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As sobretaxas comerciais como estratégia de pressão de Trump

Republicano ameaçou a Colômbia com tarifas para que país aceitasse deportações. Mas ele pode fazer isso, pelas normas da OMC? Que efeitos elas teriam sobre Colômbia e sobre outro parceiro, como o México?

Por: Luis García Casas | Crédito Foto: Brian Snyder/REUTERS.  Trump percebeu que as ameaças funcionam, alertam especialistas

Os presidentes dos Estados Unidos, Donald Trump, e da Colômbia, Gustavo Petro, se envolveram em uma troca de declarações que aumentou as tensões entre os dois países. Petro disse que não aceitaria voos com deportados se seus direitos básicos não fossem respeitados. Trump ameaçou impor tarifas sobre a Colômbia. Petro disse que responderia com tarifas sobre os produtos americanos. Trump aumentou a aposta, e Petro acabou cedendo e aceitou os aviões que transportavam os deportados colombianos.

Face ao acordo, foi cancelada nesta terça-feira (28/01) a cúpula urgente da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac) convocada para esta quinta-feira para discutir a crise entre Colômbia e EUA por causa das deportações promovidas pelo governo Trump.

“Posso entender perfeitamente a Colômbia”, diz Holger Görg, diretor do Centro de Globalização do Instituto para Economia Mundial (IfW), sediado em Kiel, porque “ela é muito dependente dos Estados Unidos como parceiro comercial”. Mais de um quarto do comércio internacional da Colômbia é feito com os EUA, explica ele. Entretanto, a Colômbia não está nem mesmo entre os 20 principais parceiros comerciais dos EUA. “As tarifas dos EUA teriam um grande impacto sobre a economia colombiana”, diz ele. Mas não o contrário. A Colômbia teria tudo a perder em uma guerra comercial.

Tarifas contra as regras de comércio internacional

A Organização Mundial do Comércio (OMC), da qual ambos os países são membros, proíbe a imposição de tarifas discriminatórias contra outro membro, exceto em casos excepcionais, como um grande desequilíbrio econômico temporário ou um caso em que a segurança nacional esteja em jogo. Esse é o motivo alegado por Trump, embora de forma obviamente exagerada. “Isso está muito claro aqui”, diz Görg, avaliando que as tarifas seriam contra as regras da OMC.

Para o especialista em comércio internacional do IfW, “Trump claramente não se importa com essas regras, nem com a ordem do comércio internacional. Acho que isso já estava claro durante seu primeiro mandato e ainda mais agora. O primeiro caso em que o procedimento de solução de controvérsias da OMC foi aplicado foi uma disputa entre a Venezuela e os Estados Unidos em 1995. O painel nomeado para esse fim decidiu a favor do país caribenho e Washington acatou a decisão. “Acho que também é de se esperar que Trump não cumpra nenhuma decisão da OMC”, teme Görg.

Operários de branco trabalham na montagem de automóveis em fábrica de carros
O México exporta principalmente veículos e autopeças, assim como componentes eletrônicos para os EUA. Foto: Pedro Pardo/AFP/Getty Images

As ameaças funcionaram

No entanto, o analista alemão admite que nenhuma regra foi quebrada, porque nenhuma tarifa foi de fato introduzida. Elas serviram apenas de ameaças. E, para ele, esse é o problema: isso não foi necessário. Trump já viu que as ameaças funcionam. Foram necessárias apenas algumas mensagens nas mídias sociais para que a Colômbia recuasse. “Portanto, temos que estar preparados para o fato de que isso acontecerá com mais frequência e que outros países, como a China, também poderão usar esse recurso”, diz ele.

Mas contra quem Trump usará esse recurso? Contra o México, que ele também já ameaçou com tarifas? “Seria uma questão diferente, porque o México é um importante parceiro comercial dos Estados Unidos”, pondera Görg. Na verdade, o país é o maior parceiro comercial de Washington no momento, após ter ultrapassado a China em 2023. Naquele ano, o déficit comercial americano com seu vizinho ao sul aumentou para 150 bilhões de dólares (R$ 880 bilhões). “E isso significa que, se os EUA impuserem tarifas sobre os produtos mexicanos, isso teria um grande impacto sobre a economia americana e certamente aumentaria a inflação”, explica ele.

Guerra comercial com o México?

“Trata-se de muito mais do que uma ‘guerra comercial’, trata-se de medidas unilaterais em relação ao resto dos países, incluindo a União Europeia e a América Latina e o Caribe, que modificam as relações internacionais que vivemos desde 1944″, diz Enrique Dussel Peters, professor de economia da Universidade Nacional Autônoma do México (Unam). Ele vê na estratégia de Trump “uma escalada de ‘security-shoring'”, na qual a “segurança nacional” tem precedência sobre “o livre comércio ou o multilateralismo baseado na reciprocidade desde os acordos de Bretton Woods”.

Deportações também terão um impacto econômico

Peters também lembra que “o México recebeu mais de quatro mil deportados, em sua maioria mexicanos, mas não só, na primeira semana da administração de Trump”. E ele teme que, mesmo tendo aceitado o acordo, ainda não se sabe se os Estados Unidos imporão ou não tarifas unilaterais ao México. Sua colega da Unam, Karla Valverde, coordenadora do programa de pós-graduação em ciência política, ressalta que esses migrantes retornados também deixarão de contribuir para a economia dos EUA.

Ela acha importante não se minimizar as ameaças de Trump, mas alerta também que elas não devem ser superestimadas. “Também temos que pensar que não é do interesse dos Estados Unidos impor tarifas”, diz ela. Valverde concorda que Trump “não está falando apenas com o México e a América Latina, temos que estar muito atentos a como os diferentes países reagem”.

 

Publicado originalmente em: https://www.dw.com/pt-br/as-sobretaxas-comerciais-como-estrat%C3%A9gia-de-press%C3%A3o-de-trump/a-71449941

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