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A volta das oligarquias e a desolação do mundo

Um século depois de ser aceito no Ocidente, voto universal perdeu sentido. Elite econômica, que temia a democracia, conseguiu anulá-la. Mas em vez de “restaurar a ordem”, a revanche dos poderosos espalha em toda parte sinais de barbárie

Por Timothy Kuhner | Tradução de Simone Paz

Cada sociedade tem suas próprias regras quando se trata da tomada de decisões coletivas e do regime de propriedade; e na maior parte da história, essas regras estiveram interligadas. A aristocracia, a escravidão, o feudalismo e a servidão assalariada mostraram como a posição das pessoas no regime político pode ser afetada, isso quando não determinada, por sua posição no regime de propriedade. Infelizmente, a política seguiu a propriedade.

Essa forma de opressão pode parece ser coisa do passado, mas não é o caso. Nos Estados Unidos, no Reino Unido e em alguns países da Commonwealth, a participação política era condicionada pela propriedade (ou pela capacidade de pagar um imposto eleitoral) até boa parte do século XX. E apesar da conquista do sufrágio universal, os traumas políticos, econômicos e ambientais do século XXI demonstram que os governos continuam a servir ao capital. Como que a democracia eleitoral foi se transformar num outro regime de desigualdade, no qual a propriedade privada — mais uma vez –prevalece? (1)

Ninguém ficaria mais perplexo com este resultado do que aqueles que lutaram a favor ou contra o sufrágio universal masculino na Inglaterra há quase 200 anos. A imprecisão de suas afirmações sobre a democracia nos ajuda a responder algumas das questões mais urgentes de nosso momento histórico: o que promove o bem público, a distribuição igual ou desigual da influência política? Quais condições constitucionais precisamos estabelecer para dar autonomia e poder aos cidadãos, independentemente de sua posição socioeconômica? E se a democracia não foi capaz de separar o poder político do status socioeconômico, significa que ela falhou ou que está incompleta?

Nos tempos em que homens brancos e desprovidos de patrimônio não podiam votar ou concorrer a eleições, James O’Brien lutou para corrigir esse equívoco: “Os renegados dirão que você não é representado porque não tem riqueza. Eu te digo, pelo contrário, que não tens bens porque não és representado» (2). Diferentemente de movimentos como o dos “levellers” (niveladores) ingleses e dos franceses jacobinos, que defendiam diretamente a mudança econômica, O’Brien e o movimento cartista que ele liderava priorizavam a representação política das pessoas comuns. Eles argumentavam que uma verdadeira democracia poderia implementar políticas econômicas consistentes com o bem comum, e que poderia fazê-lo sem a necessidade de uma revolução violenta. A Carta do Povo de 1838 afirmava:

  • constituintes eleitorais iguais;
  • voto universal masculino;
  • eleições anuais para o parlamento;
  • supressão do requisito de possuir bens imóveis para se candidatar a deputado;
  • voto secreto;
  • salários para os deputados. (3)

Embora essas demandas exigissem — sem sombra de dúvidas — mudanças constitucionais de vários tipos jurídicos, o ministro do Interior, Lord John Russell, que se opunha aos cartistas, chamou-as de “queixas contra a constituição da sociedade”. Russell estava certo. Isso acontecia no âmbito de uma ordem social mais ampla. A participação e representação política foi por muito tempo limitada não apenas às aristocracias de raça e gênero, mas também a um subconjunto ainda mais seleto: a aristocracia da riqueza.

Como esses aristocratas políticos — isto é, um Parlamento composto exclusivamente pela classe alta — votaram a respeito da Carta do Povo? Quando a petição cartista chegou à Câmara dos Comuns, em julho de 1839, ela ganhou o apoio de 1.280.959 assinaturas de cidadãos. No entanto, a votação teve um resultado espantoso: 235 contra e 46 a favor. O discurso de Russell na Câmara explicava o perigo que havia sido evitado naquele dia. Uma sociedade em que os homens comuns estivessem representados e pudessem adquirir propriedades destruiria “as propriedades e os meios dos ricos (…) [e] traria consequências ainda mais fatais para os recursos e o bem-estar da população”.

Saiba mais em: https://outraspalavras.net/mercadovsdemocracia/a-volta-das-oligarquias-e-a-desolacao-do-mundo/

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