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Cortes na ciência comprometem resposta à covid-19 no Brasil

Pandemia atinge país em meio a cenário de falta de verbas e corte de bolsas, que deixam laboratórios obsoletos e levam à fuga de cérebros. Dependência da importação de equipamentos também dificulta combate ao vírus.

A fila de 16 mil testes para covid-19 no Instituto Adolfo Lutz, em São Paulo, expõe a vulnerabilidade de um país que escolheu não investir em Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) nos últimos anos. A pandemia do novo coronavírus chegou ao Brasil em meio a um cenário de cortes de bolsas de pesquisa, defasagem tecnológica dos laboratórios e desmoralização das universidades.

O gargalo de testes em São Paulo é resultado da falta de reagentes químicos e de profissionais capacitados para realizar os exames. A pandemia de covid-19 – a doença respiratória causada pelo novo coronavírus, o Sars-Cov-2 – levou a uma corrida internacional por insumos e equipamentos médicos, em que países com maior poderio econômico têm vantagem competitiva. Nos últimos dias, os EUA intensificaram uma postura agressiva de aquisições, o que motivou críticas por lideranças de diferentes países, como Alemanha, Canadá e França.

“Fica evidente que é uma questão de segurança nacional”, constata o médico imunologista Mauro Teixeira, professor do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Dependente da importação de insumos e demais equipamentos médicos e hospitalares, o Brasil vê sua capacidade de resposta à pandemia ameaçada já no curto prazo.

“Com todos os países precisando, aqueles que investiram em CT&I conseguem, de alguma forma, ter mais armas. Israel é do tamanho do Sergipe e consegue fazer 5 mil testes por dia”, afirma Alberto Chebabo, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia. “Países que investiram pesadamente nessa área conseguiram sair da crise mais rapidamente que outros. É o caso da Coreia dos Sul, que testou milhares de pessoas logo que a pandemia chegou ao país.”

Chebabo é diretor-médico do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Há alguns dias, ele e sua equipe foram surpreendidos pelo cancelamento da compra de um videolaringoscópio, aparelho utilizado na intubação de pacientes. A razão, desta vez, não foi a habitual falta de recursos, mas a proibição de exportação do equipamento pelo governo do Reino Unido, sede da fabricante.

Fuga de cérebros

A disparidade de investimentos em CT&I também tem intensificado um processo conhecido como fuga de cérebros: cientistas que deixam o país para atuar em centros de pesquisa com melhores condições de trabalho. Consequentemente, são reduzidas as chances de o Brasil desenvolver, internamente, tecnologias e abordagens inovadoras.

Os sucessivos cortes de financiamento e o descrédito do pensamento científico foram as principais razões que levaram Marcelo Lima, de 34 anos, a deixar o país. Pós-doutor em Biomedicina, ele trocou a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) pela Universidade de Keele, na Inglaterra, em maio do ano passado.

“No Brasil atual, a academia é literalmente demonizada, e o conhecimento científico passou a ser refutado por ‘especialistas’ de mídia social”, diz o cientista. Com experiência internacional no Reino Unido, Itália e EUA, ele conta nunca ter conhecido um laboratório com a infraestrutura de que dispunha na Unifesp.

São Paulo detém condições privilegiadas de fomento à pesquisa pelo apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), cujo orçamento independe de decisões políticas, por ser diretamente vinculado à arrecadação tributária estadual. Apesar desse cenário, os laboratórios paulistas têm sofrido com o subfinanciamento federal.

No laboratório elogiado por Marcelo, há cinco equipamentos, avaliados em 1 milhão de euros cada, parados por falta de verbas para manutenção. Há dois anos, o grupo de pesquisa em que atuava, chefiado pela professora Helena Nader, ganhou um edital da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) que permitiria o reparo de um dos aparelhos. Até hoje, a verba não chegou.

“Com incentivo institucional, burocracia reduzida e um sistema eficiente de laboratórios multiusuários, a pesquisa aqui é bem mais eficiente. É comum esperarmos meses por um reagente no Brasil. Aqui, conseguimos efetuar a compra e recebemos no dia seguinte. Há um cuidado e proteção maior ao sistema de CT&I”, avalia Marcelo. Nos últimos três anos, seis colegas dele, de São Paulo, Minas Gerais e Paraná, seguiram o movimento de deixar o país.

 Saiba mais em: https://www.dw.com/pt-br/cortes-na-ci%C3%AAncia-comprometem-resposta-%C3%A0-covid-19-no-brasil/a-53052021

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