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Whistleblower da CIA: “Julian Assange não receberá um júri imparcial”

Jeffrey Sterling, um ex-oficial da CIA e whistleblower, foi preso sob acusações forjadas pela Lei de Espionagem. Ele falou com a Jacobin sobre como ele foi vitimado – e, porque o tribunal distrital que o condenou certamente será contra o fundador do Wikileaks.

Uma entrevista com Jeffrey Sterling |Tradução Sofia Schurig

Jeffrey Sterling é um ex-oficial da CIA, whistleblower e graduado pela Washington University Law School. Após entrar com um processo de discriminação contra a CIA, Sterling foi, controversamente, julgado e condenado em 2015 sob a Lei de Espionagem de 1917 no Distrito Leste da Virgínia. Este mesmo ato agora está sendo usado para atingir o editor e jornalista Julian Assange. Caso o fundador do WikiLeaks seja extraditado para os Estados Unidos, ele também enfrentaria julgamento neste mesmo distrito.

Um orador farsi e oficial de operações clandestinas especializado no Irã, Sterling participou da Operação Merlin, um esforço da CIA aparentemente destinado a minar o programa nuclear daquele país. Mas quando se convenceu de que os protocolos de segurança não estavam sendo seguidos, Sterling levou suas preocupações aos membros dos comitês de inteligência do Senado e da Câmara.

Embora Sterling tenha agido de acordo com os procedimentos regulares de whistleblowers, os representantes falharam em agir de acordo com suas divulgações. No entanto, após ser demitido pela CIA, que ele diz ter sido uma retribuição por um processo de discriminação que moveu contra a agência, ele foi acusado de passar detalhes do fracassado plano da CIA para o então jornalista do New York Times, James Risen. Em seu livro Espião Indesejado: A Perseguição de um Whistleblower Americano [tradução livre], Sterling insiste que essas acusações, com uma potencial sentença de 100 anos, são parte de uma retaliação contra ele.

Nesta entrevista com Mohamed Elmaazi, Sterling – que estava entre os poucos oficiais afro-americanos da CIA – discute os acontecimentos que levaram ao seu processo por discriminação, como ele enfrentou a ameaça de prisão perpétua e suas críticas ao processo contra Assange. Sterling diz que sua própria experiência no Distrito Leste da Virgínia, e a de outros whistleblowers do governo, prova que o premiado jornalista e editor “não terá um júri imparcial” – e que sua possível extradição para os Estados Unidos significaria uma condenação certeira. A entrevista foi editada para maior clareza e concisão.


ME

Você poderia explicar brevemente o histórico de sua prisão, processo e condenação sob a Lei de Espionagem?

JS

Fui acusado pela CIA e meu governo de vazar ou passar indevidamente informações a um repórter com relação a uma operação que eu estava envolvido. A chamada Operação Merlin, projetada para frustrar o programa nuclear iraniano. Não fiz isso.

Demorou anos e anos. Fui demitido da CIA em 2002 – e, supostamente, a janela de tempo para a minha divulgação dessas informações foi em 2001 ou 2002. Só fui indiciado em 2010 e preso em 2011. Portanto, muito tempo se passou. Fui acusado e indiciado de acordo com a Lei de Espionagem por passar ilegalmente informações a um repórter e, finalmente, fui a julgamento em 2015 e fui condenado injustamente. Fui condenado a quarenta e dois meses de prisão, cumpri dois anos e meio.

ME

Existe a possibilidade de que a ação tomada contra você foi feita em retaliação pelo processo de discriminação que você moveu contra a CIA?

JS

Com certeza. Eu havia entrado com um processo de discriminação contra a CIA porque, como afro-americano, não tive as mesmas oportunidades que outros oficiais ao meu redor. Eu também entrei com um processo no tribunal federal contra a CIA, mas o governo e as cortes consideraram que, se meu processo fosse adiante, representaria uma ameaça à segurança nacional dos Estados Unidos.

Então, eu não perdi o caso; eu não tive permissão para seguir adiante. Tenho certeza de que as ações posteriores de me acusarem de vazamento de informações foram absolutamente em retaliação. Eu enfrentei a CIA, que me considerou como ‘muito grande e muito negro’, e que eu me destacaria como um orador Farsi e um risco de segurança.

Então eu vi um problema nisso, claro, e lutei contra eles. Não tive permissão para continuar, e por minhas ações e pela coragem de se levantar contra a CIA, eles tomaram uma retaliação final contra mim, me acusando de violar a Lei de Espionagem.

O ex-oficial da CIA e denunciante Jeffrey Sterling em 2016. (Eleivy / Wikimedia Commons)

ME

E, se entendi corretamente, nunca houve nenhuma evidência concreta ou específica de que você repassou informações. Sua condenação foi baseada no fato de que você recebeu ligações de James Risen, que, anos depois, publicou um livro sobre aquele programa fracassado da CIA, foi-se admitido que a conversa que você teve com Risen envolvia você passar informações.

JS

Com certeza. Aquelas conversas telefônicas não duraram nada mais do que um minuto e meio. Tive um contato anterior com James Risen, ele escreveu um artigo sobre meu processo de discriminação e, sim, durante o julgamento, não houve absolutamente nenhuma evidência de quando, onde e como transmiti essa suposta informação ao repórter. Curiosamente, fui ao comitê de inteligência do Senado para informá-los sobre minhas preocupações com a operação. Um dos indivíduos, que iria depor durante o julgamento, havia – depois de minha passagem no Senado – sido demitido do comitê de inteligência por vazar informações para um repórter. O repórter era o mesmo para quem eles me acusavam de vazar informações. Como eu disse, em várias ocasiões, a única coisa que eles provaram – que o governo provou – além de qualquer dúvida razoável durante aquele julgamento, foi de que eu era negro, e pronto. Isso foi o suficiente, em nosso sistema de justiça criminal, para me declarar culpado.

Saiba mais em: https://jacobin.com.br/2021/04/whistleblower-da-cia-julian-assange-nao-recebera-um-juri-imparcial/

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