Possíveis cenários após assassinato de Jovenel Moïse vão da antecipação das eleições a um improvável Governo de coalizão. Tudo envolto numa espiral de violência desenfreada e sob o olhar atento dos EUA
Por David Marcial Pérez
O assassinato do presidente Jovenel Moïse mergulhou o Haiti num vazio de poder e num panorama de máxima incerteza. Apesar da longa história de desgraças e turbulências políticas enfrentadas pelo país caribenho, o último magnicídio ocorreu em 1915, precipitando a primeira ocupação estadunidense, que durou quase 20 anos. Após a morte a tiros do presidente Moïse nesta quarta-feira em sua casa, o primeiro-ministro, Claude Joseph, declarou estado de sítio no país, conferindo amplos poderes ao Exército.
Os diferentes cenários que se abrem a partir de agora vão da convocação antecipada das eleições até um improvável Governo de coalizão. Tudo envolto numa extrema fragilidade institucional, numa espiral de violência desenfreada e sob o olhar atento dos Estados Unidos. “Ainda não está claro quem liderará o Haiti”, reconheceu na tarde de quarta-feira o embaixador dos EUA, Bocchit Edmond.
O Parlamento haitiano foi parcialmente dissolvido em janeiro do ano passado, à espera de eleições presidenciais e legislativas convocadas para o próximo 26 de setembro, as quais Moïse não podia disputar para sua reeleição. Os pleitos haviam sido aprovados pela comunidade internacional como forma de buscar uma saída à enésima crise haitiana. Após o assassinato, a legislação prevê a convocação em 90 dias de novas eleições para renovar o Parlamento e a presidência. Apesar de o prazo ser posterior à data já marcada, crescem as dúvidas de que as eleições possam ser realizadas.
“Isso não ocorrerá. Não há um censo nem um tribunal eleitoral capaz de organizar as eleições”, afirma Eduardo Gamarra, professor da Universidade Internacional da Flórida (EUA). Consultor durante anos de diferentes Governos do Haiti, Gamarra descreve o panorama do país como uma “ausência total de autoridade e até mesmo de sociedade civil organizada”. Prova do caos institucional é a atual a convivência de dois primeiros-ministros: Claude Joseph, que exerce o cargo de forma interina desde abril, e Ariel Henry, nomeado por Moïse na última segunda-feira, mas que ainda não havia assumido de forma oficial.
A possibilidade de um Governo de concertação também parece remota. “Os partidos políticos não existem como tais no Haiti. Na verdade, há duas frentes”, afirma o cientista político Gamarra. Por um lado está o PHTK, de centro-direita, ao qual Moïse pertencia. Por outro, a corrente vinculada à esquerda de presidentes históricos como Jean-Bertrand Aristide, derrubado em até duas ocasiões com a colaboração dos EUA. Nesta corrente se encontra um dos principais opositores, Jean-Charles Moïse, afim ao chavismo. O petróleo venezuelano sustentou durante anos a precária economia haitiana até a ruptura recente do mandatário assassinado para se aproximar dos EUA.
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