Por Venício A. de Lima
Há pouco mais de dez anos, publiquei com Bernardo Kucinski um pequeno livro “dialogado” que chamamos “Diálogos da Perplexidade – Reflexões críticas sobre a mídia” (Editora Fundação Perseu Abramo, 2009). Nossa perplexidade se referia às muitas e radicais transformações pelas quais passava a mídia “tradicional” diante dos avanços tecnológicos simbolizados pela internet. Em particular, a mídia impressa e o jornalismo. De certa forma, antecipávamos os temores diante da pós-verdade das fake news, da intolerância e do ódio hoje, infelizmente, disseminados por robôs virtuais anônimos e criminosos nas redes sociais.
O Prefácio do livro foi escrito por Muniz Sodré, jornalista e professor da UFRJ que, muito generosamente, incluiu nossas reflexões na tradição secular inaugurada no século XII pelo celebrado rabino espanhol Moshe ben Maimon, mais conhecido como Maimônedes. Seu “Guia dos Perplexos” tinha como objetivo “tornar compreensível o significado de palavras que aparecem nos livros proféticos para o leigo e o principiante (…) tomados de perplexidade e confusão”. Para Maimônedes, em seus ensinamentos na busca da integridade, da ética e do aprimoramento humano, afirma Sodré, “a perplexidade não é estado do descaminho, mas a condição de possibilidade para que, da interpretação adequada, surja a iluminação”.
Tenho procurado uma palavra que expresse o sentimento que me atormenta nos últimos tempos diante do pesadelo que o país atravessa: uma pandemia que coloca em risco a própria vida, simultânea ao desgoverno político e a uma crise econômica sem precedentes. Tudo isso acompanhado de um impasse civilizatório manifesto na insanidade explícita que chega ao desvario macabro de brincar com a morte ao som de Michael Jackson, justo no dia em que se ultrapassava o número de 10.000 óbitos registrados em consequência do Covid-19.
Perplexidade, talvez seja a palavra mais adequada. Mas será a perplexidade no sentido que lhe confere Maimônedes, isto é, como “a condição de possibilidade para que, da interpretação adequada, surja a iluminação”?
Os Tradicionalistas
Para começar a entender o que nos torna perplexos talvez seja necessário recorrer a estudos sobre a ascensão do radicalismo de direita em outras partes do mundo. Benjamin Teitelbaum, professor da Universidade do Colorado e premiado especialista em extrema direita, publicou recentemente um livro [War for Eternity – Inside Bannon’s Far Right Circle of Global Power Brokers; Dey Street Books] que discute o “Tradicionalismo”, uma filosofia que reúne gente como Steve Bannon, ex-assessor de Donald Trump; Olavo de Carvalho, guru da chamada ala ideológica do governo Bolsonaro e Alexandr Dugin, assessor do presidente russo, Vladimir Putin.
Com base na pesquisa feita para o livro, Teitelbaum explica, em artigo publicado no site “A Terra é Redonda” [“Covid-19: a crise que os ‘Tradicionalistas’ radicais esperavam” in https://aterraeredonda.com.br/covid-19-a-crise-que-os-tradicionalistas-radicais-esperavam/], que “O Tradicionalismo é uma doutrina radical – tão radical que estudiosos da extrema direita como eu muitas vezes a rejeitaram como uma curiosidade obscura, desprovida de consequências políticas relevantes. Alguns de seus primeiros adeptos da direita acreditavam que uma raça de arianos etéreos já viveu no Polo Norte e defendiam o estabelecimento de um patriarcado celibatário de padres guerreiros no lugar da democracia. (…) Entretanto, descartar o Tradicionalismo não é mais uma opção”.
Saiba mais em: https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Perplexidade/4/47490
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