do limite recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS); em setembro, o número cresceu para 4,5 milhões de pessoas em 168 municípios.

De acordo com os autores, incêndios não acontecem naturalmente na floresta amazônica — são instrumentos de desmatamento, muitas vezes ilegal, com a finalidade de liberar áreas para a agropecuária ou para a especulação fundiária.

E, segundo os autores, não é necessário estar muito perto da fumaça para que ela tenha efeitos negativos. “Os impactos na saúde de queimadas relacionadas ao desmatamento na Amazônia podem ser observados distantes dos focos de incêndio”, diz o trabalho.

Os números do relatório foram resultado de cálculos combinando informações do DataSUS, portanto incluindo apenas internações no Sistema Único de Saúde (SUS); a concentração de poluentes nos municípios, sobretudo o chamado PM2.5 (material particulado com diâmetro menor que 2,5 micrômetros, fortemente correlacionado a queimadas na Amazônia e com consequências para a saúde bem conhecidas na literatura), mas também CO, NO2 e SO2; e também o controle de dados sobre chuva, temperatura e umidade, para afastar a influência destas variáveis climáticas no resultado final.

‘Problema que pode ser controlado com medicação é piorado pelo meio ambiente’

Três bois no pasto, com fumaça atrás
Image captionGado perto de fumaça em Rondônia, em foto de 2019; na Amazônia, fogo é usado intencionalmente para abrir ou limpar terrenos

Na distribuição mensal de casos, o número de hospitalizações ligadas às queimadas foi menor entre janeiro e julho, quando normalmente há mesmo menos focos de incêndio e também condições climáticas menos propícias à ocorrência de doenças respiratórias — na região, é em maio, por conta da seca, que elas pioram.

As hospitalizações mapeadas começaram a crescer entre julho e agosto, ficando altas mesmo depois de outubro até o final do ano, “provavelmente por conta da contínua presença de poluentes no ar, assim como (a presença destes) nos pulmões e correntes sanguíneas de pessoas que inalaram a fumaça”, diz o relatório.

Os números são considerados conservadores, porque incluem apenas o sistema público de saúde e também porque possivelmente uma parcela relevante de pessoas afetadas pela fumaça não chega a buscar hospitais.

O relatório reconhece também que só é possível falar de uma correlação entre fumaça e doenças respiratórias, mas não uma causalidade — uma relação de causa e efeito, normalmente mais difícil de ser provada.

Mas, no trabalho, os dados foram reforçados por depoimentos de 67 profissionais de saúde, membros de governo e pesquisadores da Amazônia, escutados pela Human Rights Watch — que ficou responsável por estas entrevistas, enquanto o IEPS pelos cálculos sobre saúde e poluição e o IPAM, pela análise de dados sobre desmatamento e focos de incêndio.

“As condições são mais graves conforme a idade das crianças diminui”, disse aos pesquisadores o diretor associado de um hospital infantil, falando sobre pequenos com doenças pré-existentes. “Recém-nascidos prematuros e bebês usando suporte respiratório são muito vulneráveis.”

Uma médica de família atuando em Rondônia citou outros grupos vulneráveis que precisaram de atendimento: “Na emergência pediátrica e em unidades básicas de saúde, há um aumento na demanda de indígenas, crianças e idosos (com as queimadas). Para pacientes que já têm condições respiratórias, se torna exacerbado. Um problema que pode ser controlado com medicação é piorado pelo meio ambiente.”

Fabio Tozzi, que coordena um projeto de assistência em saúde para 15 mil indígenas e povos tradicionais no Pará, relatou casos de falta de ar, alergias, bronquite e asma. Indígenas são considerados particularmente vulneráveis à fumaça pela grande prevalência de doenças respiratórias nestas populações, e estas doenças são uma das principais causas de mortalidade infantil entre elas.

Saiba mais em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-53915037

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