Antonio Gramsci faleceu neste dia em 1937. Há décadas, os conservadores, como Olavo de Carvalho e Roger Scruton, apresentam um dos maiores teóricos marxistas do século XX como símbolo de uma grande ameaça a ordem capitalista – e eles não estão errados.
Por Daniela Mussi e Alvaro Bianchi
Em meados dos anos 1980, o intelectual conservador inglês Roger Scruton fundou a revista The Salisbury Review, na qual publicou uma série de artigos sobre intelectuais “de esquerda” do século 20. György Lukács, Louis Althusser, Herbert Marcuse e Antonio Gramsci foram abordados em sequência na coletânea intitulada Tolos, fraudes, alucinados: pensadores da esquerda (1984). Scruton julgava haver uma guerra ideológica em curso. Para ele, o conceito marxista de hegemonia podia ser definido como uma ferramenta da “ideologia do domínio de classe” dos marxistas, responsáveis por inculcar – ou “legitimar” – uma ideia de autoridade. Por esse motivo, “nenhum pensador político na conjuntura europeia e norte-americana moderna pode ignorar as mudanças impostas à nossa vida intelectual pelos escritores e ativistas da esquerda”, os propagadores da “hegemonia”.
Ao discutir a esquerda emergente na Europa a partir da segunda metade dos anos 1960, Scruton considerava estar diante de um consenso inédito que ameaçava os “costumes, as instituições, a política dos Estados ocidentais” e renovava a “teoria e a prática do comunismo”. Alertava, assim, para o problema do “retorno do jacobinismo”, sintetizado agora “emocionalmente” sob uma nova forma, não mais como disputa partidária pela condução das massas, mas como conjuração que “secretamente alcançará o objetivo comum” sem uma liderança definida de maneira estável.
A principal referência política de Scruton eram os levantes estudantis de 1968 na Europa e nos Estados Unidos. Em sua opinião, essas manifestações junto com a nova edição dos Cadernos do cárcere, em 1975, e a difusão notável de escritos do autor em cursos universitários e organizações de esquerda levaram ao renascimento da influência de Gramsci. Este renascia como teórico político, crítico cultural, filósofo e cânone revolucionário entre os círculos intelectuais e políticos ávidos por uma “orientação moral e intelectual”.
Gramsci teria elaborado, desse modo, uma nefasta teoria da imposição da legitimidade do intelectual de esquerda sobre o homem comum, uma estratégia na qual a liderança partidária clássica perdia espaço diante das transformações “graduais” operadas pelos especialistas na condução das massas.
Na visão de Scruton, as ideias gramscianas permitiam aos ativistas pós-1968 enxergarem a si mesmos como “intelectuais” e “legisladores”. O que Gramsci chamava de “revolução passiva” – o processo de mudanças graduais que desbloqueariam imperceptivelmente o surgimento de uma nova ordem social – não passava de uma versão esquerdista da boa e velha circulação das elites. Assim, a originalidade do pensamento gramsciano era perceber a existência de uma “nova hegemonia”, ao propor o domínio de classe como fruto do encontro de “duas forças”, os intelectuais de esquerda e as “massas”. Gramsci teria elaborado a verdadeira teoria do fascismo, ou seja, a estratégia política de conformação de uma “unidade ideal” capaz de manipular a cultura e, por meio dela, impulsionar transformações políticas e econômicas de longo prazo.
Saiba mais em: https://jacobin.com.br/2020/04/os-inimigos-de-gramsci/
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