Apesar de proibida, a escravidão por hereditariedade ainda é comum em alguns países africanos e outras partes do mundo. Queixas à Justiça são geralmente em vão. Situação é agravada pela pandemia e mudanças climáticas.
Martina Schwikowski | Mahamadou Kane de Bamako
Cheikna Diarra nasceu no vilarejo de Baramabougou, na região da cidade de Kayes, no oeste do Mali. A escravidão por hereditariedade naquela área é bastante difundida. Também Diarra foi subjugado pelo poder de pessoas que se autodefiniram como seus donos e abusaram dele.
Em 2019, ele quase morreu depois de visitar um amigo. “No caminho de casa, uns 20 jovens do vilarejo bloquearam meu caminho, sem perguntar de onde eu vinha ou o que eu estava fazendo ali. Me atacaram imediatamente com paus e me bateram tanto que caí no chão e perdi a consciência”, lembra Diarra, em entrevista à DW.
Ele só conseguiu sobreviver graças aos gritos de seus parentes, que alarmaram outros moradores do local e o socorreram.
Denúncias negligenciadas
“Não cultivamos nossos campos desde 2018. Aqueles que afirmam ser nossos donos nos proibiram de ir ao comércio ou ao campo, e até de deixar o vilarejo”, relata Diarra, que finalmente chegou a registrar queixa por maus-tratos.
Em vão. Ele fugiu para a capital Bamako e, atualmente, vive como refugiado interno num campo com outras 130 pessoas – muitas das quais se conformaram com o fracasso das denúncias que apresentaram.
A organização Temedt luta para acabar com a escravidão por hereditariedade no Mali. “Como organização de defesa dos direitos humanos, denunciamos o fenômeno desde 2006. Mas não tivemos um único caso de escravidão que foi parar nos tribunais. As autoridades sempre encontram desculpas”, critica Raichatou Walet Altanata, vice-presidente da fundação.
Segundo ela, a Justiça trata as ocorrências como ato de violência ou crime, mas a causa real do problema – a escravidão – não é considerada.
A ativista explica ainda que essa abordagem contradiz os textos internacionais ratificados pelo Mali para combater a escravidão, além de contrariar a Constituição do país, que diz que a dignidade do ser humano é inviolável.
Segundo escreve a organização de defesa dos direitos humanos Anti-Slavery, a hereditariedade da condição de escravidão ainda é registrada em todo o cinturão do Sahel africano, incluindo países como Mauritânia, Níger, Mali, Chade e Sudão.
Saiba mais em: https://www.dw.com/pt-br/na-%C3%A1frica-escravid%C3%A3o-est%C3%A1-longe-de-ser-abolida/a-60013762
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