Por Paulo Kliass
A mudança recente promovida por Bolsonaro na sua relação com o Congresso Nacional implicou a aplicação de um verdadeiro estelionato em seus apoiadores mais autênticos. Afinal, todos nos lembramos das promessas de montar uma nova forma de fazer política, nunca mais ceder às pressões do toma-lá-dá-cá e outras tiradas típicas de quem busca o voto dos incautos. Pois mal passou o primeiro biênio de seu mandato e lá se jogou o ex-capitão de peito aberto nas mãos da sopa de letrinhas do fisiologismo. Mas, apesar de tudo, o fato concreto é que ele conseguiu eleger os candidatos que apoiou na disputa das presidências da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
No entanto, a simples presença de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco no comando das duas casas do poder legislativo não é garantia de muita coisa. As conturbações da crise econômica e política, para além da catástrofe na condução da pandemia, não facilitam a vida do Palácio do Planalto. Por mais que Lira e Pacheco sejam simpáticos às pautas propostas por Bolsonaro e Paulo Guedes, as respostas vindas da base parlamentar não permitem um alinhamento assim tão automático com cada um dos inúmeros desejos do Executivo. O centrão sabe muito bem o valor de seu apoio e cobra muito por ele. Aliás, quanto mais combalido estiver o governo de plantão, melhor para as práticas conhecidas de extorsão sofisticada. Até mesmo para o caso em que vier a abandoná-lo, logo depois ali na esquina, tanto mais quando agora as pesquisas de opinião evidenciam a queda de popularidade do governante e começam a jogar luz sobre a alternativa Lula nas eleições de 2022.
Apesar da gravidade da situação e da emergência que o momento exige, o parlamento levou quase 3 meses a mais do que as regras estabelecem e não cumpriu o prazo que a Constituição lhe dá para aprovar a Lei do Orçamento Anual (LOA). Ao invés de votá-la até 31 de dezembro, deixou a coisa enrolar e só aprovou a peça em 25 de março passado. Além disso, a Comissão Mista do Orçamento e o plenário do Congresso aceitaram de forma passiva todos os constrangimentos oferecidos pelo governo na proposta que lhes foi encaminhada pelo superministro da economia. Afinal, para o arauto da austeridade a qualquer custo, a política econômica dever estar a serviço dos interesses do povo do financismo e não se preocupar com essas “bobagens” como reduzir desemprego, combater a inflação para a população de renda mais baixa, assegurar recursos para vacina, destacar verbas para auxílio emergencial e similares.
EC 95 e as amarras fiscais.
É importante lembrarmos que o Brasil está desde dezembro de 2016 sob o jugo mortal da EC 95, emenda constitucional em que foi transformada a tristemente famosa PEC do Fim do Mundo. Por meio daquela engenhosa criação vampiresca de Temer & Meirelles, o país está proibido de promover aumentos nas despesas orçamentárias não-financeiras por longos 20 anos. Ali foi criado, por meio de um quase eufemismo, o que se convencionou chamar de Novo Regime Fiscal. Assim, caso nada seja feito, até 2037 estará ainda imperando por aqui o teto de gastos e o congelamento de todas as rubricas do orçamento, com exceção daquelas que se destinam ao pagamento de juros da dívida pública. Uma loucura!
Assim, Guedes optou por continuar seguindo à risca tal norma do austericídio. Para ele, pouco importa se estamos atravessando a maior fase recessiva de nossa História. Assim como não é nada relevante a profundidade e o ineditismo da crise provocada pela pandemia. O fundamental para esse pessoal do universo das finanças é tão somente não desrespeitar a tal da sacrossanta “responsabilidade fiscal”, como se não houvesse nenhum mandamento quanto aos governos serem responsáveis também na “política social”, por exemplo.
O orçamento finalmente aprovado mantém as restrições de não crescimento para a grande maioria das despesas não-financeiras, mas abre duas exceções. Os gastos envolvidos nas atividades do Ministério da Defesa foram beneficiados com aumentos e os parlamentares introduziram autorizações para proporcionar a elevação também do montante de recursos destinados às emendas de sua autoria. Bingo! Ora, diante de um quadro da rigidez injustificável imposta pela EC 95, a forma definitiva da matéria votada tem criado muitas polêmicas e constrangimentos para todos os gostos.
Saiba mais em: https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Economia-Politica/Austeridade-pandemia-e-orcamento-de-2021/7/50295
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