Em vez de apenas administrar as rotas que trazem cocaína da Bolívia e da Colômbia, as organizações criminosas decidiram diversificar os negócios ilícitos na região
Por: Ana Flávia Gussen | Imagem: Ibama, PM/RO e Redes sociais
Em abril de 2003, a Polícia Federal apreendeu no município de Comodoro, em Mato Grosso, 18,9 quilos de cocaína escondidos no compartimento de gasolina de um caminhão Mercedes-Benz branco, com placas de Joinville, Santa Catarina. Em depoimento, o motorista do veículo disse que a droga pertencia a Alcides Guizoni, conhecido como Durepox, que o teria contratado para levar o produto de Rondônia à cidade catarinense. Durepox acabou condenado por tráfico de entorpecentes a seis anos de reclusão em em regime fechado, mas permaneceu fora do radar da Justiça por dez anos. Investigado pelos mesmos crimes no Paraná e em Rondônia, nos anos seguintes ele mudou de ramo. Abriu um frigorífico, depois um supermercado, mas as empresas não prosperaram. Foi daí que, segundo uma investigação da Superintendência da PF no Amazonas, ele migrou para outro negócio, menos perigoso e muito mais lucrativo: a extração ilegal de madeira.
Na Floresta Amazônica, Guizoni perdeu a alcunha de Durepox e viu a vida melhorar da água para o vinho. Em apenas quatro anos, o “empresário” movimentou 16,8 milhões de reais com a venda ilegal de mais de 44,6 mil metros cúbicos de madeira, segundo um laudo da PF ao qual CartaCapital teve acesso. “As toras de madeira nativa daí extraídas foram “legalizadas” com DOFs (Documentos de Origem Florestal) de outras áreas onde foram aprovados planos de manejo”, afirma a PF, para quem a madeira foi “usurpada da União” mediante a grilagem de terras.
O caminho percorrido por Guizoni, não localizado pela reportagem, tem sido o mesmo de muitos narcotraficantes que atuam na Amazônia, sobretudo aqueles associados a duas facções criminosas do Sudeste, o Primeiro Comando da Capital e o Comando Vermelho. Aparentemente, as organizações criminosas decidiram diversificar os negócios. Em vez de apenas administrar as rotas que trazem cocaína da Bolívia e da Colômbia, muitos criminosos passaram a se dedicar também à grilagem de terras, à extração ilegal de madeira, ao garimpo em áreas de proteção e terras indígenas e à lavagem de dinheiro dos novos parceiros no crime.
“É um negócio rentável e com menos prejuízos legais”, explica Alexandre Saraiva, delegado da Polícia Federal responsável pela Operação Handroanthus, que fez a maior apreensão de madeira ilegal da história na Amazônia. “Os criminosos retiram a madeira de graça de uma terra grilada da União ou de um território indígena, usam mão de obra análoga à escravidão e furtam até energia elétrica. Exportar madeira ilegal tornou-se uma atividade de baixíssimo custo, mas o produto é muito valorizado no exterior. Nos EUA, pagam 5 mil reais por metro cúbico de ipê. Uma balsa carrega 3 mil metros cúbicos.”
A facilidade de lavar dinheiro do tráfico de armas e entorpecentes com ouro ilegal levou vários traficantes ligados a facções criminosas a atuar em parceria com garimpeiros, um problema crônico dentro da Terra Indígena Yanomâmi em Roraima. Desde 2018, o PCC fortaleceu-se no estado e passou a fazer escolta armada de empresários ligados ao garimpo ilegal, uma vez que as rotas usadas pelo narcotráfico e para o escoamento do ouro costumam ser as mesmas. A principal atividade desses criminosos passou a atividade desses criminosos passou a ser os chamados “crimes de mando”, quando são contratados para assassinar ativistas, rivais e fiscais, explica Roney Cruz, chefe da Divisão de Inteligência e Captura do Sistema Prisional de Roraima, o Dicap.
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