Contrariando percepção de agricultores franceses, que voltaram a protestar contra o tratado de livre comércio entre os dois blocos, especialistas avaliam que ele trará mais benefícios que riscos para a Europa.
Europa costurou medidas para amenizar impacto do acordo
Em um relatório de fevereiro, a Comissão admitiu que o tratado pode levar ao aumento de importação de produtos agropecuários. Especialistas disseram à DW, porém, que a UE conseguiu instalar várias salvaguardas nos termos do acordo para amenizar o impacto e garantir ajustes setoriais.
Primeiro, a cota de 99 mil toneladas de carne bovina não virá com isenção total de impostos e este total será dividido entre os quatro países do Mercosul, entregando a cada um uma fatia relativamente pequena do mercado.
Em segundo lugar, os altos padrões sanitários impostos pelo texto devem proteger os produtores europeus contra o excesso de oferta. Ao assinar o acordo, a presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, disse que os padrões de saúde e alimentação na União Europeia “permanecem intocáveis”.
A qualidade da carne brasileira motivou uma crise após oCEO global do Carrefour, Alexandre Bompard, vetar a compra da carne produzida no Brasil.
“Apenas 20% dos frigoríficos no Brasil estão autorizados a exportar para a UE, pois é necessária uma certificação individual”, disse Capuzzi à DW.
A Comissão também atuou para costurar o acordo às novas leis ambientais da UE, em vigor a partir de 2026, e inseriu um período de transição de cinco anos para que os produtores europeus possam se adaptar à concorrência sul-americana.
Em terceiro lugar, espera-se que o acordo seja implementado gradualmente ao longo de cinco anos para dar tempo aos produtores europeus se adaptarem.
“Presume-se que haverá recursos financeiros para ajudar os agricultores afetados a se adaptarem às mudanças”, disse Hegadorn à DW. “Mas isso provavelmente será discutido na Comissão quando o acordo for ratificado.”
Acordo impulsionaria exportações da UE, segundo estudo
Outro ponto inserido pelos eurodeputados foi a proteção de mais de 350 produtos com uma “indicação geográfica”, registrados como propriedade comercial dos agricultores europeus. Isso garante que não haverá imitação de presuntos, queijos e vinhos produzidos em regiões europeias e vistos como iguarias em várias nações do Mercosul.
Um estudo recente da UE sobre o impacto de dez acordos de livre comércio costurados pelo bloco, incluindo o tratado com o Mercosul, concluiu que o setor agroalimentar da Europa, “especialmente os de laticínios, carne suína, alimentos processados e bebidas”, terão benefícios.
Se os acordos comerciais forem concluídos, segundo o estudo, o valor das exportações agropecuárias da UE aumentaria entre 3,1 bilhões de euros (R$ 19,7 bilhões) e 4,4 bilhões de euros (R$ 27,9 bilhões) até 2032.
O texto pontua que as exportações de carne bovina da UE também aumentariam, chegando a uma diferença líquida (exportação menos importação) de 350 mil toneladas, embora reconheça que existam vulnerabilidades no setor. “A União Europeia continuará sendo o maior exportador de produtos agrícolas do mundo, mesmo depois que o acordo comercial do Mercosul for ratificado”, disse Capuzzi. “E ainda será um exportador líquido de carne bovina.”
As vantagens superam os custos?
A Comissão Europeia defende que o desenvolvimento de novos mercados por meio de relações comerciais consolida a posição do bloco como o maior exportador mundial de produtos agroalimentares.
Com o retorno de Donald Trump à Casa Branca e sua ameaça de sobretaxar produtos europeus, especialistas acreditam que os acordos comerciais multilaterais são necessários para expandir a base de consumidores do bloco. O impacto sobre a carne bovina, as aves e o açúcar, segundo eles, seria marginal e pode ser atenuado pelo apoio do Estado.
“O acordo geral UE-Mercosul vai muito além da carne bovina e da agricultura, estendendo-se a todos os setores industriais e serviços – de A a Z, de carnes a medicamentos, de veículos a produtos químicos”, disse Hegadorn, da Sciences Po.
“Aqueles que estão analisando o interesse do bloco da UE como um todo estão otimistas quanto aos impactos esperados, tanto em termos de benefícios econômicos domésticos e expansão das opções para o consumidor, quanto por motivos geopolíticos, incluindo a oferta de um contrapeso para a China e os EUA.”
Publicado originalmente em: https://www.dw.com/pt-br/qual-o-real-impacto-do-acordo-mercosul-ue-para-a-europa/a-71082026
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