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Estados Unidos mais isolados que nunca na América Latina

 

Por: Emir Sader | Créditos da foto: (Ilustração de David Plunkert)

Desde a mudança radical do cenário internacional, com o fim da URSS e do campo socialista, os Estados Unidos se projetaram como a unida força hegemônica no mundo. Esse fenômeno se deu também na América Latina.

A extensão do modelo neoliberal foi a modalidade econômica dessa hegemonia. A América Latina foi a região do mundo que teve mais governos neoliberais e suas modalidades mais radicais. Foi a expressão da hegemonia mais forte dos Estados Unidos no continente.

O fôlego curto do modelo neoliberal revelou como essa hegemonia tem pernas curtas.

Rapidamente as economias mais importantes do continente – a mexicana, a brasileira, a argentina – passaram a sofrer crises econômicas, já do modelo neoliberal.

A tendência norte-americana no continente é a de estar cada vez mais isolado, com menos apoio, com mais governos adversários. Essa tendência se acentuou desde o surgimento dos governos progressistas na América Latina.

Esses governos, ao privilegiarem a superação do neoliberalismo e não sua consolidação, sempre se opuseram à proposta norte-americana para o continente. Ao optarem pelos processos de integração regional e não pelos Tratados de Livre Comércio com os EUA, se opuseram às políticas norte-americanas para o continente. Ao fortalecerem os Estados latino-americanos, opondo-se à política e centralidade do mercado dos EUA para o continente.

Esses governos foram representando espaços de autonomia em relação à política norte-americana. Os EUA passaram a concentrar seu apoio nos governos neoliberais, nas forças conservadoras no continente.

México, Colômbia e Chile passaram a ser os governos privilegiados pelos Estados Unidos. Enquanto que a Venezuela, o Brasil, a Argentina, o Uruguai, a Bolívia e o Equador passaram a representar o polo oposto aos Estados Unidos.

Aos poucos, os Estados Unidos foram perdendo suas referências mais importantes no continente. Primeiro, com a eleição de López Obrador no México. Depois, com a eleição de Boric no Chile. Finalmente, com a possibilidade real da eleição de Petro na Colômbia. A possibilidade real de derrota de Bolsonaro e de vitória do Lula consolidaria essa tendência.

Ao mesmo tempo que foi se enfraquecendo o campo de apoio norte-americano, foi se fortalecendo o bloco de oposição aos Estados Unidos. Pela primeira vez esse campo pode chegar a ter os três países mais importantes do continente – Argentina, México e Brasil. A política norte-americana foi sempre a de tratar de impedir essa aliança. Quando se negociavam as dívidas externas desses países, os Estados Unidos e o FMI faziam concessões a um deles, para impedir que se unissem aos outros. E sempre se tratou de incentivar a distância do México em relação à Argentina e ao Brasil e os conflitos entre estes dois países.

O governo Biden pretendia superar o isolamento incrementado pela presidência de Donald Trump, porém teve pouco sucesso até aqui. O governo de Macri foi substituído por um governo anti-neoliberal. O mesmo aconteceu no México, com a vitória de López Obrador. E no Chile, com o triunfo de Boric. Na Colômbia, a provável eleição de Petro se dará na mesma direção. Da mesma forma que no Brasil.

A polarização entre a extrema direita e forças de esquerda e de centro-esquerda – estas anti-neoliberais – não deixa espaço para aliados ao governo de Biden. Este se opõe ao estilo de Trump, mas mantém o modelo neoliberal.

A decadência da hegemonia norte-americana no mundo se expressa na América Latina de maneira mais acentuada. Que aliados firmes tem o imperialismo no continente hoje? Brasil e Colômbia, que devem mudar seus governos para posições de distanciamento com os Estados Unidos.

A possibilidade de retorno de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos enfrentará a ele com um continente já sem os aliados que ele teve no passado. O isolamento norte-americano será ainda mais marcante.

A perda de capacidade hegemônica dos Estados Unidos no mundo se dá, no seu histórico ”pateo traseiro”, da forma mais profunda e, provavelmente, irreversível.

 

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