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Peru: exame de uma vitória inesperada

Pedro Castillo vencerá apesar de demonizado pela mídia e ausente, até há pouco, das redes sociais. Sintonia com nova geração política, e com sentimento anti-establishment das maiorias, produziu resultado – que diz algo à América Latina

Por Lucas Malaspina e Marcos Doudtchitzky | Tradução: Antonio Martins

Pedro Castillo, o professor sindicalista que está a prestes a vencer as eleições presidenciais peruanas, surpreendeu em todos os níveis. Até então desconhecido do grande público, o candidato do partido Peru Libre prepara-se para derrotar Keiko Fujimori, provavelmente a política mais conhecida da atualidade – para o bem e para o mal – do país. Uma das facetas mais surpreendentes de Castillo está ligada à sua presença (ou, na verdade, sua ausência) nas redes sociais. Quando entrou na votação, ele tinha apenas 3.000 seguidores no Twitter e atualmente tem 79.000 contra mais de um milhão de Keiko Fujimori. Ironicamente, ele poderia ter sido inicialmente chamado de “o candidato sem likes”. Mas em que medida foi esse o caso? Como é possível que no século XXI – quando os consultores de comunicação enfatizam constantemente a importância de uma estratégia política integrada nas diferentes plataformas – um candidato esteja perto de conquistar a presidência nessas condições? Em última análise, qual é a distância entre a mídia social e a “realidade”?

A política baseia-se em acordos. Assim, um quadro político pode reunir os votos necessários para vencer e até mesmo governar – e estar fora das redes sociais – se tiver apoio político suficiente. O ex-presidente uruguaio José “Pepe” Mujica nunca teve um perfil oficial . Alberto Fernández, atual presidente da Argentina, não tinha mais de 30 mil seguidores no Twitter quando se soube que seria ele quem enfrentaria o então presidente Mauricio Macri. No caso de Alberto Fernández (hoje com 2 milhões de seguidores) é evidente que ele recebeu grande parte desse novo público graças a Cristina Fernández de Kirchner, já que alcançou essa posição alavancado pela estrutura de militância construída pelo atual vice-presidente da Argentina. O caso de Castillo é completamente diferente, pois nenhuma estrutura previamente consolidada e unificada cedeu sua capacidade de ampliação para chegar às urnas. A microestrutura do Peru Libre era insignificante em face de tal desafio. Tornou-se pertinente fazer duas perguntas. Por um lado, que elementos podemos levar em conta para explicar tal singularidade? E, por outro lado, o que pode ensinar essa experiência atípica da comunicação digital, que em tão pouco tempo passou por desafios tão intensos? 

 #MerinoRenuncia e a «Geração Bicentenária»

Seguindo o costume de Cronos, o sistema político peruano alimenta-se de seus próprios filhos. Desde que os desdobramentos da Operação Lava Jato chegaram ao Peru, nenhum ex-presidente ficou de pé. Acusações de corrupção varreram todos eles. A crise política também levou ao nascimento, em novembro de 2020, da chamada “Geração Bicentenária”, como tem sido chamado o movimento que saiu às ruas em defesa da democracia [Leia mais em Outras Palavras: 1 2 3]. Ao questionar as graves desigualdades enfrentadas pela nação andina, a “Geração Bicentenário” também respondeu à decisão do Congresso de retirar Martín Vizcarra (vice e posterior sucessor de Pedro Pablo Kuczynski) do poder. O consultor político argentino Mario Riorda , chamou atenção para o fato histórico por ocorrer “no país com o maior descontentamento político da região”. Com a hashtag #MerinoRenuncia como emblema , os jovens inundaram o Facebook, Instagram e TikTok.   

O enorme potencial da Geração Bicentenário também teve expressão no Twitter, como observou Julián Macías Tovar , analista de redes sociais vinculado ao Podemos (Espanha) e chefe da Pandemia Digital . Macías Tovar conseguiu exibir a monstruosa superioridade das comunidades que forçaram a queda do governo interino de Manuel Merino nas conversaçõs do Twitter, revelando o poder do uso de certas hashtags (#MerinoNoEsMiPresidente com mais de 370.000 tweets #MerinoNoMeRepresenta com mais de 130.000).

Saiba mais em: https://outraspalavras.net/descolonizacoes/peru-exame-de-vitoria-improvavel/

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