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Como reagir ao impacto da IA ​​no mercado de trabalho?

No Brasil, o avanço da inteligência artificial gera percepções, e é consenso entre especialistas ouvidos pela DW que a tecnologia poderá aumentar ainda mais a desigualdade social.

Por: Nilson Brandão | Créditos da foto: Monika Skolimovska/dpa/picture Alliance

A diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva , alertou no último fim de semana que a inteligência artificial (IA) apresenta riscos para empregos em todo o mundo, mas também oferece uma grande oportunidade para produzir os níveis de produtividade e alimentar o crescimento global.

Um relatório do FMI citado por Georgieva mostra que os impactos da IA ​​em metade dos empregos em todo o mundo deverão ser negativos, enquanto o restante poderá, na verdade, se beneficiar do aumento da produtividade.

No Brasil, o avanço da IA ​​gera percepções no mercado de trabalho, e é consenso entre especialistas ouvidos pela DW que a tecnologia poderá aumentar ainda mais a desigualdade na sociedade, além da tendência de substituir pessoas em atividades intensivas em mão de obra.

O que a IA já é capaz de fazer?

A IA já é capaz de substituir seres humanos em frentes que vão desde o atendimento inteiro em call centers , redação de documentos, requisitos e petições, até a leitura de exames radiológicos com detecção precisa de resultados. 

Até mesmo uma lei já foi criada pelo ChatGPT e aprovada na íntegra. Isso ocorreu na Câmara de Vereadores de Porto Alegre (RS), uma das dez maiores cidades do Brasil. “É o início de uma revolução tecnológica. E, obviamente, o poder público, a política, não acaba de fora dessa revolução”, diz o autor da lei, o vereador Ramiro Rosário (PSDB).

Soluções potenciais ou formas de mitigar o problema já começou a ser debatido. “Uma questão importante para o Brasil é pensar na capacitação das pessoas, com políticas públicas para IA para capacitações em diferentes níveis”, diz o pesquisador Diogo Cortiz, da PUC-SP. 

Como se preparar para a era da IA?

Cortiz conta que a Finlândia lançou um curso online, amplo e gratuito, chamado Elements of AI (elementos da inteligência artificial, em tradução livre) para preparar a população para o novo mundo da IA. Desenvolvido pela Universidade de Helsinque e pelo MinnaLearn, já teve mais de um milhão de alunos inscritos em 170 países (é oferecido em outras línguas).

O Brasil é um dos cinco países, todos emergentes, que mais têm os efeitos da IA ​​no trabalho, enquanto os que menos têm são países desenvolvidos, segundo pesquisa do Instituto Ipsos. Entre os brasileiros, 73% acreditam que a IA mudará seu trabalho atual e 57% indicam que seus trabalhos serão substituídos pela IA.

“Todo ciclo tecnológico no primeiro momento provoca desigualdade entre países que estão na vanguarda quanto aos demais. Mais do que uma desigualdade entre países, a inteligência artificial também provoca desigualdade entre empresas”, diz o coordenador de humanidades do Centro de Inteligência Artificial (C4AI) da USP, Glauco Arbix.

Homem de capacete amarelo apresenta robô em uma feira
Na Alemanha, estratégia para lidar com os impactos da IA ​​inclui ampliar a capacitação dos trabalhadores. Foto: Julian Stratenschulte/dpa/picture-alliance

Os formatos de adaptação ao choque da IA ​​sobre o mercado de trabalho passam principalmente por três dimensões, segundo especialistas: o interesse individual em se atualizar, ofertas de reciclagem e formação por empresas, e políticas públicas voltadas para quem não tem recursos ou possibilidade de acesso novas formações.

São cogitados, por exemplo, programas de transferência de renda como forma de compensação para quem fica de fora do mercado por causa da IA ​​generativa. “O Brasil tem tecnologia de transferência de renda já testada e vai ser preciso ampliar para as pessoas que não conseguem emprego”, diz Naercio Menezes Filho, professor do Insper. 

A academia reforça a necessidade de também investir na formação. “Na primeira infância é quando se formam as habilidades cognitivas socioemocionais. É necessário garantir que essas crianças se desenvolvam adequadamente. O governo tem de fazer isso, qualificar sua população mais pobre”, afirma Menezes Filho. 

Quais empregos são afetados?

Na área privada, enquanto antes da retirada de empregos da base da pirâmide, com a inteligência artificial substituições laborais chegavam ao meio e até o topo das companhias. O cenário é traçado por Rodrigo Zerlotti, diretor de inovação tecnológica do DOT Digital Group, empresa de educação corporativa. 

O presidente do Porto Digital, um dos principais parques tecnológicos do país, Pierre Lucena, especifica funções mais impactadas pela IA. “A partir da IA, os empregos que são atingidos são os de complexidade média e ocupados majoritariamente pela classe média, como analistas financeiros, arquitetos ou mesmo desenvolvedores de software”, afirma.

Robô humanóide
Países que menos têm a IA são os desenvolvidos. Foto: Aliança Stringer/AA/picture

Lucena reforça a necessidade de investir expressivamente em educação e traz um dos novos desafios pela frente: “Vamos precisar discutir seriamente a redução nas jornadas de trabalho, sob pena de termos um aumento exagerado de desigualdade em função da expropriação do ganho de produtividade, que será “.

“Fase disruptiva”

Pelo que chama de “expropriação”, ele trata dos novos patamares de produtividade que surgirão e como ficarão os ganhos decorrentes. “Se o ganho de produtividade excessivo (ganho pouco em tempo) não for distribuído também com quem produz (no caso, quem trabalha), podemos dizer que quem emprega fica com todo o ganho”.

Outro desafio é colocar iniciativas de formação e outros programas em prática: “Parece óbvio, mas depois de um ano de AI e LLM/NLP [Grande Modelo de Linguagem e Processamento de Linguagem Natural], nada disso tem sido feito. Pior ainda, muitos as pessoas nem percebem que estamos em uma fase disruptiva”, diz Zerlotti, do DOT Digital Group.

“Igualmente importantes são os novos empregos gerados pela IA, a reconfiguração de posições existentes e o estímulo à colaboração eficaz entre seres humanos e máquinas. A adoção de um código de ética é fundamental para garantir uma implementação justa da IA, já que um diálogo aberto entre todos os envolvidos podem facilitar uma transição harmoniosa para essa nova era tecnológica”, afirma ele.

Na UE, foco em capacitação e pesquisa

A União Europeia (UE) chegou em dezembro de 2023 a um acordo para estabelecer um conjunto de regras sobre o uso de IA no bloco, em uma iniciativa pioneira no mundo. O texto deverá ser aprovado nos próximos meses pelo Parlamento Europeu e o Conselho da UE.

Esse regulamento trata mais diretamente com os riscos sistêmicos da IA, como manipulação cognitivo-comportamental, rastreamento de imagens aparentes e visíveis ao direito autoral. Em relação ao impacto sobre o mercado de trabalho, a Comissão Europeia incluiu em seu plano de ação sobre IA o apoio ao treinamento de sua mão de obra para capacitá-la no tema e à pesquisa de excelência para que o bloco produza conhecimento e inovação de ponta para o setor. 

Na Alemanha, o governo federal tem desde 2018 uma estratégia  para lidar com os impactos da IA ​​que inclui, entre outros pontos, ampliar a capacitação dos trabalhadores para o uso de IA e identificar e responder de forma flexível às mudanças nas demandas do mercado de trabalho provocadas pelo avanço da tecnologia.

 

Veja em: https://www.dw.com/pt-br/como-reagir-ao-impacto-da-ia-no-mercado-de-trabalho/a-67999972

 

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