Nos 150 anos do conflito brutal, completados em janeiro, os vitoriosos silenciaram. Brasil, Uruguai e Argentina, em “tríplice aliança” oligárquica e imperial destroçaram — com o providencial apoio da Inglaterra — uma Nação que se democratizava…
No final de janeiro de 1870, uns setecentos soldados, os restos do exército paraguaio, semi-desarmados, marchavam por entre as matas semi-desabitadas do norte do país, sob chuva torrencial e um calor infernal, deixando para atrás soldados, mulheres e crianças mortos de inanição, doença e fome.
Francisco Solano López comandava a retirada sem objetivo certo, em direção ao descampado de Serro Corá, no norte do país, próximo à fronteira com o Brasil, onde, em 1º de março, seria executado sob as ordens do general sul-rio-grandense Correia da Câmara, em um último arremedo de confronto. Era o epílogo de tragédia iniciada em fins de 1864, com a invasão pelo exército imperial, sem declaração de guerra, da República Oriental do Uruguai, para impor ali um ditador-títere: Venancio Flores.
Exterminando o passado e o futuro
Na “Era das Nações”, as classes dominantes procuravam impor suas versões do passado, para dominar o presente e controlar o futuro. Financiavam institutos históricos reunindo historiadores conservadores selecionados; sustentavam a redação, produção e divulgação em livros, revistas, jornais — a seguir na rádio e na televisão — das suas narrativas historiográficas; dificultavam e combatiam as narrativas do passado desde o ponto de vista das classes exploradas. As universidades e as escolas eram a ponta de lança da produção e das divulgações das narrativas apologéticas nacionais das classes dominantes. Esforçavam-se para que a historiografia dominante fosse a das classes dominantes.
Na “Era da Globalização”, o silenciamento-destruição do passado, como experiência social determinante, é impulsionado pela natureza profunda do grande capital globalizado. A globalização do capital tudo faz para consolidar a vivência do indivíduo em um tempo “atualista” ou “presentista”. Ou seja, que domine no ser social atomizado, reduzido à situação de consumidor-produtor isolado, a percepção-sentimento, inconsciente e contraditória, de viver eternamente em um presente. Único e imutável tempo histórico. Ou melhor, tempo sem história, sem relação com o passado e o futuro.
A globalização tudo faz para que o passado e o futuro se dissolvam sob o domínio esmagador de um presente sempre estático e sem raízes, onde não há mudanças, apenas permanências. Esse projeto foi e é impulsionado no Brasil em forma avassaladora sobretudo pela globalização desenfreada da economia e da sociedade. Foi e é impulsionado pela grande mídia, pelos governos passados e, agora, em forma desenfreada, pela nova ordem autoritária neocolonial globalizada em institucionalização.
A mais longa guerra
A chamada Guerra da Tríplice Aliança contra a República do Paraguai [1864-70] foi o mais longo, duradouro e mortífero conflito e guerra empreendida pelo Estado brasileiro. Talvez 150 mil combatentes imperiais tenham sido enviados aos campos de batalha, aos safanões, com talvez 50 mil baixas mortais, sobretudo em combate e doenças [cólera, disenteria, varíola].
O sesquicentenário daquele conflito está se concluindo sem que se tenha realizado nenhum grande evento científico-acadêmico no Brasil, na Argentina, no Paraguai, no Uruguai. Quando muito, realizaram-se as tradicionais celebrações militar-patrióticas castrenses para uso da corporação. O deslizar conservador na Argentina, no Paraguai, no Brasil e, agora, no Uruguai, contribuíram fortemente para impor o enorme e doloso silêncio, que a mídia preocupa-se em não quebrar.
A guerra, lutada de 1864 a 1870, por decisão das classes dominantes imperiais e liberal-argentinas, opunha-se aos interesses das populações do Brasil, da Argentina, do Uruguai e do Paraguai. Em um sentido histórico, todas as nações envolvidas saíram prejudicadas do conflito, com destaque para a população e a nação paraguaia.
Saiba mais em: https://outraspalavras.net/historia-e-memoria/as-feridas-da-guerra-com-paraguai-ainda-latejam/
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