Clipping

Catástrofes recentes são mesmo culpa do aquecimento global?

Estudos de atribuição tentam tirar a limpo a relação entre as alterações climáticas causadas pelo ser humano e eventos catastróficos que têm atingido diversas regiões do planeta.

Por: Stuart Braun | Créditos da foto: AFP/Getty Images. Inundações na Líbia: alterações climáticas elevaram em até 50 vezes probabilidade de cheias

Desde incêndios florestais de costa a costa no Canadá até grandes ciclones e inundações no Sul do Brasil e a catastrófica  cheia na Líbia, passando por ondas de calor no Hemisfério Norte, fortes eventos climáticos dominaram as manchetes nos últimos meses.

À medida que o planeta aquece por causa das ainda crescentes emissões de gases de efeito de estufa, as mudanças climáticas têm, em grande parte, levado a culpa por um aparente aumento de desastres climáticos.

“Os dias de cão do verão não estão apenas latindo: eles já estão mordendo. O colapso climático já começou”, disse António Guterres, secretário-geral da ONU, reagindo à notícia de que entre junho e agosto de 2023 estiveram os meses mais quentes já registrados no Hemisfério Norte.

Mas até que ponto uma onda de calor ou uma tempestade violenta pode ser atribuída ao aquecimento global, e quanto isso se deve apenas à variabilidade natural do clima?

A atribuição climática, uma ciência relativamente nova, procura responder essa questão. Seu objetivo é avaliar até que ponto as alterações climáticas causadas pelo ser humano, impulsionadas principalmente pela queima de combustíveis fósseis, aumentam a probabilidade e a intensidade de um evento climático extremo.

“Nenhum furacão é 100% causado pelas mudanças climáticas, mas é impactado por elas de muitas maneiras diferentes”, explica Delta Merner, cientista-chefe do centro científico para litígios climáticos da organização  Union of Concerned Scientists (União dos Cientistas Preocupados). “A ciência da atribuição pode nos ajudar a realmente descobrir o papel das alterações climáticas nesses diferentes eventos.”

Mudanças climáticas e o fogo no Canadá

Quando se espalharam da costa leste para a oeste, em meados de 2023, os incêndios florestais do Canadá queimaram quase o dobro da área do recorde anterior.

Em resposta, os investigadores da iniciativa World Weather Attribution (WWA), sediada no Reino Unido, realizaram um estudo tipicamente rápido para determinar até que ponto as alterações climáticas de origem humana aumentaram a probabilidade de um incêndio sem precedentes.

Focado na província do Quebec, o levantamento concluiu que as mudanças ajudaram a criar um clima seco e entre 20% a 50% mais “propenso a incêndios” do que a média, mais do que dobrando a probabilidade de incêndios extremos no leste do Canadá.

Incêndio em floresta em área de montanha durante a noite
Incêndios florestais canadenses de 2023 foram até 50% mais intensos devido ao aquecimento global. Foto: Darryl Dyck/The Canadian Press/AP/picture alliance

O clima mais quente e seco fez fez a neve derreter-se mais rápido, por exemplo, antecipando o início da temporada de incêndios e aumentando sua duração.

A WWA afirma que os avanços na modelagem climática e o melhor acesso aos dados meteorológicos aumentaram a confiabilidade e a precisão dos estudos para avaliar a probabilidade de eventos climáticos extremos com ou sem mudanças climáticas.

Mudanças não influíram nas cheias italianas

A crise climática nem sempre pode ser diretamente responsabilizada por fenômenos meteorológicos extremos. Em maio de 2023, na região de Emília-Romagna, no norte de Itália, três tempestades provocaram deslizamentos de terra generalizados e inundações consideradas as piores em um século.

Mas embora a subida das águas se alinhe com a maior incidência, em nível mundial, de condições meteorológicas extremas provocadas pelo clima, os pesquisadores concluíram ter-se tratado de um evento isolado.

Depois de analisar os registros de precipitação na Emília-Romagna, datando desde 1960, cientistas, incluindo Friederike Otto, climatologista do Imperial College London e cofundadora da WWA, concluíram que as chuvas da primavera na região não estão se tornando nem mais nem menos intensas com as mudanças climáticas.

Ou seja: esse período específico de chuva de 21 dias – único num período de 200 anos e com apenas 0,5% de probabilidade de acontecer anualmente – poderia ter ocorrido com ou sem mudanças climáticas.

As inundações foram causadas por condições climáticas únicas e incomuns, “impulsionadas por uma sequência sem precedentes de três sistemas de baixa pressão no Mediterrâneo central”, explicou o autor do estudo Davide Faranda, pesquisador do Instituto Pierre-Simon Laplace.

 

Veja em: https://www.dw.com/pt-br/cat%C3%A1strofes-recentes-s%C3%A3o-mesmo-culpa-do-aquecimento-global/a-66952702

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