É a primeira vez que grupos se organizam nas eleições gerais sob uma pauta comum, contra degradação ambiental e violações de direitos. Mobilização indígena atingiu patamar recorde em 2022, com 183 candidatos.
Créditos da foto: Carl de Souza/AFP. Indígenas protestam em Brasília, em agosto de 2021
Em uma articulação sem precedentes, 30 candidaturas de movimentos indígenas em 20 estados se lançam este ano na disputa aos Legislativos estadual e federal, tendo como base uma agenda comum de enfrentamento à degradação do meio ambiente e às violações de direitos dos povos originários.
Desse total, 12 concorrem à Câmara dos Deputados e 18 tentam uma vaga nas assembleias legislativas de 15 estados. A lista de candidaturas foi publicada nesta segunda-feira (29/08) no site da Campanha Indígena.
A mobilização é capitaneada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), integrada por outras sete organizações regionais: Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab); Conselho do Povo Terena; Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (Apoinme); Grande Assembleia do povo Guarani (Aty Guasu); Comissão Guarani Yvyrupa (CGY); Articulação dos Povos Indígenas do Sudeste (Arpin Sudeste) e Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul (Arpin Sul).
É a primeira vez que grupos indígenas se organizam sob uma pauta comum para disputar as eleições gerais.
“Há mais de 500 anos existimos e resistimos a este Estado e agora queremos ver os parentes no centro das tomadas de decisões”, disse Dinamam Tuxá, advogado e coordenador executivo da Apib, à DW Brasil.
A entidade aposta na ampliação da participação indígena em espaços institucionais, algo que vai além do período eleitoral e abarca a formação contínua de lideranças políticas. “Precisamos ocupar os espaços de decisão e direcionarmos as políticas públicas de acordo com o que pensamos para nosso futuro”, argumenta Tuxá.
O movimento se fortaleceu em 2018 com a candidatura de Sônia Guajajara à vice-presidência na chapa liderada por Guilherme Boulos (Psol) e a eleição da primeira mulher indígena à Câmara dos Deputados, Joenia Wapichana (Rede-RR).
As duas integram a Campanha Indígena ao lado de nomes como Almir Suruí (PDT-RO), Célia Xakriabá (Psol-MG), Maial Kaiapó (Rede-PA) e Kerexu Yxapyry (Psol-SC), que disputam a Câmara, e Val Eloy (Psol-MS), esta última concorrendo a uma vaga no Legislativo do estado conhecido pelo poder e influência do agronegócio.
Além da Campanha Indígena, um levantamento do portal “De olho nos ruralistas” encontrou 56 chapas progressistas dentre as candidaturas indígenas registradas.
Recorde de candidaturas indígenas
A mobilização de indígenas em eleições gerais atingiu um patamar recorde no Brasil em 2022, com 183 candidatas e candidatos que se autodeclaram como pertencentes aos povos originários participando do pleito, segundo dados atualizados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) – 50 a mais do que em 2018 e 98 a mais do que em 2014, ano em que a Justiça Eleitoral passou a compilar dados sobre a composição étnica e racial de candidatas e candidatos.
O número equivale a 0,6% de um total de 28.869 candidaturas registradas até agora pelo TSE. Destas, 84 são mulheres (45,9%) – o percentual de candidaturas femininas nesse segmento é o maior dentre todas as raças.
A maioria dos indígenas concorre neste ano a uma vaga nas assembleias estaduais ou na Câmara do Distrito Federal (111), seguida pela Câmara dos Deputados (58). Outros quatro concorrem ao Senado e outros dois, a governos estaduais. Os demais disputam cargos de vice ou de suplente.
As candidaturas estão distribuídas em 30 legendas, sendo que a maioria (92) está vinculada a partidos de esquerda ou centro-esquerda: Psol (25), PT (21), Rede (19), PDT (14), PSB (6), PC do B (3), PSTU (3) e PCB (1).
Histórico
Segundo a Apib, o primeiro indígena eleito no Brasil foi Manoel dos Santos, do povo Karipuna, em 1969. Ele foi vereador na cidade de Oiapoque, no Amapá, durante a ditadura militar.
A Santos seguiu-se o cacique Angelo Kretã, eleito vereador em Mangueirinha (PR) em 1976, também durante a ditadura militar, após pleitear na Justiça o direito à candidatura.
Já o primeiro prefeito indígena eleito, ainda segundo a Apib, foi João Neves, do povo Galibi-Marworno, que em 1996 venceu a disputa em Oiapoque, no Amapá.
O primeiro congressista indígena foi Mário Juruna, eleito deputado federal em 1982 pelo PDT do Rio de Janeiro. A ele seguiu-se um longo hiato de mais de três décadas até a chegada de Joenia Wapichana à Câmara dos Deputados.
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