“Crianças pequenas podem ter atitudes racistas?” Com essa pergunta, uma escola pública iniciou, em 2011, uma reformulação no seu projeto de ensino, para rever pequenas (e grandes) atitudes cotidianas que pudessem reforçar o racismo.
Paula Adamo Idoeta
A mesma pergunta foi repetida pela mesma escola agora, em uma postagem nas redes sociais voltadas a seus seguidores e às famílias dos alunos, em meio à suspensão das aulas presenciais por conta da pandemia — e, principalmente, em meio a uma onda global de protestos e reflexões sobre o racismo, motivadas pela morte, por um policial branco, do negro George Floyd nos EUA.
Nas duas ocasiões, a conclusão da equipe da Escola Municipal de Educação Infantil (Emei) Nelson Mandela, é de que, apesar da percepção de que crianças pequenas seriam incapazes de praticar atos discriminatórios, elas crescem “em uma sociedade estruturalmente racista e que reproduz essa lógica em diversos espaços e situações (do universo infantil): na TV, na internet, nos brinquedos, filmes, desenhos e nas relações”.
Assim, as crianças podem, sem perceber, replicar essa mesma lógica em suas relações, dizem os educadores.
Considerada hoje referência em educação antirracista, a Emei Nelson Mandela (que abriga 212 alunos de 4 a 6 anos no bairro do Limão, zona norte de São Paulo) só conseguiu criar estratégias para discutir e combater o racismo na escola depois de olhar a si própria no espelho, nas palavras da ex-diretora Cibele Racy, que deu início, em 2011, às discussões sobre o tema com sua equipe.
“Fizemos uma análise individual de o que cada um de nós fazia ou poderia fazer”, explica Racy à BBC News Brasil. “Como a equipe de professores se relacionava com as equipes de limpeza e de cozinha? Havia racismo nessas relações? Porque, por menos que a gente queira admitir, a gente replica atitudes racistas. E não é possível combater o racismo sem admitir que você mesmo pode ser racista.”
A discussão foi embasada em uma lei de 2003, que tornou obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileiras nas escolas públicas e particulares de todo o país.
De estereótipos enraizados e brincadeiras como escravos-de-jó e “barra manteiga na fuça da nega” até situações em que equipes de limpeza (formadas em sua maioria por mulheres negras) eram colocadas em posição de subserviência, Racy e seus colegas se dispuseram a rever toda a prática da escola que pudesse ter resquícios racistas
“Muitas vezes, o professor se achava no direito de sujar a sala porque sabia que alguém ia limpar. Professoras negras não sentiam que tinham espaço para trazer seus saberes. Fizemos toda essa reflexão antes mesmo de começar a trabalhar o tema com as crianças.”
Saiba mais em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-53141863
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