Trechos de floresta foram arrasados para dar lugar ao equipamento necessário para extrair o metal
Por Bryan Harris, Sam Cowie, e Gideon Long
Quando helicópteros militares brasileiros sobrevoaram a Reserva Biológica Maicuru, no estado amazônico do Pará, em outubro, eles descobriram uma operação de mineração ilegal que surpreendeu em sua sofisticação.
Havia um sistema de motores para retirar ouro de cavernas profundas onde ele havia sido encontrado e pistas de pouso escavadas na floresta tropical circundante para levar a carga embora.
“Esse local só é acessível de avião, não tem outro jeito. Então, para estruturar uma operação lá, primeiro é preciso construir uma pista de pouso e depois ter aviões”, afirma Gecivaldo Vasconcelos, delegado da Polícia Federal de Santarém, uma cidade portuária escaldante às margens do rio. “Isso exige um investimento, não é de pequena escala.”
Na década de 1980, próximo ao fim da ditadura militar brasileira, a Amazônia testemunhou uma feroz corrida do ouro que atraiu milhares de pobres que cavavam o metal com pás em uma vasta cova a céu aberto. As cenas medievais de brutalidade da mineração selvagem e da destruição desenfreada deixada em seu rastro chocaram o mundo em um momento em que o destino da floresta amazônica estava se tornando uma preocupação em escala global.
Três décadas depois, os mineiros ilegais estão novamente migrando para a Amazônia com a mesma cultura de enriquecimento rápido. Mas, desta vez, eles também estão trazendo novas máquinas pesadas e know-how financeiro.
Conforme o preço do metal precioso disparou durante a crise do coronavírus, o mesmo aconteceu com a produção na Amazônia. Muito do ouro é exportado, principalmente para nações ocidentais, incluindo Reino Unido, Estados Unidos e Canadá.
Grandes extensões de terras supostamente protegidas estão sendo demolidas para dar lugar a equipamentos modernos de extração do metal. Uma área de floresta equivalente ao tamanho de mais de 10.000 campos de futebol foi destruída no ano passado somente por garimpeiros ilegais, de acordo com o Ibama, o organismo federal de proteção ambiental, um aumento de 23% em relação a 2018. Isso é parte de um surto mais amplo no desmatamento na região amazônica.
Para processar o ouro, os mineiros usam mercúrio, que se espalha pelo ar e pelos rios, contaminando a produção local e afetando as comunidades locais, algumas das quais reclamam de uma série de doenças assustadoras, incluindo o aumento do aborto espontâneo de mulheres, segundo o Ministério Público Federal.
Com a mineração ilegal também vem a violência. Várias tribos indígenas na Amazônia brasileira, incluindo os Munduruku e Yanomami, estão sob constante ameaça de mineiros que muitas vezes estão armados e às vezes trabalhando para quadrilhas do crime organizado. Os assassinatos são comuns, diz a polícia.
Nem a violência é contida nas fronteiras nacionais. A Polícia Federal afirma que os grupos criminosos que atuam no Brasil têm ligações estreitas com a Venezuela, onde uma região mineira no sul do país é dominada pelo crime organizado e o trabalho forçado é comum, segundo a ONU e várias agências não governamentais.
Muito desse “ouro do conflito” é expulso da Venezuela via Colômbia, mas muito também é contrabandeado para a Amazônia brasileira, onde pode ser facilmente lavado, vendido e eventualmente exportado globalmente de São Paulo.
“O risco do ouro ilegal é que os lucros possam ser usados para promover mais ilegalidades, incluindo tráfico de drogas e armas e até terrorismo. Se não resolvermos esse problema, perderemos essa guerra ”, afirma Eduardo Leão, diretor da Agência Nacional de Minas.
A polícia brasileira lançou nas últimas semanas uma série de operações com o objetivo de erradicar os mineiros ilegais, as rotas de contrabando transfronteiriças e os serviços de lavagem que permitem a entrada de ouro ilegal no sistema financeiro global.
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