Clipping

‘A alternativa para os próximos 20 anos é uma forma sustentável de capitalismo, que não será vista como capitalismo’

Um grande ponto de interrogação se coloca sobre o mundo neste momento: o que vai acontecer depois da pandemia de covid-19?

Juan Carlos Pérez Salazar

A pergunta recai sobre as coisas mais mundanas e concretas — como quando voltaremos a dar as mãos ou abraçar nossos amigos — até as mais abstratas e aparentemente mais distantes: nossas liberdades individuais serão afetadas? Será o fim da globalização? O que acontecerá com o capitalismo?

Esta última parece ir ao cerne do momento que vivemos atualmente. O capitalismo é mais uma vítima da crise ou seu causador? Como o sistema deve mudar para se adaptar a novas realidades? Há apetite para uma mudança desse porte entre as classes dirigentes e os empresários?

O britânico Paul Mason dedicou parte da vida para refletir sobre o capitalismo. Como jornalista, cobriu parte das grandes crises econômicas e dos movimentos sociais das últimas décadas.

Como intelectual, além de um livro de ficção e uma peça de teatro, escreveu sobre os mesmos temas: a classe trabalhadora, a crise financeira de 2008 e os diferentes protestos globais como a Primavera Árabe, Ocuppy Wall Street e os “indignados” da Espanha.

Mas fora suas últimas obras — PostCapitalism: A Guide to Our Future (“Pós-capitalismo: Um guia para o nosso futuro“, editado pela Cia das Letras) e Clear Bright Future: A Radical Defence of the Human Being (ainda sem edição no Brasil) — que o tornaram um nome conhecido internacionalmente, envolvido em vários debates sobre o estado atual do capitalismo e seu futuro.

A BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, conversou com Paul Mason em Londres, onde ele vive.

Ilustração de pessoas pedindo socorro durante a peste negra, por volta de 1350
Image captionA peste negra foi a epidemia que mais matou na História

BBC – Em um artigo recente, o senhor traça um interessante paralelo entre o que acontece hoje e o que aconteceu depois da epidemia de peste negra, no século 14, que marcou a transição do feudalismo para o capitalismo.

Paul Mason – Um dos temas do meu trabalho é que, como o feudalismo, o capitalismo tem um começo, um meio e um fim.

Em meu último livro (Clear Bright Future: A Radical Defence of the Human Being), digo que o fim de um modo de produção de um sistema econômico é com frequência uma mistura de suas fraquezas internas com o que chamamos de “choques externos” ou exógenos.

Então, para nós, a mudança climática se manifesta como um choque exógeno, porque o único capitalismo industrial que conhecemos está baseado na extração de carvão e na destruição da biosfera.

É possível que, em um universo paralelo, o capitalismo tivesse se desenvolvido a partir da energia limpa e em harmonia com a natureza, mas não foi assim.

Há ainda a questão do envelhecimento populacional, que possivelmente levaria à falência 60% dos países até meados deste século porque não haverá gente o suficiente para sustentar uma população envelhecida.

O coronavírus é outro fator que parece ser um choque externo.

Mas meu argumento é que, ainda que todos pareçam choques externos, na realidades são produzidos pelo próprio capitalismo.

Esse é o problema: o tipo de capitalismo que temos destrói as florestas tropicais e cria condições para que milhões de pessoas vivam em situação vulnerável.

E no mundo desenvolvido — provavelmente não tão óbvio para alguns leitores na América Latina — ele tem criado “doenças da pobreza”. Há muita gente morrendo de obesidade em Londres, com diabetes tipo B ou enfermidades nos pulmões porque fumou a vida inteira.

O paralelo que faço com a peste negra é limitado, mas vale a pena ser explorado, porque a epidemia foi responsável por duas coisas: primeiro, interrompeu o modelo econômico do feudalismo porque não havia componeses para cultivar a terra.

E nas cidades não havia pessoas o suficiente que soubessem trabalhar com o que era a principal matéria-prima da época, a lã. Nas revoltas que eclodiram depois da peste negra, sempre houve participação dos trabalhadores que manufaturavam a lã.

Saiba mais em: https://www.bbc.com/portuguese/geral-53342522

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