Grupos varejistas, ativistas e até a UE vêm defendendo a retirada de itens do Brasil das prateleiras em resposta à política ambiental do governo Bolsonaro. Há 14 anos, boicote semelhante desencadeou a moratória da soja.
Diante de medidas recentes do governo do presidente Jair Bolsonaro, organizações não governamentais e redes varejistas europeias vêm endurecendo o discurso a favor do boicote a produtos agroalimentares brasileiros. De um mês para cá, movimentos do tipo têm ocorrido na Alemanha e no Reino Unido. No ano passado, houve boicote também na Suécia. Fora da Europa, uma organização nos Estados Unidos pede medidas semelhantes.
Nesta sexta-feira (19/06), a Comissão Europeia, órgão executivo da União Europeia (UE), anunciou querer uma estratégia mais incisiva para evitar que produtos oriundos de áreas de desmatamento na Amazônia cheguem a prateleiras dos supermercados de países do bloco.
A situação preocupa o governo brasileiro. Em junho do ano passado, no contexto da comoção internacional decorrente das queimadas na Amazônia, o Itamaraty enviou circular às embaixadas solicitando informações a respeito de eventuais boicotes sendo observados em outros países.
Pouco antes, em 27 de maio de 2019, a Embaixada do Brasil em Estocolmo, na Suécia, havia reportado ao governo Bolsonaro que a rede de supermercados Paradiset tinha decidido retirar os produtos de origem brasileira de suas prateleiras em decorrência da aprovação, nos cinco primeiros meses da gestão Jair Bolsonaro, de 169 novos pesticidas pelo Ministério da Agricultura – um recorde desde 2005.
Neste ano, entre 20 e 25 de maio, o tema voltou à tona nos telegramas de embaixadas brasileiras. Mensagens emitidas pelos postos de Roma, na Itália, e Londres, na Inglaterra, observaram o surgimento de novos movimentos de boicote a produtos nacionais. Uma dessas cartas afirmava que o veto a produtos brasileiros por redes britânicas de supermercados – e filiais de empresas alemãs no Reino Unido – estava condicionado à aprovação do Projeto de Lei 2633 (antiga Medida Provisória 910), o chamado “PL da grilagem”, que prevê regularização fundiária de terras ocupadas da União.
Outro telegrama citava um estudo realizado pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), que prevê que a medida, se aprovada, aceleraria o desmatamento de 11 mil a 16 mil quilômetros quadrados da Floresta Amazônica. A mesma carta informava que as redes inglesas de supermercados podem se sentir compelidas a aderir a um boicote, se o Brasil aprovar uma legislação que propicie o aumento do desmatamento.
Os documentos enviados ao Itamaraty citavam uma carta, publicada em 19 de maio e assinada por 47 empresas, grupos e associações empresariais com operações do Reino Unido – entre os signatários, companhias como Burger King e Tesco. Direcionada aos deputados e senadores brasileiros, o texto citava os incêndios florestais recordes do ano passado e informava estarem os empresários “profundamente preocupados” com o “PL da grilagem”.
A carta encerrava com uma ameaça velada de boicote. “Queremos continuar a buscar e investir no Brasil […] Instamos o governo brasileiro a reconsiderar sua posição e esperamos continuar trabalhando com parceiros no Brasil para demonstrar que o desenvolvimento econômico e a proteção ambiental podem caminhar juntos.” Conforme telegrama enviado ao Itamaraty, os signatários da carta representam 96,8% dos varejistas britânicos.
Em 9 de junho, o cenário ganhou novo episódio. A ONG alemã Campact lançou uma petição online pedindo que redes de supermercados boicotem produtos brasileiros se o “PL da grilagem” for aprovado. Conforme afirmou à DW Brasil a ativista Svenja Koch, da organização, até a manhã desta sexta-feira, 360 mil assinaturas foram coletadas para a petição.
“Duas redes de supermercados alemãs já assinaram: Aldi Süd e Rewe”, relata. “Pedimos que as diretorias das grandes redes de supermercados alemãs sigam o exemplo de muitos varejistas do Reino Unido e assinem uma carta aberta ameaçando boicotar produtos do Brasil se o PL for em frente.”
Ela vislumbra que as cinco grandes redes de supermercados da Alemanha participem, o que significaria 70% do mercado. “Eles são poderosos, e a decisão deles influencia o comércio internacional”, comenta.
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