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O isolamento crescente de Bolsonaro

Por Paulo Kliass

Bolsonaro vai completar no final de março o 27º mês de um total de 48 previstos para a cumprimento de seu mandato presidencial. As pesquisas de opinião evidenciam um processo crescente de derretimento da popularidade em vários setores da sociedade brasileira. O ex-capitão tenta se equilibrar entre dois campos aparentemente inconciliáveis. De um lado, ele mantém o discurso autenticamente extremado para sua base forjada no direitismo negacionista, autoritário e intolerante. De outro lado, ensaia alguns recuos para se mostrar mais palatável e menos indigesto a quem ainda se dispõe a apoiá-lo em troca de algumas benesses de poder.

O encantamento inicial pode ser compreendido ainda lá atrás, a partir do próprio processo eleitoral de 2018 e do início de seu governo. Ao catalisar o sentimento pulverizado de insatisfação com a política de forma geral e o desgaste dos últimos anos de exercício de poder do Partido dos Trabalhadores, Bolsonaro consegue chegar ao segundo turno e atrair um importante apoio das elites empresariais, em especial daquelas mais diretamente vinculadas ao sistema financeiro. A presença de um operador do financismo com posição de destaque na elaboração de seu programa de governo colaborou para tanto. Ao nomear Paulo Guedes como o superministro da economia, Bolsonaro conseguiu neutralizar as restrições que se faziam sentir com relação ao seu passado autoritário e defensor de pautas como a tortura e a pena de morte.

O convite ao juiz Sérgio Moro para ocupar um Ministério da Justiça vitaminado pelos órgãos de segurança pública também serviu para estender pontes. Na verdade, tratava-se de um retribuição que o xerife da Operação Lava Jato recebia pelos “bons serviços” prestados às elites brasileiras e ao próprio presidente eleito. Isso porque todas as ilegalidades cometidas pela quadrilha de Curitiba contra Lula tiveram consequências pessoais, jurídicas e políticas muito graves, dentre elas o impedimento que o mesmo se candidatasse no pleito presidencial. Assim, pouco importava se a família do novo ocupante do Palácio do Planalto estivesse envolvida até o pescoço com a milícia e com a corrupção. O importante era que Guedes na economia e Moro na justiça iriam moldar a cara do novo governo. O presidente, ora, esse era apenas um mero detalhe incômodo nessa longa travessia. Triste ilusão ou avaliação equivocada?

Moro e Guedes: usados até o fim.

Porém, Bolsonaro foi conferindo ao seu governo a sua verdadeira marca. Aos poucos foi recheando a equipe de generais e oficiais de alta patente, aos mesmo tempo em que estabelecia os limites da autonomia inicialmente prometida para os 2 superministros. Moro rompeu a corda bem antes do previsto e saiu do governo em abril de 2020. Guedes segue à frente de sua pasta, mas boa parte de sua equipe inicial de auxiliares de segundo escalão já pediu demissão. Bolsonaro rompeu com sua promessa de uma “nova forma de fazer política” e se aliou ao fisiologismo do Centrão, apoiando candidatos do grupo para as presidências da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

A chegada da pandemia há um ano atrás mudou completamente o enredo incialmente previsto por ele. Manteve-se arraigado às loucuras de Trump e menosprezou as gravidade da pandemia. Trouxe o negacionismo de seu governo terraplanista também para o campo da epidemiologia. Conhecemos bem a trajetória do “é só uma gripezinha”, “é uma bobagem essa obrigatoriedade da máscara”, “hidroxicloroquina é um ótimo tratamento precoce”, “e daí?”, “não sou coveiro”, “me chamo Messias, mas não faço milagres”, “vamos deixar de mimimi” e todas as demais aberrações proferidas por ele contra protocolos das entidades de saúde pública e da própria OMS. O presidente trocou por 3 vezes o titular da pasta da saúde, depois de colocar um general que nada conhecia da área por longos 10 meses. Não por acaso Bolsonaro está sendo processado em tribunais internacionais e reage com perseguição policial e jurídica a todos que busquem associar ao seu nome o adjetivo genocida.

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