”Eu gostaria de colocar um toque de recolher na mídia, mas isso não pode ser feito”, lamentou o presidente Alejandro Giammattei, à frente de uma violeta campanha repressiva. Profissionais protestam: ”ideias se debatem com ideias, não matando jornalistas”
Por Leonardo Wexell Severo
Entidades de profissionais da comunicação e de defesa dos direitos humanos denunciaram esta semana que são cada vez mais frequentes “as ameaças de morte, perseguições, roubos e assassinatos” de jornalistas na Guatemala. Conforme as organizações, a situação tem se agravado desde o começo da pandemia, pois o objetivo do presidente Alejandro Giammattei – que tomou posse em janeiro do ano passado – é fazer com que a população desconheça sua inoperância frente ao coronavírus, encobrindo os números reais de mortos e contagiados. E a corrupção que tomou conta.
Até dezembro de 2020, a Associação de Jornalistas de Guatemala havia registrado mais de 149 atos de agressão ou intimidação contra jornalistas e trabalhadores da mídia por agentes das forças de segurança, funcionários públicos e particulares. A denúncia da Human Rights Watch (HRW) e do Comitê para a Proteção de Jornalistas (Commitee to Protect Journalists – CPJ) de que estes ataques têm se dado com “uma retórica beligerante e falsas acusações” foram corroboradas pela Procuradoria dos Direitos Humanos.
“Desde que assumiu, há um ano, o governo de Giammattei tem atuado com hostilidade contra a mídia, inclusive limitando seletivamente seu acesso a informações importantes sobre a saúde pública”, condenou José Miguel Vivanco, diretor da HRW para as Américas, frisando que a existência de uma imprensa livre é fundamental para abordar com profundidade a pandemia, e imprescindível para melhor combatê-la.
Desde o começo do surto as entidades têm documentado inúmeros casos nos quais o presidente Giammattei, autoridades e membros das forças de segurança procuraram silenciar os jornalistas, simplesmente calando o contraditório. Foram registrados casos nos quais policiais e soldados vigiaram, detiveram, roubaram e agrediram repórteres que cobriam manifestações ou investigavam atos de corrupção.
Assassinato e impunidade
Em fevereiro, a locutora Irma del Carme Chinchilla, integrante da Rádio Quetzal, de Baja Verapaz, foi morta com tiros na cabeça por um desconhecido quando estava acompanhada da mãe e um de seus filhos.
Em março, o apresentador Bryan Leonel Guerra, do canal TL, faleceu vítima de um ataque armado que lhe deixou graves feridas no intestino, no fígado e no estômago. Vice-presidente da Rede de Comunicadores Sociais de Chiquimula, Bryan havia alertado as autoridades de que vinha sendo ameaçado. Mas nada foi feito.
Em agosto, após inaugurar uma página digital, o vice-presidente da Associação de Jornalistas e Comunicadores Sociais de Alta Verapaz, Otoniel Esaú Rivera, foi ameaçado de morte junto do filho por relatar as péssimas condições sanitárias do hospital onde esteve internado combatendo o coronavírus. Acompanhado do advogado, Otoniel entrou com uma denúncia no Ministério Público, pois os criminosos disseram que iriam buscá-los e deram detalhes de sua casa. Os dois vêm se protegendo e têm sobrevivido.
A mesma sorte não teve Mario Ortega, diretor e proprietário do San José Total Canal 12, em Puerto de San José, Escuintla, alvejado no rosto por dois homens que se aproximaram em uma motocicleta.
Também no final de novembro inúmeros jornalistas foram brutalmente agredidos durante as gigantescas manifestações para exigir a saída do presidente e contra os cortes no orçamento de 2021. Tudo ficou impune.
“Fazem todo tipo de intimidações por parte do governo central e amparado pela impunidade, espraiam esta conduta pelas administrações estaduais e municipais, reproduzida pelas chefias das transnacionais e das grandes empresas. São práticas que não ficam no campo penal, no roubo de equipamentos profissionais ou em campanhas de difamação. Extrapolam. Chegam a ameaças de morte e, no limite, ao assassinato”, declarou o coordenador do Observatório de Jornalistas da APG, Antonio Coloj. “São atitudes grosseiras, agressões, perseguições, ataques físicos e verbais por parte da Polícia Nacional e do Exército como nunca se viu há mais de uma década”, acrescentou.
E o mais grave, alertou Antonio Coloj, “é que o problema da repressão tem uma dimensão ainda maior, pois os números não são todos registrados devido ao medo dos profissionais”. Além disso, ponderou, “a ação do crime organizado faz com que os jornalistas se autocensurem e não abordem determinados temas nem sujeitos pelo temor da represália”.
O protesto dos profissionais ganhou o reforço da coordenadora de programas de América Central e do Sul para a CPJ, Natalie Southwick. Para a ativista internacional, “em vez de molestar os jornalistas ou de limitar seu trabalho, as autoridades deveriam se concentrar em investigar as ameaças contra a imprensa, proporcionar informação de saúde pública essencial e permitir que os profissionais trabalhem”.
Saiba mais em: https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Pelo-Mundo/Perseguicoes-ameacas-de-morte-e-assassinatos-de-jornalistas-na-Guatemala/6/50022
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