Em entrevista à DW na COP28, ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, defende exploração da chamada Foz do Amazonas e diz que países ricos devem pagar a conta da transição energética.
Por: Nádia Pontes enviada a Dubai | Créditos da foto: Nádia Pontes/DW. “O avanço da descarbonização e o declínio da produção de petróleo no mundo têm que ser feito pelos países ricos e incluir suas populações”
Para Alexandre Silveira, ministro de Minas e Energia, o anúncio da entrada do Brasil à Opep+ não causou mal-estar. Em Dubai, Silveira anunciou a adesão do país ao subgrupo comandando pelos maiores produtores de petróleo um dia antes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva discursar na Conferência do Clima, COP28.
“Ninguém pode negar que o Brasil explora petróleo. Tanto é que nós temos uma das maiores empresas que tem maior expertise em explorar petróleo em águas profundas, que é a Petrobras“, justificou em entrevista à DW nesta segunda-feira (04/12) depois de participar de um debate no pavilhão que o governo federal montou na conferência.
Questionado se a COP28 deve fixar uma data para o fim da era fóssil, uma das principais discussões no evento, Silveira foi evasivo. Ele disse que vai liderar o debate dentro do G20 para que a conta da descarbonização seja paga pelos países que mais poluíram historicamente, e não pelos países em desenvolvimento.
Embora a ciência seja clara sobre a obrigatoriedade da redução drástica da queima de combustíveis fósseis para conter o aquecimento global, o ministro brasileiro defendeu ainda a abertura de novas frente de exploração no país, incluindo na região chamada de Foz do Amazonas.
No fim deste quinto dia de COP28, após a publicação da entrevista, o Brasil ganhou o antiprêmio Fóssil do Dia, uma tradição mantida pelas entidades da sociedade civil nas conferências do clima. O antiprêmio visa expor governos que prejudicam o meio ambiente ou têm posições contrárias aos objetivos da conferência.
DW: No dia da abertura da Conferência do Clima em Dubai, o senhor participou de uma reunião com a Organização dos Países Exportadores do Petróleo (Opep) e anunciou a entrada do Brasil para o subgrupo chamado de Opep+. O senhor não acha que isso causou um mal-estar bem na abertura da COP28?
Alexandre Silveira: Muito pelo contrário. Na verdade, o Brasil nunca escondeu que sua grande potencialidade é exatamente a sua pluralidade energética, sua diversidade energética. É importante destacar que o Brasil já é um grande líder da transição energética no mundo, e aqui na COP isso ficou claro. Temos 88% da nossa matriz energética limpa e renovável.
Tivemos investimentos robustos na construção de hidrelétricas, inclusive em mandatos do presidente Lula, como Belo Monte, Jirau, Santo Antônio. Continuamos fazendo investimento para aumentar a produção de energia eólica, solar e biomassa no Nordeste brasileiro.
A questão da OPEP+ é importante destacar que nada tem a ver com o núcleo da OPEP que discute a questão do controle de petróleo. A OPEP+, na verdade, é uma carta de adesão, de cooperação, de uma plataforma que discute a estratégia dos investimentos dos países petroleiros do mundo. Ninguém pode negar que o Brasil explora petróleo. Tanto é que nós temos uma das maiores empresas que tem maior expertise em explorar petróleo em águas profundas, que é a Petrobras.
Vamos falar sobre o petróleo?
Eu vou continuar, com maior alegria e toda clareza. Falando sobre petróleo, vou falar aqui sobre a França. A França não tem petróleo, mas tem a terceira maior petroleira do mundo, que é a Total Energies, que inclusive explora petróleo no Brasil.
O debate que nós temos que fazer é o seguinte: a transição energética tem que ser um instrumento de proteger o planeta, de aumentar a sustentabilidade, e o Brasil já está fazendo isso com louvor. Há esse reconhecimento aqui em todos os fóruns que eu tenho participado na COP.
Inclusive o relatório da Agência Internacional de Energia (AIE) aponta a América Latina como a região que mais protege o meio ambiente no planeta. O que nós precisamos fazer, na verdade, é um debate com os países desenvolvidos para como a transição vai se dar de forma justa, inclusiva, e como disse o Papa Francisco, obrigatória.
Enquanto nós não criarmos um mecanismo internacional onde os países em desenvolvimento sejam financiados de forma mais justa, com juros mais baratos pelos bancos multilaterais para avançar na transição energética, enquanto não tivermos uma forma de aquilatar a emissão de carbono pelos países que emitem mais – e esses países a gente sabe muito bem que são industrializados – nós não vamos conseguir alcançar o grande objetivo da sustentabilidade e transição energética.
Na minha visão, o principal ponto da transição energética é a proteção planetária. Mas ela tem uma outra missão, que é incluir o povo do Sul global, em especial, na cidadania, combatendo a desigualdade, gerando emprego e renda com oportunidade. E o Brasil não vai perder esta oportunidade.
Mas vamos falar de emissões, ministro. A gente tem uma realidade, que está sendo discutida aqui na COP, que mostra que o mundo não pode mais emitir gases do efeito estufa, que o limite para queima do petróleo foi ultrapassado. A ciência mostra que não se pode mais abrir novos poços de petróleo para que se cumpra o Acordo de Paris…
O relatório da IEA mostra de forma clara o que tem feito geopoliticamente as regiões para salvaguardar o planeta. A América Latina, os países do Sul global, os países mais pobres que financiam de forma mais vigorosa a transição energética. Para que seja justa e inclusiva, a transição não pode penalizar mais ainda as pessoas que mais precisam de serem incluídas na cidadania.
E essa inclusão é com petróleo, é isso que o senhor está querendo dizer?
Não. Ao contrário. É com os países ricos, desenvolvidos, num debate internacional honesto, transparente claro, como o presidente Lula tem liderado.
Eu fui a Goa [Índia] e me reuni com 46 ministros de energia no mundo inteiro, desenvolvidos e do Sul global, fazendo este mesmo debate. Eu estive aqui na COP, corajosamente, fazendo este mesmo debate. E eu vou presidir o G20 de energia do Brasil ano que vem exatamente para levar este debate.
Além dos esforços já feitos pelo Brasil e pelos outros do Sul global, o avanço da descarbonização e o declínio da produção de petróleo no mundo têm que ser feito pelos países que se tornaram ricos e incluir suas populações. Tem que ser feito de forma justa para que os países em desenvolvimento não continuem pagando esta conta com pobreza e miséria.
Quando deve ser declarado o fim da era fóssil, na visão do senhor? Isso deveria ser decidido aqui na COP?
Eu defendo que isso deve ser feito num critério onde o mundo inteiro possa entender que nós vivemos num único ecossistema e que, portanto, não sacrifique um único ou alguns países menos desenvolvidos para poder pagar a conta da sustentabilidade sozinho.
Ou seja, o Brasil vai continuar abrindo poços de petróleo? Sim ou não?
Eu defendo que a Margem Equatorial [região também chamada de Foz do Amazonas], de forma adequada, cumprindo a legislação ambiental, deve ser mais uma fonte de riqueza para combater a desigualdade no Brasil.
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