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“Novo” Ensino Médio: reduzir para precarizar

Aprovado na Câmara, projeto trouxe pequena vitória: a garantia de carga horária mínima para a formação básica. Mas precariza o trabalho docente, cria brechas para privatizar a Educação, escanteia a Ciência e visa contar o trabalho juvenil como hora-aula

Por: Carta Capital, um texto do Coletivo em Defesa do Ensino Médio de Qualidade, na Carta Capital| Créditos da foto: Fernando Frazão / Agência Brasil

Apesar desse avanço, contudo, não é possível comemorar a versão final do texto aprovado na Câmara, devido a um conjunto de aspectos que não garante essa formação comum e nem mesmo um ensino de qualidade. Além de não corresponder às demandas sociais apontadas pelo documento final da CONAE 2024, o texto aprovado:

  • Não garante uma formação geral com 2.400 horas para estudantes de cursos técnico-profissionais (que terão carga horária reduzida), criando e agravando uma segmentação interna ao sistema escolar brasileiro – um dualismo educacional que ampliará desigualdades;
  • Não garante que as 2.400 horas contarão com 13 disciplinas científicas obrigatórias, e abre espaço para que a formação geral básica seja permeada por “inovações” curriculares semelhantes às que foram implementadas desde 2017 com o Novo Ensino Médio. Isso significa negar aos/às estudantes o conhecimento historicamente produzido e substituir professores/as com formação por quaisquer pessoas que aceitem transmitir conteúdos nas salas de aula;
  • Mantém o reducionismo curricular por meio da vinculação da política do Ensino Médio à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a partir da organização em quatro áreas e suas tecnologias, além de sugerir a elaboração de Diretrizes Curriculares Nacionais para os itinerários formativos;
  • Abre brechas para a privatização da educação via possibilidade de oferta de cursos técnico-profissionais por organizações privadas;
  • Abre brechas para a oferta de ensino a distância na educação básica;
  • Precariza o trabalho docente por meio da autorização de contratação de profissionais com “notório saber” (não formados) para a docência nos cursos de formação técnica e profissional;
  • Vulnerabiliza a formação dos estudantes por meio do reconhecimento de aprendizagens, competências e habilidades desenvolvidas em “experiências extraescolares”, validando trabalho juvenil como carga horária letiva no Ensino Médio. Trata-se de uma indução à desescolarização, uma vez que estudantes trabalhadores poderão se matricular em escolas de tempo integral, mas não precisarão frequentá-las de fato (matrícula em tempo integral e frequência em tempo parcial);
  • Não garante a obrigatoriedade do ensino da Língua Espanhola, afastando a etapa do Ensino Médio de uma agenda maior de integração regional e cultural;
  • Induz à oferta de currículos desarticulados e sem projeto formativo definido, ao autorizar que o ensino possa ser organizado em módulos e adotar sistemas de créditos com terminalidade específica.

Em 1942, o ministro da educação e saúde Gustavo Capanema enviou uma Exposição de Motivos ao presidente Getulio Vargas para justificar a criação de uma Lei Orgânica do Ensino Secundário, afirmando que os cursos “clássico” e “científico” deveriam ser destinados à formação das elites condutoras do país. Aos demais, seria oferecido o ensino técnico e profissional.

Naquele período, a legislação brasileira institucionalizou um sistema educacional dual que foi parcialmente superado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996. O PL n. 5.230/2023 aprovado na Câmara dos Deputados recupera a velha dualidade, induzindo a uma forte segmentação no sistema escolar brasileiro e agravando ainda mais as desigualdades educacionais e sociais.

 

Veja em: https://outraspalavras.net/outrasmidias/novo-ensino-medio-reduzir-para-precarizar/

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