Presidente eleito se emociona e diz que o povo brasileiro escolheu “democracia em vez do arbítrio”. Moraes afirma que diplomação é vitória do “Estado de direito”.
Por: Jean-Philip Struck | Créditos da foto: Evaristo Sa/AFP
O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), receberam na tarde desta segunda-feira (12/12) em cerimônia na sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), em Brasília, seus respectivos diplomas eleitorais, documentos que os habilitam a tomar posse.
Em um discurso após receber o documento, Lula se emocionou ao lembrar da sua primeira diplomação, em 2002, e disse que o povo brasileiro “escolheu o amor em vez do ódio, a verdade em vez da mentira e a democracia em vez do arbítrio”.
“Na minha primeira diplomação, em 2002, lembrei da ousadia do povo brasileiro em conceder – para alguém tantas vezes questionado por não ter diploma universitário – o diploma de presidente da República”, disse, com lágrimas no rosto.
Dois ex-presidentes da República participaram da cerimônia nesta segunda-feira: José Sarney e Dilma Rousseff.
Lula foi eleito presidente da República em 30 de outubro, no segundo turno das eleições de 2022, ao derrotar Jair Bolsonaro. O petista recebeu 60.345.999 votos — ou 50,9% dos votos válidos.
No entanto, Bolsonaro e vários de seus aliados não reconhecem a derrota. O partido do atual presidente chegou a tentar contestar sem sucesso o resultado do pleito na Justiça. Apoiadores de Bolsonaro também vêm lançando mão de táticas ilegais e antidemocráticas para provocar tumulto, como bloqueios em rodovias, e têm apelado para que as Forças Armadas deem um golpe de Estado para impedir a posse de Lula.
Alexandre de Moraes também discursou. O presidente do TSE criticou “ataques antidemocráticos” durante o processo eleitoral e prometeu responsabilizar “os que atacaram a democracia”.
“Essa diplomação atesta a vitória plena e incontestável da democracia e do Estado de direito contra os ataques antidemocráticos, contra a desinformação e contra o discurso de ódio proferidos por diversos grupos organizados que, já identificados, garanto serão integralmente responsabilizados. Para que isso não retorne nas próximas eleições”, disse Moraes.
Democracia ameaçada
Em uma alusão indireta às táticas de contestação da eleição e aos ataques antidemocráticos promovidos pelo presidente de extrema direita Jair Bolsonaro, Lula afirmou na cerimônia no TSE que “poucas vezes na história recente” do Brasil “a democracia esteve tão ameaçada”.
“Poucas vezes na nossa história a vontade popular foi tão colocada à prova, e teve que vencer tantos obstáculos para enfim ser ouvida. A democracia não nasce por geração espontânea. Ela precisa ser semeada, cultivada, cuidada com muito carinho por cada um, a cada dia, para que a colheita seja generosa para todos. (…) Felizmente, não faltou quem a defendesse neste momento tão grave da nossa história”, afirmou Lula.+
Elogios ao STF e TSE
Na sequência, Lula afirmou que o povo brasileiro “escolheu o amor em vez do ódio, a verdade em vez da mentira e a democracia em vez do arbítrio”. Ele ainda exaltou a “coragem” do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral, que, segundo ele, “enfrentaram toda sorte de ofensas, ameaças e agressões para fazer valer a soberania do voto popular”.
“Cumprimento cada ministro e cada ministra do STF e do TSE pela firmeza na defesa da democracia e da lisura do processo eleitoral nesses tempos tão difíceis. A história há de reconhecer sua coerência e fidelidade à Constituição”, completou Lula.
Críticas indiretas a Bolsonaro
Sem citar Bolsonaro nominalmente, Lula ainda afirmou que “essa não foi uma eleição entre candidatos de partidos políticos com programas distintos”. “Foi a disputa entre duas visões de mundo e de governo”, disse.
“De um lado, o projeto de reconstrução do país, com ampla participação popular. De outro lado, um projeto de destruição do país ancorado no poder econômico e numa indústria de mentiras e calúnias jamais vista ao longo de nossa história.”
Lula ainda mencionou que “inimigos da democracia lançaram dúvidas sobre as urnas eletrônicas” e “ameaçaram as instituições“.
“Criaram obstáculos de última hora para que eleitores fossem impedidos de chegar a seus locais de votação. Tentaram comprar o voto dos eleitores, com falsas promessas e dinheiro farto, desviado do orçamento público. Intimidaram os mais vulneráveis com ameaças de suspensão de benefícios, e os trabalhadores com o risco de demissão sumária, caso contrariasse os interesses de seus empregadores”, afirmou, lembrando as várias táticas ilegais lançadas por Bolsonaro e alguns dos seus apoiadores durante as eleições.
A democracia venceu
Após citar as irregularidades cometidas por Bolsonaro e os desafios enfrentados por sua campanha, Lula afirmou que a “democracia venceu”.
“Quando se esperava um debate político democrático, a Nação foi envenenada com mentiras produzidas no submundo das redes sociais”, completou Lula. “Eles semearam a mentira e o ódio, e o país colheu uma violência política que só se viu nas páginas mais tristes da nossa história. E no entanto, a democracia venceu”, disse.
“O resultado destas eleições não foi apenas a vitória de um candidato ou de um partido. Tive o privilégio de ser apoiado por uma frente de 12 partidos no primeiro turno, aos quais se somaram mais dois na segunda etapa. Uma verdadeira frente ampla contra o autoritarismo, que hoje, na transição de governo, se amplia para outras legendas, e fortalece o protagonismo de trabalhadores, empresários, artistas, intelectuais, cientistas e lideranças dos mais diversos e combativos movimentos populares deste país.”
Ameaça global
Lula também disse que “as ameaças à democracia” não são características exclusivas do Brasil.
“A democracia enfrenta um imenso desafio ao redor do planeta, talvez maior do que no período da Segunda Guerra Mundial. Na América Latina, na Europa e nos Estados Unidos, os inimigos da democracia se organizam e se movimentam. Usam e abusam dos mecanismos de manipulações e mentiras, disponibilizados por plataformas digitais que atuam de maneira gananciosa e absolutamente irresponsável. A máquina de ataques à democracia não tem pátria nem fronteiras”, disse Lula.
“O combate, portanto, precisa se dar nas trincheiras da governança global, por meio de tecnologias avançadas e de uma legislação internacional mais dura e eficiente.”
Lula finalizou seu discurso afirmando que pretende “garantir a normalidade institucional e lutar contra todas as formas de injustiça”.
“É com o compromisso de construir um verdadeiro Estado democrático, garantir a normalidade institucional e lutar contra todas as formas de injustiça, que recebo pela terceira vez este diploma de presidente eleito do Brasil – em nome da liberdade, da dignidade e da felicidade do povo brasileiro.”
O que é diplomação
A diplomação marca efetivamente o fim do processo eleitoral. Ela atesta que um candidato foi eleito e está habilitado a tomar posse no cargo. O prazo final estabelecido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é o dia 19 de dezembro, mas esse prazo costuma ser antecipado. Jair Bolsonaro e seu vice, Hamilton Mourão, por exemplo, foram diplomados em 10 de dezembro de 2018.
No caso da eleição de um presidente, a cerimônia de entrega do diploma é realizada pelo TSE. Ela ocorre após a Justiça Eleitoral apurar todos os votos e vencidos os prazos para questionamentos do resultado da votação. A diplomação também só pode ocorrer após uma análise da prestação de contas dos partidos, para verificar se estão dentro da legalidade.
Na última terça-feira (06/12), o TSE aprovou as contas da chapa Lula-Alckmin, que venceu a corrida presidencial.
Depois de todas as etapas, o TSE confirma o resultado do pleito e certifica os eleitos.
Segundo o Código Eleitoral, no diploma deve constar o nome do candidato, o partido e o cargo para o qual foi eleito. De acordo com o TSE, o diploma entregue a Lula traz os seguintes dizeres:
“Pela vontade do povo brasileiro expressa nas urnas em 30 de outubro de 2022, o candidato Luiz Inácio Lula da Silva foi eleito presidente da República Federativa do Brasil. Em testemunho desse fato, a Justiça Eleitoral expediu o presente diploma, que o habilita à investidura no cargo perante o Congresso Nacional em 1º de janeiro de 2023, nos termos da Constituição”.
A posse, por sua vez, é o ato público pelo qual um candidato eleito assume oficialmente o mandato.
Desde 1946, o TSE expede diplomas para os eleitos — isso só não aconteceu durante a ditadura militar.
Já as diplomações de senadores e governadores são responsabilidade dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs), e estão marcadas para ocorrer entre os dias 12 e 21 de dezembro.
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