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Wikifavelas: o Novo PAC e o “Periferia Viva”

Coordenado por um militante do MTST, programa promete políticas públicas e ações urbanizadoras nos territórios. Mas só a participação evitará repetir velhos problemas, como as remoções de comunidades para as obras da Copa

Por: Dicionário de Favelas Marielle Franco

Em 2007, durante o segundo governo do Partido dos Trabalhadores (PT), o Governo Federal lançou o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), uma iniciativa voltada para o desenvolvimento. A avaliação feita era que em meio à crise econômica internacional, o Brasil vivenciava uma estabilidade econômica que propiciaria realizar investimentos de grande porte em setores de infraestrutura, estabelecendo assim um novo modelo de desenvolvimento com estímulo ao crescimento econômico, sem comprometer a estabilidade financeira; investimento em obras que estivessem dentro do conceito de infraestrutura social (que é apresentado como novo), isto é, investimento em setores que incidissem diretamente sobre a qualidade de vida da população – saneamento e habitação, eletricidade, transporte, etc. Investimento econômico atrelado às políticas sociais: esta foi a principal imagem do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Esta iniciativa abriu uma agenda de políticas públicas urbanas para os territórios de favelas e periferias, impactando em vários sentidos a realidade de seus(uas) moradores(as). No âmbito do Rio de Janeiro – selecionado ná época como cidade-sede dos megaeventos esportivos -, o Programa Morar Carioca, por exemplo, foi destaque. Criado em 2009, foi reconhecido como uma nova versão do Programa “Favela-Bairro”, responsável pela remoção de diversas favelas na cidade. Porém, diferente do primeiro que levou infraestrutura apenas a algumas favelas da Zona Sul, o “Morar Carioca” teria a função de construir conjuntos habitacionais para realojar os(as) moradores(as) das favelas, alterando as dinâmicas da cidade. Retomado em abril de 2022, o Programa Morar Carioca, da Secretaria Municipal de Habitação, está atuando em 29 áreas da cidade do Rio de Janeiro.

Após anos de ações quase que exclusivamente de opressão policial em favelas e periferias por parte das Forças Armadas e das polícias, o governo federal estruturou o programa “Periferia Viva”, cujo objetivo é articular políticas públicas focadas nestes locais. No artigo desta semana, destacamos o verbete da plataforma wikiFavelas sobre esta nova política pública e enumeramos outros projetos do Novo PAC focados em territórios periféricos. Proposto na plataforma Brasil Participativo, o Periferia Viva é uma iniciativa da recém criada Secretaria Nacional de Periferias (SNP), ligada ao Ministério das Cidades. A área é comandada pelo sociólogo Guilherme Simões, militante do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST).

Somente para o Programa Periferia Viva, o Novo PAC investirá o montante de R$ 12 bilhões. Deste valor, R$ 9.8 bilhões serão destinados à urbanização de favelas. A maioria dos territórios que serão atendidos pela urbanização está localizada nas regiões Norte (30) e Nordeste (32). Com valor total de R$ 1,7 trilhão, o Novo PAC prevê o investimento em periferias para além desta política específica. O Programa de Aceleração do Crescimento está ancorado em nove eixos: Saúde, Educação, Defesa, Energia, Inclusão Digital, Água para Todos, Cidades Sustentáveis, Infraestrutura Social e Transporte eficiente.

O Periferia Viva compõe o eixo Cidades Sustentáveis e Resilientes, cujos recursos são maiores do que os outros oito anunciados. O Minha Casa, Minha Vida (MCMV) é o programa que contará com o maior investimento no Novo PAC: R$ 354,4 bilhões no total. Sua meta é atingir a construção de 2 milhões de habitações, num importante diálogo com o direito à cidade. Outros subeixos de Cidades Sustentáveis e Resilientes que impactam favoravelmente as periferias são: Prevenção a Desastres, Contenção de Encostas e Drenagem (R$ 14,9 bilhões), Esgotamento sanitário (R$ 26,8 bilhões) e Mobilidade Urbana Sustentável (R$ 48,8 bilhões).

O Ministério da Saúde, por exemplo, vai investir R$ 150 milhões em projetos de Telessaúde, garantindo o direito à saúde para áreas remotas como comunidades rurais, indígenas, ribeirinhas e quilombolas. Dentro do contexto do Complexo Econômico-Industrial da Saúde (CEIS), a Fiocruz vai construir um Complexo de Biotecnologia em Santa Cruz, um dos bairros com pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Rio de Janeiro. Serão investidos R$ 2 bilhões somente neste projeto, que promete ser o maior centro de produção de produtos biológicos da América Latina.

No eixo de Infraestrutura Social, o Novo PAC anunciou ações através de centros comunitários que articulam a Segurança Pública com políticas sociais. Para este projeto, o Governo Federal destinou R$ 800 milhões. No subeixo cultural, o novo CEU da Cultura é a principal iniciativa e terá foco especial nas periferias brasileiras. Serão selecionados 250 CEUs da Cultura em todo o país a um custo de R$ 500 milhões. Além disso, vão ser retomadas as obras do CEUs das Artes em municípios periféricos, como Belford Roxo-RJ e Ananindeua-PA. Já na temática esportiva, está no horizonte a seleção de 200 Espaços Esportivos Comunitários​.

Por sua parte, o Ministério da Educação (MEC) também planejou o aporte de recursos para a melhoria da infraestrutura em educação básica de diversos municípios das periferias urbanas de todo o país. Mas os investimentos em periferias e favelas vão além do Novo PAC. A Secretaria Nacional de Periferias (SNP) do Ministério das Cidades está promovendo o Prêmio Periferia Viva que almeja contemplar 54 iniciativas de todo o Brasil com 50 mil reais cada. Está prevista ainda a realização de um Encontro Nacional das Periferias no final de 2023. O Ministério da Educação anunciou em julho que vai construir um campus do Instituto Federal do Rio de Janeiro (IFRJ) no Complexo do Alemão, uma das maiores favelas da capital fluminense. Ao custo estimado de R$ 25 milhões, a instituição será erguida no terreno de uma antiga fábrica de plásticos e era uma grande reivindicação dos movimentos sociais.

Os números dos investimentos do Governo Federal impressionam, mas precisam vir acompanhados de participação social dos(as) moradores(as) de favelas e periferias para evitar os problemas gerados com as versões anteriores do PAC, em 2007 e 2011. Garantir que os projetos sejam pensados com e pela comunidade é condição indispensável para a efetividade das políticas públicas. As formas de colocar isto em prática são muitas: audiências públicas, consultas, conferências, conselhos, etc. Não é preciso reinventar a roda. Basta recuperar e aprimorar as estruturas de participação social que foram desmontadas após 2016.

Como exemplo bem sucedido, podemos citar a construção participativa do Novo Plano Plurianual (PPA), que foi enviado ao Congresso em 30 de agosto e define as prioridades do orçamento da União para R$ 13 trilhões alocados em 88 programas entre 2024 e 2027. O processo do PPA Participativo durou quatro meses e contou com a realização de plenárias em todos os estados, além de três fóruns interconselhos e 125 oficinas com gestores públicos, atividades estas que envolveram a participação de mais de 34 mil cidadãos e 300 movimentos sociais. A população poderá, ainda, acompanhar a execução do PPA através de 69 indicadores, assegurando a participação social para além da atividade de planejamento.

 

Veja em: https://outraspalavras.net/desigualdades-mundo/wikifavelas-o-novo-pac-e-o-periferia-viva/

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