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Adesão ao clube do petróleo ofusca Brasil na COP28

Às margens da Conferência do Clima, anúncio da entrada na Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) é pedra no caminho de liderança climática que Brasil diz querer trilhar em Dubai.

Por: Nádia Pontes enviada a Dubai | Créditos da foto: Amr Alfiky/Reuters. Lula aproveita a viagem a Dubai para ter encontros bilaterais com vários líderes mundiais

Em sua volta às Conferências do Clima (COP) como presidente do Brasil,
Luiz Inácio Lula da Silva
 pareceu disposto a ocupar a posição de liderança global climática que diz estar vazia. Numa provocação às nações mais ricas, o brasileiro disse que tem metas de corte de emissões de gases de efeito estufa mais ambiciosas do que aqueles que historicamente mais contribuíram com as mudanças climáticas.

O discurso parece unificado em parte do governo. Nesta sexta-feira (01/12), segundo dia de COP28, em Dubai, os ministros Marina Silva, do Meio Ambiente, e Fernando Haddad, da Fazenda, demonstraram sintonia ao apresentar novos planos para valorizar as florestas e transformar a economia.

Enquanto isso, Alexandre Silveira, da pasta de Minas e Energia, tratava na vizinha Abu Dhabi de temas ligados a investimentos um dia depois do anúncio de que o Brasil vai integrar a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep).

A notícia já havia esfriado os ânimos dos participantes da conferência. “Entrar na Opep e liderar a agenda de clima são duas coisas que não cabem na mesma frase. O Brasil vai ter que se decidir. Quem está certo: é o discurso do presidente aqui ou é o discurso do ministro de Minas e Energia aplaudido de pé na Opep?”, questiona Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, em entrevista à DW.

Para Tzeporah Berman, presidente do Tratado de Não-Proliferação de Combustíveis Fósseis, muito antes de a COP30 desembarcar em Belém, em 2025, o Brasil tem que definir objetivamente de qual lado está.

É que o país, além de entrar para o clube mundial de petróleo, pode, em breve, explorar o combustível fóssil que mais contribui para as mudanças climáticas na região chamada de Foz do Amazonas. Rejeitado diversas vezes pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), um novo pedido de licença ambiental da Petrobras está sob análise.

“Lula afirma ser um líder climático internacional, mas ainda há muito a ser feito em casa em termos de políticas públicas nacionais para provar o seu compromisso com a ação climática. Isto deve incluir uma indicação clara para parar a expansão de projetos de combustíveis fósseis, especialmente em ecossistemas-chave como a Amazônia”, pontua Berman à DW.

Lula fala em um púlpito em frente a uma bandeira da ONU e dos Emirados Áabes
Lula quer ser visto como líder climático mundial, mas primeiro precisa unificar discurso de seu governo. Foto: Peter Dejong/AP/picture alliance

Nova ideia para salvar as florestas

Num evento oficial concorrido, Marina Silva e Fernando Haddad apresentaram detalhes do projeto batizado como Florestas Tropicais para Sempre. A proposta é criar um instrumento financeiro para compensar quem preserva florestas em todo o mundo.

“É uma proposta bastante criativa. Queremos criar condições para que países desenvolvidos protejam a floresta sem ser doação. Eles terão retorno”, disse Silva.

A captação de recursos seria feita inicialmente de fundos soberanos, além de outros investidores – como da própria indústria do petróleo. A rentabilidade líquida seria a fonte de pagamento para países com florestas tropicais.

O mecanismo foi pensado para incentivar a preservação ao mesmo tempo em que desestimula o corte da floresta, explica Tasso Azevedo, coordenador do Mapbiomas, que ajudou a elaborar a ideia.

“Para cada hectare preservado durante um ano, seria pago um valor. E para cada hectare desmatado, haveria um desconto de 100 vezes esse mesmo valor. Por exemplo: se for pago 30 dólares por hectare preservado, serão descontados 3.000 dólares por cada hectare desmatado”, detalha Azevedo.

Para o engenheiro florestal, calcular o valor que essa vegetação tem é extremamente complexo. “Não se trata só de carbono. As florestas tropicais prestam serviços essenciais, como fazer o resfriamento do planeta em 1°C”, menciona.

O mecanismo foi apresentado aos países que fazem parte do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), e agora será discutido em Dubai entre os demais detentores de florestas tropicais.

“Em geral, os países desenvolvidos vêm com ideias bastante boas, mas já prontas. E aí você tem que aderir. O Brasil apresenta uma ideia, desenvolve com os outros, e aí cria a estrutura definitiva”, comenta André Correa do Lago, diplomata e negociador-chefe do país. “Esperamos que o Fundo Florestas Tropicais para Sempre esteja em funcionamento até a COP30”.

A meta inicial do fundo é captar 250 bilhões de dólares. Estima-se atualmente que fundos soberanos disponham de 12 trilhões de dólares – a maior parte disso capitalizado pela venda de petróleo.

“Não há contradição”

Depois de discursar na plenária, o presidente Lula teve reuniões bilaterais com o primeiro-ministro do Reino Unido, Rishi Sunak, com o secretário-geral da ONU, António Guterres, com a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e com o primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez. Ele não falou com a imprensa.

Já Marina Silva e Fernando Haddad, logo após apresentarem o plano para as florestas tropicais, foram questionados por jornalistas sobre a notícia de adesão do país à Opep em plena conferência do clima.

Segundo Haddad, o Brasil terá até junho de 2024 para decidir se entra para o grupo. Marina Silva afirmou que o país seria um observador e que, ao exercer esse papel, poderia “ajudar o mundo a fazer a transição energética” necessária.

“Se for para levar o debate da economia verde, da necessidade de descarbonizar o planeta, não é uma contradição. É exatamente para levar o debate que precisa ser enfrentado no âmbito daqueles espaços que são os grandes produtores de combustíveis fósseis, que são os grandes responsáveis pelo aquecimento do planeta”, respondeu.

Para Paulo Artaxo, pesquisador da Universidade de São Paulo (USP) que já integrou o Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC), a emergência climática testemunhada em várias partes do mundo não pode ser menosprezada em Dubai.

A COP28 teria que trazer o compromisso de acabar com a era do petróleo e iniciar a era da energia sustentável.

“O recado da ciência é claro: a janela de abertura para novos poços de petróleo já passou há décadas. O ministério da Fazenda e do Meio Ambiente estão alinhados com o futuro. O de Minas e Energia e a Petrobras estão alinhados com o passado. Este é o grande dilema que o Brasil tem que resolver”, analisa Artaxo.

 

Veja em: https://www.dw.com/pt-br/ades%C3%A3o-ao-clube-do-petr%C3%B3leo-ofusca-brasil-na-cop28/a-67612626

 

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