O intelectual marxista e militante pan-africanista C. L. R. James faleceu em um dia como hoje em 1989. Celebramos sua memória revolucionária republicando o preâmbulo de sua obra mais célebre, Os Jacobinos Negros, que conta a história da vitoriosa rebelião abolicionista e anticolonial do povo negro no Haiti.
Por Cyril Lionel Robert James | Tradução Afonso Teixeira Filho
Cyril Lionel Robert James, mais conhecido como CLR James, nasceu em 1901 na cidade de Tunapuna, em Trinidad y Tobago, e faleceu, em 1989, ao 88 anos, no Reino Unido (Londres). Ativo politicamente desde a juventude, em grupos ligados à luta anti-colonial das então chamadas “Índias Ocidentais”, James fez fama como jornalista esportivo cobrindo críquete na Inglaterra. Intelectual autodidata, nos anos 30 se liga ao marxismo, e torna-se militante de uma organização trotskista. Entusiasta do movimento pan-africanista, chegou a ser editor do jornal International African Opinion. Em 1934, escreve uma peça de teatro sobre a revolução haitiana chamada “Toussaint Louverture”, dramatizando as proezas militares e a jornada por emancipação do que James chamaria de “a única revolta de escravos bem sucedida na história”.
Esse é também o tema de sua obra mais famosa, Os Jacobinos Negros, publicada originalmente em 1938. No livro, a própria revolução é a protagonista – feita pelos seres humanos, ao mesmo tempo que os transforma:
“Em uma revolução, a incessante e lenta acumulação de séculos explode em uma erupção vulcânica, onde as torrentes de lava e os jorros meteóricos formam um caos sem sentido e prestam-se ao capricho sem fim e ao romantismo, a menos que o observador os veja sempre como projeções do subsolo, que é o lugar de onde vieram. O autor procurou não apenas analisar, mas demonstrar, em seu movimento, as forças econômicas da época; a forma como moldam, na sociedade, na política e nos homens, tanto os indivíduos como as massas; a maneira pela qual eles reagem ao meio, em um daqueles raros momentos em que a sociedade está em ponto de ebulição e, portanto, fluida.”
No aniversário de sua morte, para celebrar sua memória militante, reproduzimos aqui o preâmbulo de CLR James de 1980 para Os Jacobinos Negros, publicado no Brasil pela editora Boitempo. Que a história heróica dos esforços dos revolucionários do Haiti – no que Marcos Queiroz chama de “a mais universal da revolução” – inspire no nosso tempo novas “erupções vulcânicas”, capazes de pôr a sociedade mais uma vez em ponto de ebulição, fluida o bastante para que possamos construir coletivamente um outro futuro – de liberdade real não para poucos, mas para todos.
Os jacobinos negros foram publicados pela primeira vez na Inglaterra em 1938, mas eu já havia escrito sobre o mesmo assunto antes de deixar Trinidad em 1932. A ideia me acompanhava havia algum tempo. Estava cansado de ler e de ouvir a respeito da perseguição e da opressão aos africanos na África, na rota do Meio [a rota dos escravos entre a África e as Antilhas], nos Estados Unidos e em todo o caribe. Convenci-me da necessidade de escrever um livro no qual assinalaria que os africanos ou os seus descendentes, em vez de serem constantemente o objeto da exploração e da feridade de outros povos, estariam eles mesmos agindo em larga escala e moldando outras gentes de acordo com as suas próprias necessidades. Os livros sobre a revolução do Haiti que eu tinha lido até então não possuíam um rigor histórico sério.
Em 1932, assim que cheguei à Inglaterra, comecei a procurar materiais sobre o assunto, mas acabava encontrando sempre as mesmas trivialidades que tinha lido antes no Caribe. Então, passei a importar da França livros que tratavam seriamente desses eventos tão célebres na história daquele país.
Este livro é dedicado a Harry e Elizabeth Spencer. Harry tocava uma casa de chá e padaria e era um grande amigo. Era também um homem culto com quem eu costumava falar a respeito dos meus planos de escrita. Sempre que um livro chegava da França, e eu encontrava algo de interessante nele, informava-lhe com entusiasmo. Um dia, ele me disse:
Por que você fala sempre desse livro? Por que não o escreve de uma vez?
Respondi que teria de ir para a França procurar os arquivos e não tinha ainda dinheiro para isso, mas estava juntando.
Perguntou-me de quanto dinheiro eu precisava e respondi-lhe que de cem libras, para começar. Ele não levou a discussão adiante, mas alguns dias depois colocou-me noventa libras nas mãos e disse:
Para a França, e diga se precisar de mais!
Saiba mais em: https://jacobin.com.br/2021/05/c-l-r-james-e-os-misteriosos-caminhos-da-revolucao/
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