“Minha irmã morreu primeiro. Nós a levamos para fora do quarto porque ela estava com falta de ar. A sentamos na área externa da casa e ela morreu ali, em nossos braços. Nós a levamos ao hospital, mas ela chegou morta. Meu conhado viu a situação e teve um ataque cardíaco, ali mesmo, no hospital. Ele tinha a saúde delicada e teve o mesmo fim que ela. No hospital filantrópico, nos disseram que tínhamos que levar os corpos para casa e ligar para o 911. Então nós os trouxemos. Chamamos, chamamos, chamamos. Mas eles não vinham. Então embalamos os dois em plásticos. Os embalamos como se embalam bonecos. A cena era muito estranha, mas estávamos assustados porque o ambiente estava se contaminando.”
Matías Zibell Da BBC Mundo 5 abril 2020
Bertha Salinas me conta sua história, por telefone, da cidade equatoriana de Guayaquil . Estamos separados por uma cordilheira e uma quarentena. Em poucas horas, conhecerei seu rosto.
Neste momento, só tenho comigo a foto dos corpos embalados pelos familiares. Estão no chão de uma casa e se parecem com múmias. Lembro-me da imagem criada por aranhas, quando elas envolvem suas vítimas em teia fina.
A cidade de Guayaquil e a província onde ela está, Guayas, são as áreas mais afetadas pela pandemia de covid-19 no Equador.
Segundo números oficiais, publicados enquanto eu conversava con Bertha, Guayas tinha mais de 2.400 infectados,dos quais 1.640 foram registrados na capital.
Em 2 de abril, o presidente Lenín Moreno pediu que o número de vítimas fosse mais transparente, devido à grande quantidade de pessoas que morreram pelo vírus, mas não apareciam nas listas oficiais porque não haviam sido testadas.
Bertha não é de Guayaquil, ela se mudou para lá com toda a família quando tinha 14 anos. A seguir, ela conta mais detalhes.
“Nasci em Santa Elena, em Manglar Alto. Meus pais vieram morar em Guayaquil e nos trouxeram ainda pequenos. Éramos 10 irmãos, eu a segunda mais nova.
De todos eles, minha irmã (a que morreu) e eu ficamos aqui em Mapasingue. Ela tinha 67 anos e era como uma mãe para mim. Seu nome era Inés Salinas.
Sou casada e tenho quatro filhos. Ela tinha cinco. Nós duas tivemos netos. Morávamos quase em frente uma da outra e nos viamos todos os dias.
Até antes da quarentena, estávamos todos bem.
Quando a quarentena começou, ficamos em casa e, como eu via minha irmã sair de casa há uma semana, perguntei como ela estava à minha sobrinha. Ela disse: ‘Minha mãe está se sentindo um pouquinho estranha’.
Eu então fui vê-la, mas ela estava bem. Inés me disse: ‘Não, irmã, eu estava um pouco mal, mas já estou me recuperando’. De repente, dois dias depois, ela teve uma recaída e minha sobrinha me disse: ‘Tia, minha mãe está doente, ela não conseguia respirar ontem à noite’.
Fui vê-la em casa e ela me disse ‘Irmã, me sinto mal, fico muito agitada, fico sem fôlego’.
E meu cunhado também ficou estranho. Ele também não conseguia respirar e sentia algo forte na barriga.
Eu disse a ele ‘Que há de errado com você?’
‘Não sei, mas acho que vou morrer’, ele respondeu.”
Saiba mais em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-52166498
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