Clipping

A natureza da luta

Porque ecologia sem uma perspectiva de classe, atenta ao povo que vive e trabalha na maior floresta do mundo, é pura jardinagem.

Por: Aline Kleins | Imagem: Da 4ª edição. Foto: Estúdio Alles Blau.

Quando escolhemos fazer uma edição sobre a Amazônia tínhamos bem definido o que seria central e o que não seria. A imensidão da maior floresta tropical do mundo, morada de cerca de 30 milhões de animais e 30 mil espécies de plantas, e berço da maior bacia hidrográfica do planeta, muitas vezes ofusca o verdadeiro coração de todas as questões.

O caminho mais curto para fazer essa edição seria rechear nossas páginas de denúncias aos infinitos ataques que o genocida sentado no Palácio do Planalto e seu capataz que ocupa o Ministério do Meio Ambiente desferem contra a floresta. De queimadas históricas ao aumento recorde de áreas ilegais destinadas ao agronegócio e ao garimpo clandestino, a boiada continua passando, como a recente aprovação na câmara do PL sobre mineração em terras indígenas demonstra.

“O espírito desta edição esteve em olhar para o coração da Amazônia: sua gente e suas lutas.”

Estamos assistindo a morte dos rios junto com lideranças populares, vítimas de assassinatos políticos. A violência no campo em toda região aumenta à galope. Neste edição, o leitor também vai encontrar artigos que retratam o lastro de destruição que Jair Bolsonaro e o Capital promovem na Amazônia. Não há maneira de ignorarmos a barbárie.

Para nós, o espírito desta edição esteve em olhar para o coração da Amazônia: sua gente e suas lutas. Repudiamos a compreensão neoliberal ambientalista, que quer nos fazer acreditar que a solução para salvar a floresta passa por diminuir ou até eliminar a presença humana. Os estudos demonstram a existência de nossa espécie em território amazônico há mais de 10 mil anos. Centenas de povos e culturas estão estabelecidas há séculos na floresta, e foram brutalmente perseguidas pelos invasores colonialistas.

O que nos diferencia do ativismo verde liberal, ou de influencer ambiental que faz postagens publicitárias em redes sociais, que acha que o problema da floresta são os seres humanos e que “sem o homem, a natureza irá se curar”, é que temos um inegociável compromisso de classe. O problema não são os seres humanos. O problema é o capitalismo. E só a classe trabalhadora pode oferecer uma solução.

Para nós, como para qualquer socialista, pensar nosso território com suas matas e rios, passa crucialmente por entender o povo que ali mora e reproduz a vida. Mais do que isso, entender sua história, lutas, feridas e sobretudo a relação que nossa gente tem com a terra que lhes pertence.

Nos Manuscritos econômicos-filosóficos (1844), Karl Marx já nos ensinava que não há separação entre a nossa espécie e a natureza – muito pelo contrário – ele afirmava que

“o ser humano vive da natureza. Isto significa que a natureza é seu corpo, com o qual ele precisa estar em processo contínuo para não morrer. Que a vida física e espiritual do ser humano está associada à natureza não tem outro sentido do que afirmar que a natureza está associada a si mesma, pois o ser humano é parte da natureza.”

Assim como na edição “Educação & Revolução” escolhemos observar a centralidade que Paulo Freire dava aos oprimidos e explorados, optamos por segui-lo quando diz que é preciso olhar “aos esfarrapados do mundo e aos que neles se descobrem e, assim descobrindo-se, com eles sofrem, mas, sobretudo, com eles lutam”. Queremos agora iluminar a luta hercúlea de todo povo amazônida. A começar pelos que perdemos, como Chico Mendes.

Tal qual o professor pernambucano, a luta vital do seringueiro acreano pelo povo e pela floresta foi um farol durante o nosso trabalho. Tentamos retratar o percurso de um dos maiores sindicalistas revolucionários do nosso país com enorme respeito a sua trajetória e com os ouvidos atentos de quem toma nota. Porque sua luta segue atualizada e necessária, urgente para as tarefas de nosso tempo.

“Só a luta incansável daqueles que mantém firme sua esperança no futuro, no socialismo e na classe trabalhadora poderá fazer com que triunfe a justiça dos oprimidos e explorados.”

A principal lição de Chico Mendes que tentamos aplicar na realização dessa edição é que é necessário agir. E agir no nosso tempo, com sentido de urgência. Construir alternativas, amplificar novas vozes de esperança. A floresta só poderá ser salva se for salva à sua gente. Cada ataque ou derrota nos custa caro.

Para dar cabo a essa tarefa buscamos as vozes do nosso tempo na Amazônia brasileira e latino-americana. Poetas, pesquisadores, sindicalistas e lutadores como Edmilson Rodrigues, histórico defensor da causa socialista e hoje prefeito de Belém do Pará, a capital da resistência. Esta edição não seria possível sem os socialistas que ali vivem e lutam.

Temos esperança que essas vozes sejam uma bomba incendiária nas mãos de nossos leitores. Que impulsione, a todas e todos nós, à ação coletiva transformadora. Só a luta incansável daqueles que mantém firme sua esperança no futuro, no socialismo e na classe trabalhadora poderá fazer com que triunfe a justiça dos oprimidos e explorados.

Também o destino da floresta dependerá disso: a luta para salvar o planeta é também uma luta de classes. É a construção concreta de um novo poder popular que nos possibilita sonhar com o dia em que – como escreveu o poeta amazônida Thiago de Mello – haverá girassóis em todas as janelas.

Vamos à luta. Adquira sua edição avulsa ou assine um de nossos planos e boa leitura!

 

 

 

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