Boitempo reúne textos – a maioria nunca publicados no Brasil – do período de amadurecimento intelectual do pensador, quando liderou a formação do Partido Comunista Italiano. Leia, com exclusividade, a apresentação. Sortearemos 2 exemplares
Por: Guilherme Arruda
Os líderes e as massas é o terceiro livro da coleção Escritos gramscianos. Organizada por nossos parceiros da Boitempo Editorial, a coleção busca ampliar a bibliografia disponível em português da vasta obra do pensador marxista italiano.
O novo volume reúne 34 textos escritos por Antonio Gramsci de 1921 a 1926, 29 dos quais são inéditos no Brasil. Os anteriores focam no fatídico ano de 1917 e no período de 1916 a 1920. A seleção dos artigos ficou por conta de Gianni Fresu, que também apresenta a obra. Carlos Nelson Coutinho e Rita Coitinho foram responsáveis pela tradução.
Gramsci, nascido a 22 de janeiro de 1891, completaria neste mês 132 anos. Nos somando às comemorações de sua vida e luta, sortearemos dois exemplares de Os líderes e as massas, coletânea de textos de Antonio Gramsci, entre os apoiadores do nosso jornalismo.
APRESENTAÇÃO PARA OS LÍDERES E AS MASSAS
GIANNI FRESU
Este volume dos escritos de Antonio Gramsci sucede à publicação de Homens ou máquinas e dá continuidade ao trabalho nele encaminhado sobre a democracia dos conselhos, a nova ordem em que deveria expressar-se a vontade transformadora das grandes massas populares [1] , enraizando o processo revolucionário no seio da realidade produtiva [2]. Trinta e quatro documentos – 29 dos quais inéditos no Brasil – escritos entre 1921 e 1926 mostram uma fase densa de contradições e muito importante para a maturação intelectual de Gramsci, em particular sobre o tema resumido no título deste volume.
A natureza dualista das relações entre líderes e massas é um tema central na elaboração teórica de Gramsci por diversas razões, sobretudo porque, internamente a essa contradição, encontram-se tanto as origens como a força persuasiva das relações de exploração e domínio características da sociedade burguesa. Diante desse problema, as organizações do movimento operário mostraram-se inadequadas para derrubar os velhos padrões da arte política, acabando por aplicá-los internamente e atribuindo mais uma vez às classes populares o papel de “massa de manobra” para os líderes. Na opinião de Gramsci, o apelo do socialismo maximalista às massas era meramente retórico, não orgânico; não pressupunha nem prefigurava nenhum esforço educacional e político para elevar sua consciência e vontade. Nesse sentido, qualquer declaração sobre a necessidade de interpretar a “vontade das massas” era instrumental, porque configurava um tipo de relação militar e bonapartista entre líderes e povo. As massas serviram de base de legitimação para os líderes, que interpretaram sua vontade para seu próprio uso, para procurar post factum o consentimento popular às diretrizes políticas que, de fato, eram apenas o resultado da intuição intelectual exclusiva dos grupos dirigentes, não o fruto de um processo molecular de elaboração coletiva popular [3].
Contra tudo isso, nesse período Gramsci começa a elaborar de forma mais orgânica o problema organizativo da luta para a emancipação, com a convicção de que a predominância de organismos coletivos e amplos de direção política teria levado à superação dos antigos esquemas “naturalistas” da arte política e, mais amplamente, da relação entre líderes e massas na sociedade. A disseminação dos partidos de massa e sua adesão orgânica à vida mais íntima das classes populares, juntamente com a formação de sua consciência crítica de classe, entendida como a superação de uma forma desorgânica, casual e mecânica dos sentimentos populares, são os elementos essenciais dessa mudança na qual já se vislumbram os germes da sociedade futura.
Nesse sentido, no artigo escrito por ocasião da morte de Lênin em 1924 [4], Gramsci se faz algumas perguntas sobre as relações necessárias entre o partido e as massas no processo de objetivação institucional da nova ordem. Cada Estado é uma ditadura e, enquanto houver a necessidade de Estado, surgirá o problema de direção, do “líder”. No entanto, no contexto da transição para o socialismo, o problema essencial não é a existência ou não de um “líder”, mas a natureza das relações entre ele e as massas. Em outras palavras, se vigoram relações puramente hierárquicas e militares ou, ao contrário, relações de caráter orgânico. Para que o “líder” e o partido não sejam uma excrescência, uma sobreposição não natural e violenta no corpo das massas, ambos devem primeiro fazer parte da classe, ou pelo menos representar seus interesses e aspirações mais vitais. Para Gramsci, Benito Mussolini representou perfeitamente todas as características mais negativas do chamado “líder carismático”, tentou seduzir as massas com sua oratória brilhante e golpes teatrais, mas nunca teve (nem tentou instaurar) uma conexão orgânica com elas [5].
[…]
O PROBLEMA SINDICAL
A questão do poder em Gramsci desenvolveu-se em aberta polêmica tanto com o reformismo socialista, que achava possível resolver os problemas da contradição entre capital e trabalho por meio da prática parlamentar, quanto com o sindicalismo, que se desinteressava da conquista do Estado. Nenhum, segundo ele, conseguia ir além do horizonte da sociedade capitalista – o reformismo porque achava possível procurar a emancipação do homem dentro do Estado burguês; o sindicalismo porque concebia e organizava os operários como salariados, não como produtores [33].
O sindicato é comparado por Gramsci a uma sociedade comercial, que, no interesse do proletariado, tende a realizar um preço máximo para a mercadoria-trabalho, diferindo do mercantilismo capitalista apenas no nível subjetivo. Sendo composto de trabalhadores, o sindicato tende a despertar neles “a consciência de que, no âmbito do sindicalismo, é impossível alcançar a autonomia industrial dos produtores”; para alcançá-la, é necessário “apoderar-se do Estado” e usá-lo para “reorganizar todo o aparelho de produção e troca” [34]. Nesse processo emancipatório, o sindicato, por sua estrutura e seu modo de operar, não pode ser “a célula da futura sociedade dos produtores” [35]. Na verdade, o sindicato manifesta sua subjetividade nas assembleias de seus membros e pela atividade de sua burocracia gerencial. Se as primeiras são convocadas apenas para discutir as relações entre empresários e trabalhadores, ou seja, os problemas da sociedade capitalista, a seleção de funcionários sindicais não se dá no terreno da técnica industrial, isto é, das habilidades que tornam um dirigente potencialmente capaz de administrar uma indústria ou governar uma cidade, ou nação. O sindicalista, que muitas vezes passa de uma categoria para outra sem nunca ter exercido sua profissão, é escolhido com base em leis puramente comerciais:
Ele não é obrigado a conhecer as condições técnicas reais da indústria, mas apenas a legislação privada que regulamenta as relações entre empresários e mão de obra. […] O movimento sindical nada mais é que um movimento político; os dirigentes sindicais nada mais são que leaders [líderes] políticos que chegam à posição que ocupam por incorporação, em vez de eleições democráticas. [36]
Gramsci chega a comparar o sindicalista com a figura do “banqueiro qualificado”, que tem senso empresarial e capacidade de prever as tendências do mercado de ações e contratos, sugerindo as melhores formas de investimento para maximizar os retornos: um “líder sindical que sabe prever os resultados possíveis do entrechoque das forças sociais em luta atrai as massas para sua organização, torna-se um banqueiro de homens” [37].
Se o internacionalismo é um valor fundador do movimento operário, no contexto da crise global do capitalismo, segundo Gramsci, era ainda mais urgente desenvolver uma luta internacional pela reorganização da produção que levasse à criação de um órgão supremo de defesa da classe trabalhadora em todas as partes do planeta. No caso específico da Itália, onde a crise foi associada à ofensiva armada do fascismo contra o trabalho e em defesa do capital, os sindicatos tiveram de considerar seriamente o perigo de um golpe de Estado e preparar-se para resistir e responder militarmente, não com as petições de princípios: “A literatura liberal do Renascimento italiano sustenta que, em última análise, a única garantia existente contra possíveis intervenções autoritárias reacionárias é o direito popular à insurreição armada. Os líderes da confederação são pelo menos tão liberais quanto os liberais do Renascimento?” [38].
No auge da ofensiva fascista, em uma situação extremamente difícil para as organizações sociais e políticas do proletariado italiano, Gramsci interveio para reiterar sua oposição à criação de um novo sindicato de clas-se autônomo, pois, historicamente, cada tentativa nessa direção só havia conseguido aumentar a hegemonia dos líderes sindicais reformistas sobre os trabalhadores. Os operários poderiam ter representado o momento mais alto da consciência de classe, desde que mantivessem contato orgânico com as massas, a ponto de compartilhar “seus erros, suas ilusões e suas decepções” [39]. Embora a Central Geral do Trabalho tenha sido reduzida a um décimo de seu poder numérico de 1920, ela ainda representava a classe trabalhadora italiana como um todo. A fração reformista levou-a a manter todo o seu aparato de quadros dirigentes e intermediários, para enraizar seus militantes mais capazes e inteligentes no local de trabalho, demonstrando objetivamente perseverança e tenacidade muito maiores que a dos quadros sindicais comunistas. Toda a esfera de elementos revolucionários, que demonstraram capacidade de liderança e organização no passado, havia sido dispersada ou tornada inofensiva pela violência fascista.
A classe trabalhadora era como um grande exército que fora subitamente privado de todos os seus oficiais subordinados; em tal exército seria impossível manter a disciplina, o espírito de luta, a unidade de direção pela mera existência de um Estado-maior. Toda organização é um complexo articulado que só funciona se houver uma relação numérica congruente entre as massas e os líderes. Não temos quadros, não temos vínculos, não temos serviços para abraçar a grande massa com nossa influência, para capacitá-la, para torná-la um instrumento eficaz de luta revolucionária [40].
Diante dessa crise de subjetividade e capacidade organizacional fora da fábrica, a comissão interna continuou a cumprir sua função, pois, mesmo para os fascistas e os capitalistas, era necessária uma forma de organização na fábrica para manter a disciplina e o bom funcionamento da produção. A fábrica continuou a existir e, naturalmente, organizou os trabalhadores, colocando-os em contato uns com os outros, e foi precisamente isso que tornou os trabalhadores fortes dentro das fábricas, mesmo que fora delas fossem fracos e isolados. De tudo isso, os comunistas tiveram de extrair as indicações para seu trabalho político, desenvolvendo sua ação o máximo possível em contato estreito com as grandes massas, juntando-se plasticamente à vida da classe trabalhadora, a fim de construir no meio delas seus próprios quadros dirigentes. Mais concretamente, as indicações que Gramsci captou da situação contingente estavam diretamente ligadas à elaboração nascida no coração do movimento comunista, encontrando mais uma vez no trabalho dentro das fábricas e nas comissões internas a esfera privilegiada da subjetividade revolucionária para os comunistas.
Gramsci havia compreendido que, para o fascismo e o capitalismo, “é necessário que a classe operária seja privada de sua função histórica de guiar as demais classes oprimidas da população (camponeses, especialmente do Sul e das ilhas – pequeno-burgueses urbanos e rurais)” [41]. Numa fase histórica marcada por uma “crise orgânica” do capitalismo, que era ao mesmo tempo “crise de hegemonia” das ideologias tradicionais, para os grupos dirigentes italianos o fascismo cumpriu um papel indispensável: impedir que a classe trabalhadora assumisse uma função de “classe universal”, quer dizer, de exercer uma hegemonia mais ampla não só sobre as massas exploradas, mas também rumo à pequena burguesia empobrecida pela crise. É sempre importante lembrar que Benito Mussolini entrou para o Parlamento com outros 35 deputados fascistas graças à bondosa hospitalidade das listas do expoente mais importante da história liberal italiana: Giovanni Giolitti. Mas certamente não foi caso isolado; ao contrário, o editor do jornal histórico da burguesia italiana (Il Corriere della Sera), Luigi Albertini, o principal político de referência daquele jornal, Antonio Salandra, e o principal filósofo de todas as camarilhas liberais nacionais, Benedetto Croce, saudaram calorosamente a irrupção da violência fascista e sua chuva de socos sobre o movimento de trabalhadores e camponeses rebeldes. O fascismo chegou ao poder por um golpe de Estado preparado e realizado com o apoio da monarquia, das Forças Armadas e da burocracia estatal, mas foi possível porque o liberalismo italiano decidiu apostar em Mussolini, na crença de que o homem da providência seria constitucionalizado, ou seja, absorvido pelas práticas usuais de composição por cooptação individual das classes dirigentes italianas, de modo a colocá-lo a serviço das formas conservadoras tradicionais de modernização italiana que, depois, Gramsci definiu pelo paradigma da “revolução passiva”.
A VISÃO PEDAGÓGICA DO PARTIDO
Como sabemos, ao longo de sua trajetória teórica e política Gramsci sempre atribuiu ao partido político um papel pedagógico fundamental para elevar o nível de consciência funcional das massas populares e levá-las a uma função dirigente na luta pela emancipação. Isso era determinante para encaminhar de forma molecular o processo de autodeterminação espiritual e material por meio do qual alcançar a plena autonomia dos produtores [42]. De forma coerente com essa visão, no período que antecedeu o Congresso de Lyon, o intelectual sardo atribuiu grande importância ao trabalho de formação interna, justamente para marcar uma profunda descontinuidade com a concepção do partido de Amadeo Bordiga.
Já nas colunas de L’Ordine Nuovo Gramsci explicou que as intenções das várias tentativas de “‘universidades’ proletárias”, embora louváveis, falharam pela pretensão de dar a essa instituição de treinamento um caráter sociopolítico neutro. Além de serem esporádicas e sem coesão unitária, elas não deixaram marcas profundas e foram incapazes de ir além da “aridez e infertilidade dos restritos movimentos ‘culturais’ burgueses”, pois não tinham nenhuma ligação com um “movimento de caráter objetivo” [43].
Entretanto, na perspectiva do chamado “espírito de cisão”, alimentado pela construção orgânica de uma visão crítica e coerente do mundo, a ferramenta educacional tinha de ser entendida de forma radicalmente diferente da velha educação burguesa, liberando-a de qualquer tentação pedagógica desinteressada: “Nenhum ‘estudo objetivo’ e nenhuma ‘cultura desinteressada’ podem ter lugar nas nossas fileiras; portanto, nada que se assemelhe àquilo que é considerado um objeto normal de ensinamento segundo a concepção humanista, burguesa, da escola” [44].
Pelo contrário, a escola do partido devia ser coerente com os objetivos dessa nova subjetividade política que estabelece para si mesma a tarefa histórica de transformar o atual estado de coisas e, portanto, fornecer os instrumentos de crescimento intelectual necessários para refinar as capacidades de luta dos indivíduos e de toda a organização. O estudo e as ferramentas culturais deviam contribuir para criar uma “consciência teórica de nossos objetivos imediatos e supremos” que não estava ainda presente no organismo do partido em medida suficiente para sua tarefa histórica. “A escola do partido deve procurar preencher a lacuna entre o que deveria ser e o que não é.” [45]
Nesse sentido, em 1925, Gramsci escreveu uma introdução ao primeiro curso da escola interna ao PCd’I [46], cujo objetivo de reforçar ideológica e politicamente os quadros e os militantes era visto como a tarefa principal de um partido que tinha a intenção de tornar-se um partido de massas. A formação era uma maneira de transformar o operário comunista em dirigente e não deixar a luta ideológica exclusivamente nas mãos dos intelectuais burgueses.
A atividade teórica, isto é, a luta no front ideológico, sempre foi negligenciada no movimento operário italiano. Na Itália, o marxismo […] foi mais estudado pelos intelectuais burgueses, com o intuito de distorcê-lo e direcioná-lo ao uso da política burguesa, que pelos revolucionários. […][serviu] de tempero para todos os molhos mais indigestos que os mais insolentes aventureiros da caneta quiseram pôr à venda. Foram marxistas desse feitio Enrico Ferri, Guglielmo Ferrero, Achille Loria, Paolo Orano, Benito Mussolini… [47]
Na introdução ao curso da escola do partido, Gramsci expressou, antes de tudo, sua preocupação de que a condição de ilegalidade ou semilegalidade, imposta ao movimento operário pela ofensiva reacionária desencadeada pelo fascismo, pudesse mudar molecularmente a maneira como os militantes revolucionários concebiam sua luta. Com a supressão forçada das liberdades de imprensa, reunião, associação e propaganda, a repressão e a destruição da sede associativa do movimento, a própria formação dos quadros não podia mais recorrer a métodos e formas tradicionais que precederam a Marcha em Roma. Diante dessa condição forçada, o medo de Gramsci era de que, em um partido que agora estava acostumado à clandestinidade, ocorresse uma mudança do tipo blanquista na forma de interpretar a ação política. Tirando uma lição do violento golpe de Estado com o qual “minorias armadas e militarmente organizadas” haviam tomado e retido o poder, o risco era que uma visão sectária semelhante de organização e ação política pudesse também se afirmar no movimento comunista, distanciando-o da “concepção marxista da atividade revolucionária do proletariado” [48].
O ressurgimento dos partidos políticos revolucionários, após um período de ilegalidade, é com frequência caracterizado por um impulso irreprimível de ação pela ação, sem nenhuma consideração sobre as relações reais das forças, o estado de espírito da grande classe trabalhadora e das massas camponesas, as condições de armamento etc. Aconteceu com demasiada frequência que o partido revolucionário se deixasse massacrar por uma reação que ainda não havia se desintegrado e cujas reservas não haviam sido corretamente apreciadas, em meio a indiferença e passividade das massas, que, após cada período reacionário, se tornavam muito mais cautelosas e eram facilmente tomadas de pânico sempre que um retorno à situação em que haviam sido deixadas era ameaçado [49].
A partir de 1923, com o apoio direto do Comintern, Gramsci entrou abertamente em conflito com Bordiga, tendo a declarada ambição de determinar uma nova direção política para o partido. Nesse período, o intelectual sardo exerceu toda a sua influência política para determinar uma ruptura com o velho “chefe”, porque as diferenças com ele não se reduziam à posição na “frente única” ou às relações com os socialistas, mas diziam respeito à ação política dos comunistas italianos e mesmo à concepção do partido. Gramsci, dirigindo-se antes aos antigos camaradas do grupo de Turim, apresentou em termos inequívocos a necessidade de um novo grupo de liderança, tão distante do sectarismo de Bordiga quanto do confuso maximalismo de direita de Angelo Tasca [50]. No fim dessa intensa dialética, entre fevereiro e março de 1923, Gramsci conseguiu vencer a batalha, convencendo os antigos camaradas a alinhar-se a suas posições. O resultado positivo do processo foi influenciado pelo lançamento da nova série de L’Ordine Nuovo, em 1o de março de 1924. Gramsci envolveu todo o grupo dirigente do PCd’I no projeto editorial, inclusive Tasca e Bordiga, mas, acima de tudo, fortaleceu aqueles laços essenciais ao estabelecimento de uma nova maioria. Enquanto isso, nas eleições políticas de 6 de abril, Gramsci foi eleito deputado no colégio eleitoral do Vêneto. Graças à imunidade parlamentar, finalmente conseguiu deixar Viena e retornar à Itália, em 12 de maio. No mesmo período, ocorreu em Como a Conferência Nacional que determinou a virada no grupo dirigente do partido; a fase seguinte, até o Congresso de Lyon, caracterizou-se pela consolidação da nova maioria em torno de Gramsci, novo secretário-geral do partido, e pela intensificação da atividade fracionista e de oposição de Bordiga [51]. A introdução ao primeiro curso da escola, até agora comentada, foi escrita em meio a esses conflitos, antecipando, assim, os temas centrais do Congresso de 1926; nela podemos ler a duríssima crítica de Gramsci às concepções de partido expostas por Bordiga nas Teses sobre a tática do Congresso de Roma:
A centralização e a unidade eram concebidas [nas Teses] de um modo muito mecânico: o Comitê Central – aliás, o Comitê Executivo – era todo o partido, em vez de representá-lo e dirigi-lo. Se essa concepção tivesse sido aplicada permanentemente, o partido perderia suas características políticas próprias e tornar-se-ia, no melhor dos casos, um exército (e um exército de tipo burguês), perderia sua força de atração, separar-se-ia das massas. Para que o partido viva e esteja em contato com as massas é preciso que cada um de seus membros seja um elemento político ativo, seja um dirigente. […] A preparação ideológica de massa é, portanto, uma necessidade da luta revolucionária, é uma das condições indispensáveis da vitória. [52]
A VIRADA DO CONGRESSO DE LYON
As Teses do Congresso de Lyon de 1926 foram definidas como o ponto de virada fundamental na história dos comunistas na Itália, tanto em relação à concepção do partido como em relação à análise da sociedade italiana. Em ambos os casos, as Teses elaboradas por Bordiga para o Congresso de Roma foram de todo superadas após a profunda mudança na direção política do partido sob a liderança de Antonio Gramsci. Segundo David Bidussa, o repensamento estratégico imposto pela mudança de contexto interno e internacional envolvia também as concepções da democracia operária. Nesse sentido, segundo ele, já no período de 1924 a 1925, o grupo que se junta sob a liderança de Gramsci sente “a necessidade de refundar uma linha política”. Um processo autocrítico que levaria o novo grupo dirigente a
perguntar-se se as formas da política assumidas como vencedoras em 1917 não são mais as adequadas para o sucesso do processo revolucionário. E se, portanto, o tema da possibilidade da revolução no Ocidente não necessitaria também se despedir do modelo dos conselhos e, portanto, não os considerar mais a forma capaz de produzir a transformação. [53]
O Congresso de Lyon aconteceu em meio ao segundo golpe de Estado de Mussolini, quando o regime se livrou de vez das proteções constitucionais residuais em defesa da pluralidade democrática, anulando pela própria legislação aquelas liberdades individuais e coletivas que já haviam sido de fato conculcadas.
Os líderes do Partido Comunista e, antes de todos, Gramsci, foram presos, iniciando-se sua provação nos Tribunais Especiais, entre a prisão e o confinamento forçado. A ação repressiva foi extremamente eficaz em dezembro de 1926: um terço dos aderentes do partido estava detido; no entanto, a organização comunista foi a única força antifascista que conseguiu manter uma estrutura operacional clandestina dentro do país. Tudo isso é confirmado pelos relatos do muito poderoso e eficiente chefe de polícia Arturo Bocchini, que em 1927, em seu relatório de fim de ano, observou com satisfação que, após a implementação da Lei Consolidada de Segurança Pública, qualquer atividade dos partidos de oposição ao regime poderia ser considerada completamente esmagada. Como apontam as notas do “viceduce”, houve uma exceção: o Partido Comunista Italiano [54]. Essa organização, apesar das ondas de repressão que decapitavam sua rede de tempos em tempos, sempre manteve uma estrutura clandestina, graças ao influxo de novos aderentes, em especial os jovens. Entre 1926 e 1943, das 4.671 pessoas condenadas pelo Tribunal Especial fascista, 4.030 eram membros do Partido Comunista, e dos 28.671 anos de prisão a que foram condenados, quase 24 mil diziam respeito a seus líderes e seus militantes [55].
Pouco antes dessa nova ofensiva que desbaratou o partido, no Congresso de Lyon confrontaram-se e chocaram-se duas ideias radicalmente opostas de partido, assim resumidas: 1) o partido entendido como parte da classe, ou seja, uma organização com ambições de massa, articulada em células de fábrica e empenhada na formação permanente de todos os seus quadros; 2) o partido considerado órgão externo à classe, ou seja, uma organização restrita a dirigentes revolucionários intransigentes e incorruptíveis, capazes de ler no quadro econômico e social as contradições fundamentais das quais brotariam, no momento oportuno, as causas do estopim revolucionário. No primeiro caso, temos a ideia de um partido com a ambição de aderir organicamente à estrutura produtiva – em cuja base está uma concepção molecular e processual de revolução, metodologicamente adversa a qualquer messianismo – e a intenção de moldar plasticamente sua atividade à ação cotidiana dos trabalhadores, a chamada luta econômica. No segundo, uma elaboração que considera a luta pela melhoria das condições de vida e trabalho, bem como a luta política pela conquista cotidiana de posições de força na sociedade, o veículo de mentalidade corporativa e de corrupção da pureza revolucionária. Por essa interpretação, a conexão entre partido e massas só aconteceria no momento específico do conflito de classes. O período compreendido entre o início de 1925 e o congresso de janeiro de 1926 foi crucial para a evolução do pensamento de Gramsci relativo ao partido, à relação deste com as massas e às funções nele desempenhadas pelos intelectuais; um período no qual amadureceram completamente as experiências de direção e orientação política assumidas a partir de 1923.
Uma fase em que sua análise se desenvolveu com o objetivo de questionar o papel desempenhado na sociedade italiana pelos intelectuais e pelos aparelhos culturais, que, segundo Gramsci, representavam o momento fundamental da centralização ideológica exercida pelas classes dominantes no terreno da sociedade civil. Nessa análise já estava presente a redefinição do conceito de Estado que antecipou a categoria hegemônica. As reflexões de Gramsci nessa fase são a base essencial da teoria sobre os intelectuais desenvolvida em A questão meridional* e nas reflexões dos Cadernos do cárcere. Ao mesmo tempo, esta é o ponto de chegada daquela e, no todo, tem suas raízes na experiência ordinovista. A plataforma congressual da esquerda, publicada em L’Unità de 7 de julho de 1925, assentava sobre três eixos fundamentais as posições já expressas diversas vezes por seu líder, Amadeo Bordiga: 1) o partido deveria ser entendido como o órgão da classe que sintetiza e unifica os anseios individuais, de modo que se diferencie dos particularismos de categoria e atraia os elementos provenientes do proletariado de diversas categorias, dos camponeses, dos desertores da classe burguesa; 2) rejeitava-se a “bolchevização” (dada no V Congresso e reafirmada pelo “grupo centrista” dirigido por Gramsci), isto é, a repartição organizativa do partido em células nas bases das fábricas; 3) recusava-se a luta contra as frações determinada pelo Comintern.
Esse posicionamento ganhou sua expressão mais completa no projeto das Teses para o congresso. Segundo Bordiga, era impossível alterar a essência das situações objetivas, decorrentes do quadro mais geral das relações sociais de produção, por meio de determinada forma organizativa. Uma organização imediata de todos os trabalhadores com base na economia acabaria constantemente dominada pelos impulsos das diversas categorias profissionais de satisfazer os próprios interesses econômicos particulares determinados pela exploração capitalista. Daí provinha a profunda desconfiança, manifestada já na época dos conselhos, diante do empenho da organização nas disputas dos trabalhadores, no sindicato. No mesmo número de 7 de julho de L’Unità, Gramsci encarregou-se de dirigir-lhe uma réplica importante. Nela já se manifestava plenamente a continuidade com as elaborações dos anos de L’Ordine Nuovo sobre o tema da autonomia dos produtores, e era abordada pela primeira vez a ideia do “intelectual orgânico”, segundo a qual cada trabalhador, ao entrar para o Partido Comunista, tornava-se um dirigente e, portanto, um intelectual. A esquerda concebia o partido como síntese dos elementos individuais e não como um movimento de massas e classe, e essa era a raiz da teoria do partido em Bordiga.
Nessa concepção há uma coloração de marcado pessimismo quanto à capacidade dos operários enquanto tais, uma vez que apenas os intelectuais poderiam ser homens políticos. Os operários são operários e não podem mais que isso enquanto o capitalismo os oprime: sob a opressão capitalista, o operário não pode se desenvolver completamente, não pode fugir do espírito típico de sua categoria. E o que é, assim, o partido? Restringe-se tão somente ao grupo de dirigentes que refletem e sintetizam os interesses e as aspirações genéricas da massa, mesmo no partido. A doutrina leninista afirma e demonstra que essa é uma concepção falsa e extremamente perigosa; ela levou, entre outros problemas, ao fenômeno do mandarinismo sindical. […] Os operários entram para o Partido Comunista não apenas como operários (metalúrgicos, marceneiros, construtores etc.), mas como operários comunistas, como homens políticos, isto é, como teóricos do socialismo, portanto não como simples rebeldes; e no partido, por meio das discussões, das leituras, da escola do partido, desenvolvem-se continuamente, tornam-se dirigentes. Somente no sindicato o operário entra em sua qualidade de operário, não de um homem político que segue determinada teoria. [56]
Segundo Gramsci, a concepção de Bordiga estava presa à primeira fase do desenvolvimento capitalista. Em 1848 ainda seria possível afirmar que “o partido é o órgão que sintetiza e unifica os anseios individuais e coletivos provocados pela luta de classes”, mas, na fase de maior desenvolvimento capitalista (o imperialismo), o proletariado era profundamente revolucionário e já assumia uma função dirigente na sociedade. Em seu informe à reunião da Comissão Política para o congresso, Gramsci comparou os pontos de divergência entre “o centro do partido” e a “extrema esquerda” em três níveis de relação: 1) entre grupo dirigente do partido e demais filiados; 2) entre grupo dirigente e classe operária; 3) entre classe operária e o restante das classes subalternas:
Nossa posição deriva da conclusão de que se deve dar o máximo destaque ao fato de que o partido é unido à classe não apenas por laços ideológicos, mas também por ligações de caráter físico. […] Segundo a extrema esquerda, o processo de formação do partido é um processo sintético; para nós, é um processo de caráter histórico e político, estreitamente ligado ao desenvolvimento da sociedade capitalista. Essa diferença de entendimento nos leva a determinar de modo distinto as funções e as tarefas do partido. Em decorrência das concepções equivocadas da extrema esquerda, todo trabalho que o partido deve realizar para elevar o nível político das massas, para convencê-las e trazê-las ao terreno da luta de classes revolucionária, vem sendo desvalorizado e dificultado, em razão da separação inicial que se criou entre o partido e a classe operária. [57]
A questão teórica da organização por células ressaltava a necessidade de “ligações físicas” entre partido e classe num conjunto, enquanto, na afirmação de uma necessária “tutela” dirigente por parte do grupo especializado, Bordiga apresentava como problema central o risco de corporativismo entre os operários. Para Gramsci, isso evidenciava uma concepção paternalista que desvalorizava muito a capacidade de direção da classe operária, de modo a reduzi-la a sujeito menor, incapaz de autodeterminação política.
Já no decorrer do debate que antecedeu o Congresso de Lyon, e em maior medida no próprio evento, Gramsci apresentou a teoria sobre o partido da esquerda em continuidade com toda a história intelectual da Itália, com a filosofia de Croce e a tradição elitista e oligárquica da filosofia política idealista e liberal. Tal conceito seria retomado nos Cadernos, nos quais Gramsci colocou no mesmo plano o comportamento intelectualista do “intelectual puro” de Bordiga e o de Croce.
O que importa para Croce é que os intelectuais não se rebaixem ao nível da massa, que entendam que uma coisa é a ideologia, instrumento prático para governar, e outra coisa é a filosofia e a religião, que não devem ser prostituídas na consciência dos mesmos sacerdotes. Os intelectuais devem ser governantes e não governados, construtores de ideologias para governar os outros e não charlatães que se deixam envenenar e morder por suas próprias víboras. […] A posição de “intelectual puro” vem a ser um verdadeiro “jacobinismo” deteriorado e, nesse sentido, guardadas as diferentes estaturas intelectuais, Amadeo pode ser comparado a Croce. [58]
Ao tratar do tema da relação entre a classe operária e o restante dos explorados e fazer dele a base das teses congressuais, Gramsci enfatizou o valor estratégico atribuído por Lênin à questão camponesa e à política de alianças [59]. Para Lênin, se existia a aspiração de não apenas iniciar uma revolução, mas sobretudo vencê-la e conservar o poder, era necessário preparar profundamente a revolução, “conquistar as grandes massas”, “obter a simpatia das massas”: “Atrair para nós não apenas a maioria da classe operária, mas também a maioria da população trabalhadora e explorada do campo” [60].
Esse era um tema fundamental para um país como a Itália, onde o proletariado era uma minoria sem caráter nacional. Mais precisamente, Gramsci tratou de traduzir para a Itália o grande tema debatido entre o III e o IV congressos da Internacional Comunista. Como já exaustivamente explicado, naquela ocasião, atentos às dificuldades internacionais e à complexidade dos processos revolucionários no Ocidente, Lênin e a Executiva do Comintern lançaram a palavra de ordem da conquista da maioria das classes subalternas e da unidade da classe operária por meio da tática da “frente única”, essencial para a definição das categorias de hegemonia em Gramsci. A diferenciação de Gramsci a respeito de Bordiga em relação às tarefas do partido e sua problemática relação com o Comintern no Terceiro Plenário também deve ser interpretada à luz da questão da tradutibilidade filosófica [61]. Nesse sentido, como aponta Francesco Giasi, até mesmo a famosa carta ao Executivo do Partido Comunista Italiano de 12 de setembro de 1923 [62] sobre a fundação do jornal L’Unità representa uma primeira tentativa de adaptar e traduzir o “governo dos trabalhadores e camponeses, uma palavra de ordem aprovada alguns meses antes no Terceiro Plenário, para a realidade histórica e política italiana” [63]. Mais uma vez, o tema da tradutibilidade foi fortemente colocado com relação à questão da “bolchevização”.
As teses de Lyon representam um divisor de águas fundamental, certamente o ponto mais alto no qual a elaboração teórica e a direção política de Gramsci encontram o momento de maior acordo. Na biografia de Gramsci, representam uma ponte entre as batalhas anteriores a 1926 e suas reflexões na prisão, o testemunho mais vivo de que é impossível separar o Gramsci político e militante do Gramsci “desinteressado” ou “homem de cultura”. A virada de Lyon constitui a premissa essencial para compreender o papel histórico assumido pelo Partido Comunista Italiano tanto na resistência como na fase seguinte à libertação do nazifascismo; é o antecedente mais grávido da profunda mudança na iniciativa comunista entre o VII Congresso do Comintern e a “virada de Salerno” de 1944. O resultado mais fértil dessa mudança foi conceber em termos orgânicos as questões da luta contra o fascismo e as da reconstrução democrática a partir da época constituinte. O ponto de acordo entre esses dois momentos foi a ideia de democracia progressiva, ou seja, a perspectiva de uma ampliação permanente dos espaços de democracia econômica, social e política, de modo a permitir ao mundo do trabalho ganhar posições de força, em um processo de transição democrática para o socialismo.
CONCLUSÕES
Como salientou Domenico Losurdo, os autores mais queridos da esquerda após o colapso do socialismo histórico são geralmente figuras de revolucionários derrotados, que não tiveram a oportunidade de participar dos problemas da gestão do poder, assumindo a responsabilidade pelas escolhas não tão fáceis associadas à transição socialista. Dessa forma, permanecem fiéis aos valores do socialismo e críticos do capitalismo, mas sem tomar posição sobre os eventos controversos dos processos revolucionários do século XX. Por mais que Gramsci faça parte desse pantheon, juntamente com figuras como Che Guevara e Rosa Luxemburgo, em suas considerações, Losurdo sublinha os importantes problemas de interpretação do pensamento de Gramsci que tal colocação inevitavelmente solicita e, concretamente, tem gerado nas últimas décadas:
Tal abordagem revela-se completamente incapaz de compreender o pensamento e a personalidade de Gramsci. Ele também foi um importante líder comunista e não pode ser transformado numa espécie de Horkheimer ou Adorno italiano, comprometido com a construção de uma teia crítica sem relação ou com uma relação exclusivamente polêmica com o movimento comunista e o “movimento real para a transformação da realidade”. […] Gramsci se empenha num esforço de compreensão empática do novo mesmo quando, aos olhos de um observador superficial, desconhecedor da terrível complexidade do processo revolucionário, parece trair as próprias razões de seu nascimento. [64]
Assumindo essa solicitação hermenêutica, o estudo dos materiais contidos no volume que aqui apresentamos não pode de forma alguma abstrair-se dos problemas associados à luta pela emancipação no mundo de hoje. A investigação sobre a obra de Gramsci deve resultar da constante interação entre filologia e tradução filosófica, pois os dois termos, reciprocamente funcionais um a outro, são imanentes à concepção do mundo do intelectual sardo. Sem o rigor filológico da investigação científica, é impossível traduzir Gramsci de forma coerente, de modo a tornar suas concepções adequadas à interpretação e transformação do mundo de hoje. Sem a ambição de traduzir filosofia em práxis, por meio da transição política da interpretação para a transformação do mundo, Gramsci seria privado de sua principal contribuição ao pensamento crítico, monumentalizando seu trabalho como se fosse um clássico que pouco ou nada tem a dizer sobre a realidade de hoje. Lidando com essa ordem de problemas, um grande estudioso gramsciano como Joseph Buttigieg polemizou com as tendências acadêmicas que pretendiam retirar o pensamento de Gramsci do terreno da política contemporânea, até arquivar suas concepções e suas categorias entre os vestígios arqueológicos da filosofia política antiga. Na parte final de sua vida, Gramsci foi preso no cárcere do fascismo – e hoje corre o risco de ficar prisioneiro de uma outra cadeia, o academismo; para liberar seu pensamento de qualquer tentativa de esterilização política, não existe abordagem mais gramsciana que estas palavras de Buttigieg, com as quais, por essa razão, concluímos esta apresentação:
Ao enfatizar a atenção e o cuidado especiais que devem ser dados aos textos de Gramsci, deve-se também alertar para o perigo que espreita, ou seja, o de transformar o legado de Gramsci em uma memória literária que induza à gratificação reverencial ou em um códice próprio para a gratificação dos estudiosos da Antiguidade. É claro que nada tornaria os escritos de Gramsci mais inúteis e irrelevantes que sua apoteose como momentos de um intelecto atemporal. Para que o legado de Gramsci seja preservado de alguma forma útil, seus curadores, intérpretes e leitores devem garantir que os escritos não sejam remetidos ao museu da história das ideias onde eles existiriam para agradar ao epicurismo contemplativo de guardiões de arquivos e aos admiradores acadêmicos destacados. No museu das obras-primas e das ideias, os livros de Gramsci se tornarão tão estéreis quanto a urna funerária que contém suas cinzas. [65]
Veja em: https://outraspalavras.net/blog/gramsci-inedito-em-novo-livro/
Comente aqui