Por Paulo Kliass
Passado o período da ressaca provocada pelos resultados das eleições municipais, as atenções se voltam novamente para os aspectos da continuidade das diferentes áreas da política do governo Bolsonaro. Apesar da unanimidade em torno do fato de que o Presidente e seu círculo mais íntimo foram mesmo os grandes derrotados no pleito de novembro, o fato é que ele ainda deverá ser o ocupante do Palácio do Planalto por mais um biênio.
Parece não restar dúvidas que a combinação da derrota de seu ídolo Donald Trump nos Estados Unidos e o fraco desempenho da maioria dos candidatos apoiados por Bolsonaro nos municípios deve levar a mudanças em sua forma de governar. A velha fórmula de uma “nova forma de fazer política” está indo para debaixo do tapete e o capitão já começa chamar os líderes do chamado “centrão” e dos demais partidos do fisiologismo para compor sua base aliada no Congresso Nacional.
Trata-se de uma operação com características mais acentuadas de um bloco defensivo e menos de uma artilharia ofensiva de proposições inovadoras. Bolsonaro sente a cada dia o aumento de sua impopularidade, sentimento generalizado pelo país afora e que se expressa por meio das inúmeras pesquisas de opinião a respeito de seu governo. Assim, as gavetas abarrotadas da Presidência da Câmara com pedidos de impeachment podem ser uma variável problemática em qualquer momento de arrefecimento da tensão política na sociedade e no próprio parlamento. O obstáculo a tal iniciativa pode vir da sopa de letrinhas de agremiações partidárias fisiológicas, sempre disposta a oferecer seus votos em troca de verbas e cargos que facilitem a vida dos parlamentares nas eleições de 2022.
Derrota de Trump e de Bolsonaro: mudanças no governo?
A política externa também deverá ser objeto de alguma virada de eixo. Sem a referência de Trump na Casa Branca, Bolsonaro perde um aliado estratégico em suas trapalhadas e desvarios no cenário internacional. As contumazes cutucadas contra a China, por exemplo, devem ser substituídas por algum tipo de realinhamento orientado pelo pragmatismo. É óbvio que esse cenário leva em conta a existência de alguma dose de racionalidade na condução do Itamaraty, hipótese que parece incompatível com a presença de uma figura como Araújo à frente da pasta. Já fazem alguns anos que a China tornou-se o principal parceiro comercial do Brasil, bem como um destino essencial para boa parte das nossas exportações de produtos agrícolas. A ver por quanto tempo os representantes do agronegócio vão aguentar a continuidade das declarações em rompante do governo, que apenas fazem atrapalhar a segurança de seu faturamento.
O isolamento internacional e diplomático a que nos levou o núcleo mais ideológico do bolsonarismo também deve sofrer algum revés na questão do meio ambiente. O negacionismo expresso quase diariamente pelo Chefe do Executivo se choca com as imagens dos incêndios criminosos no Pantanal, os índices crescentes de desmatamento, o apoio à invasão ilegal de garimpos clandestinos e o desprezo pelos cientistas que apresentam os riscos da continuidade desse modelo de exploração irresponsável de nossos recursos naturais. A pressão exercida pela comunidade internacional, em especial pelos governos dos países europeus, não mais contará com o colchão de amortecimento que era oferecido pela diplomacia de Trump. O Brasil provavelmente deverá oferecer algumas notícias positivas nesse front, caso tenha interesse em manter o fluxo comercial para aquele continente.
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