Em 2013 foram entregues 150 mil cisternas. Em 2021, apenas 4 mil. São 350 mil famílias que enfrentam cenário de escassez de água. Próximo às eleições, promessas por obras faraônicas ofuscam projeto sério para levar segurança hídrica e alimentar à população
Por: Helânia Pereira da Silva
Como sabemos, estamos em ano eleitoral, onde os ânimos se exaltam nessa corrida maluca pelo trono de um Brasil, vasto em território, e devastado pela falta de políticas públicas ambientais e projetos que de tão bons foram deixados de lado, ou reduzidas à míngua a verba para tocar às obras. Como muitos outros projetos, principalmente, quando envolvem a região Nordeste do Brasil e a velha política de busca por Segurança hídrica. Eis a grande saga do Nordeste.
É nesse contexto, que recentemente, foi mostrado no Jornal Nacional, uma matéria sobre o descaso com as famílias pobres do Nordeste que sofrem ainda pela falta de cisternas para armazenarem as águas das chuvas, desperdiçando esses últimos anos de inverno abençoado na região. Cabe lembrar que a construção de cisternas é uma política pública do Governo Federal, mas foi reduzida nos últimos anos.
Em 2013, foram entregues 150 mil unidades. Em 2021, o governo construiu apenas quatro mil cisternas. O número mais baixo desde que o programa começou em 2003. E, posso afirmar como Nordestina, filha de agricultores e pesquisadora na área, que este projeto de cisternas para todos, é um dos que mais contribuem para levar à segurança hídrica e alimentar às famílias pobres rurais em períodos de estiagem. E, que vendo a chuva chegar e passar, não podem desperdiçar nenhuma gota.
Entretanto, no semiárido Nordestino pele menos 350 mil famílias ainda enfrentam dificuldades por não terem onde armazenar água. E isso, é tão desanimador, pensar que foram esquecidas as construções daquelas, por descaso político, administrativo, ou inflacionário. E como foi relatado pela ASA, Articulação do Semiárido Brasileiro, organização que gerencia as obras das cisternas. Não foi destinado verbas federais para este fim. Será que agora, na corrida pelo Eldorado, e dentro no “pacote de bondades” do Planalto, as esquecidas cisternas não serão lembradas? Não nos enganemos com medidas paliativas e de cunho eleitoral, pois há muito o Nordeste e demais regiões do Brasil precisam de projetos duradouros, fortalecidos com recursos que não se esgotem, politicamente.
Em vista disso, salienta-se que no Nordeste a governança hídrica ainda perpassa políticas ineficazes, com projetos faraônicos, disputas por obras, antes de finalizá-las; desvios de verbas; pouca adaptação do sertanejo ao clima local; falta revitalização dos solos, das fontes hídricas; e o corte de verbas públicas para um melhor desenvolvimento regional, pensando na valorização e na valoração dos serviços ecossistêmicos locais, agregando valor aos mesmos, trazendo projetos geradores de renda para os mais pobres; justiça no acesso à terra e a água, e que pudesse manter o sertanejo no campo, com dignidade e qualidade de vida.
Para Brauman (2015) “Os serviços ecossistêmicos relacionados à água são os benefícios obtidos dos ecossistemas para os quais a composição, a estrutura e a sua função dependem de um suprimento de água.”
A segurança hídrica significa que cada pessoa tem acesso à água segura suficiente a um custo acessível para levar uma vida limpa, saudável e produtiva, garantindo que o ambiente natural seja protegido e reforçado (GLOBAL WATER PARTNERSHIP, 2000, p.1).
Assim, resgato a importância dos projetos do Plano Brasil sem Miséria, lançado em 2011, onde foram pensados para prover o consumo da população; produção de alimentos; melhoraria da agricultura de subsistência; criação de animais; possibilitando um excedente para comercialização dos produtores rurais. Fazendo parte dessa política: cisternas de consumo; de produção; sistemas coletivos de abastecimento de água; kits de irrigação; pequenas barragens; projetos de dessalinização de poços; e formação de barreiros.
Esse projeto consistiu na ampliação do programa anterior de combate à pobreza do Governo Lula (conhecido por Bolsa Família). O público-alvo do programa é a camada mais pobre da população brasileira, que vive em condições de extrema pobreza. Uma mazela que aumentou nesses últimos anos de pandemia do coronavírus. Pois segundo estudos da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o número de cidadãos que vivem abaixo da linha da pobreza triplicou, e atinge cerca de 27 milhões de pessoas, 12,8% da população brasileira. Os pesquisadores afirmam que os altos níveis de desemprego e a ausência de políticas públicas dificultaram o acesso à renda, conduzindo para o pior cenário da pobreza no Brasil, nos últimos dez anos.
O “debate chave” é achar um modelo de desenvolvimento, em que o meio ambiente saudável seja o caminho, não o fim. Para isso, deve-se usar novas descobertas científicas; uma economia mais estratégica, com produtividade, e rentabilidade socioambiental. Cabe assim, novas relações de poder, por parte do estado, que pense os conflitos distributivos, no intuito de reduzi-los, pensando as relações ecológicas desse país.
Para Ferrão et al. (2020, p.342) a disponibilidade hídrica depende de fatores quantitativos e qualitativos, da forma do uso da água e do solo, das diferentes distribuições regionais de água doce, da distribuição da população humana nas regiões de terra firme. Por isso, apesar da existência de grande quantidade de água em determinadas regiões do Brasil, não significa que ela esteja disponível aos usos múltiplos da sociedade.
Para a Comissão Europeia (2009) as pessoas desfavorecidas, nomeadamente nos países em desenvolvimento, são as que mais riscos correm com a perda de biodiversidade, uma vez que dependem com mais frequência dos bens e serviços ecossistêmicos. Se os mesmos não forem salvaguardados, os produtos e serviços que oferecem tornar-se-ão cada vez mais raros e procurados.
Portanto, temos mais uma chance nesse ano eleitoral de pensarmos, juntos, um país do futuro, mais sustentável, mais humano, e com melhorias em nossas políticas públicas, sejam essas voltadas ao planejamento dos centros urbanos ou às áreas rurais. Pois todos os espaços ocupados em nosso território merecem atenção, merecem respeito e justiça ambiental. E, temos que lembrar que assim como a água, um bem vital aos cidadãos, e que possibilita melhorias de vida, e poder de transformação, algo tão importante é o poder do voto que direcionado à não democracia pode gerar grande escassez.
Veja em: https://outraspalavras.net/outrasmidias/quando-a-politica-para-por-nao-render-propina/
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