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Pandemia desmascara ‘arrogância da ignorância’ de governantes, diz historiador

No Brasil Império (1822-1889), as técnicas de “distanciamento social” usadas para impedir a propagação de epidemias consistiam basicamente em afastar os pobres do centro das cidades.

João Fellet – @joaofellet Da BBC News Brasil em São Paulo

Na época, acreditava-se que a fonte de epidemias não eram vírus que se escondiam em espirros, mas sim “miasmas” — uma misteriosa ação que substâncias animais e vegetais em putrefação exerciam sobre o ambiente.

Diante da dificuldade em identificar o fenômeno, agentes públicos passaram a tratar como suspeitos todos os cortiços onde famílias pobres viviam — e que se tornaram objeto de demolições e operações policiais frequentes.

As cenas são descritas no livro Cidade febril: cortiços e epidemias na corte imperial, em que o historiador Sidney Chalhoub descreve como doenças infecciosas mudaram o Brasil na virada do século 19 para o 20.

Em entrevista à BBC News Brasil, Chalhoub, professor de História e de Estudos Africanos e Afro-americanos na Universidade Harvard, nos Estados Unidos, traça paralelos entre epidemias passadas e a covid-19.

Ele conta que situações atuais, como divergências entre autoridades quanto à melhor forma de responder à crise e o debate entre salvar vidas ou a economia, também ocorreram no passado.

Naquela época, no entanto, a “medicina científica” ainda era vista com desconfiança por parte expressiva do povo e das elites – um cenário distinto do atual, em que a maioria das autoridades globais recorre à ciência para definir suas políticas contra a pandemia.

Já os governantes que têm ignorado o caminho da ciência estão sendo desmascarados pelos fatos, diz Chalhoub. “No Brasil, a figura do presidente, que é uma caricatura disso, mostra como a ignorância é impotente contra a tragédia”, afirma.

Em Harvard desde 2015, Chalhoub lecionou na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) por 30 anos e foi professor visitante nas universidades de Michigan e Chicago.

Além de Cidade febril, é autor de Trabalho, lar e botequim, sobre a vida nas classes baixas cariocas, e de Visões da Liberdade, sobre as últimas décadas de escravidão na cidade.

Também escreveu Machado de Assis, historiador, sobre as ideias políticas do escritor, e coeditou cinco livros sobre a história social do Brasil.

Mapa dos continentes com símbolos do coronavírus em alguns países

Na entrevista à BBC News Brasil, Chalhoub diz ainda que, embora trágica, a pandemia pode deixar legados positivos — como nos ensinar formas de viver com uma “economia desacelerada”, que reduza a “movimentação alucinada de mercadorias e pessoas, que está explodindo com o planeta e que faz com que tudo circule mais rápido: bactérias, vírus e poluição”.

Confira os principais trechos da entrevista: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-52250448

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