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“Extermínio indígena pode levar TPI a julgar Bolsonaro”

Sylvia Steiner, ex-juíza do tribunal de Haia, acha improvável julgamento do presidente por gestão da pandemia. Mas vê espaço para avançar a denúncia por dizimação indígena – e traça paralelo com caso de ditador sudanês.

A única juíza brasileira a já ter atuado no Tribunal Penal Internacional (TPI), na Holanda, acredita ser improvável que o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, possa ser eventualmente julgado e condenado na Corte de Haia pelo que ela chama de ”gestão desastrosa” da pandemia.  

Em entrevista à DW, Sylvia Steiner diz que a recente denúncia apresentada ao TPI pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) dificilmente poderá ser enquadrada em um crime contra a humanidade, conforme previsto no Estatuto de Roma, o regimento que descreve os crimes que podem ser julgados pela Corte em Haia.  

Porém, Steiner considera que a denúncia apresentada à Corte em Haia, em novembro de 2019, por ataques sistemáticos contra os povos indígenas no Brasil pode levar o presidente a um julgamento e a uma condenação internacional por genocídio.  

“Foi de certa maneira o que aconteceu em Darfur, no Sudão. Milhões de pessoas foram expulsas, porque é um território rico em petróleo e havia um interesse na desocupação. O tribunal aceitou a denúncia contra o então presidente sudanês, Omar al-Bashir, por crime de genocídio”, comenta.

A única juíza brasileira a já ter atuado no Tribunal Penal Internacional (TPI), na Holanda, acredita ser improvável que o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, possa ser eventualmente julgado e condenado na Corte de Haia pelo que ela chama de ”gestão desastrosa” da pandemia.  

Em entrevista à DW, Sylvia Steiner diz que a recente denúncia apresentada ao TPI pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) dificilmente poderá ser enquadrada em um crime contra a humanidade, conforme previsto no Estatuto de Roma, o regimento que descreve os crimes que podem ser julgados pela Corte em Haia.  

Porém, Steiner considera que a denúncia apresentada à Corte em Haia, em novembro de 2019, por ataques sistemáticos contra os povos indígenas no Brasil pode levar o presidente a um julgamento e a uma condenação internacional por genocídio.  

“Foi de certa maneira o que aconteceu em Darfur, no Sudão. Milhões de pessoas foram expulsas, porque é um território rico em petróleo e havia um interesse na desocupação. O tribunal aceitou a denúncia contra o então presidente sudanês, Omar al-Bashir, por crime de genocídio”, comenta.  

  

DW Brasil: O presidente Jair Bolsonaro foi denunciado por crime contra a humanidade no TPI devido à gestão da pandemia da covid-19 no Brasil. A Corte em Haia notificou o recebimento da denúncia. O que isso significa?

Sylvia Steiner: É uma questão de uma terminologia muito técnica e que foi mal utilizada na notícia dada pelo PDT. ”Aceitar a denúncia” não quer dizer que se deu início a alguma investigação ou a algum procedimento. Nós aqui no Brasil imediatamente interpretamos que ”aceitar denúncia” é porque o juiz achou que havia indícios, mas no tribunal internacional não funciona assim. Tem que passar pela triagem da procuradoria, que é 100% independente para decidir se leva ou não adiante uma denúncia. O que houve é que o PDT ingressou com uma comunicação de prática de crime, e o gabinete do procurador do TPI apenas acusou que foi protocolado, mais nada. Não quer dizer que a denúncia tenha sido aceita. Já há algumas denúncias contra o presidente Bolsonaro que foram protocoladas no gabinete da procuradoria e nenhuma delas, por enquanto, ensejou uma decisão de abertura de uma investigação.  

Depois que uma denúncia é aceita pelo TPI, quais são os procedimentos internos?  

O gabinete da procuradoria faz primeiro um exame para afastar todas aquelas denúncias que sejam incabíveis. Algumas porque não há crime tipificado, outras porque estão fora dos limites temporais e outras porque tratam de países que não são Estados-parte do TPI. Então, essa é uma primeira triagem. Para aquelas denúncias que passam por essa triagem, a procuradoria inicia um procedimento interno, ao qual o juiz não tem acesso, o público não tem acesso. Chama-se exame preliminar. Esse exame preliminar vai verificar se o tribunal tem competência para julgar o caso com base em três passos. 

O primeiro é estar dentro do limite temporal, a competência pessoal ou territorial – se a denúncia é contra um cidadão de um Estado-parte ou se foi um crime praticado no território do Estado-parte – e, por fim, a competência material, ou seja, se houve realmente um crime, confirme descrito no Estatuto de Roma. Ultrapassado esse primeiro passo, vai-se para o segundo passo, que é o de examinar a chamada complementaridade: se tem algum outro Estado investigando aquela mesma questão, se o próprio Estado onde o crime ocorreu está em condições de conduzir ele mesmo a investigação, entre outros. Por fim, a última etapa é o exame da gravidade do delito e da conveniência em termos de interesse da Justiça em se iniciar uma investigação. 

A procuradoria do tribunal, geralmente na primeira semana de dezembro, publica um relatório dos chamados exames preliminares, prestando contas à comunidade internacional sobre quais casos estão sendo examinados e em que fase estão ou quais os motivos para rejeitá-los. Somente quando passada essa fase, a promotoria decide se o tribunal tem competência. Em caso positivo, vai informar que iniciará uma investigação ou, no caso de alguma denúncia enviada por particulares, por ONGs ou por partidos políticos, que seja vai pedir autorização à câmara preliminar para abrir uma investigação. Este é o procedimento.  

Então, só teremos informações se a denúncia contra Bolsonaro foi de fato aceita em dezembro, quando a procuradoria do TPI se manifesta sobre os exames preliminares.  

É possível que a promotoria sequer tenha começado a triagem desses casos. Como eu falei, já há algumas denúncias contra Bolsonaro, essa não é a primeira e, com certeza, não será a última. Há outras entidades que já propuseram denúncias pelos mesmos fatos, em questão de um mês, dois meses. Esperamos que em dezembro nós já tenhamos notícias se o promotor está procedendo a este exame preliminar. O que pode acontecer é o seguinte: se o promotor, na triagem, rejeitar liminarmente essas denúncias, nós nem ficamos sabendo, porque o relatório é só dos exames preliminares que estão em andamento. As denúncias que são rejeitadas logo de cara na triagem o público geral sequer fica sabendo.  

Saiba mais em: https://www.dw.com/pt-br/exterm%C3%ADnio-ind%C3%ADgena-pode-levar-tpi-a-julgar-bolsonaro/a-53860455  

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