Por Gwynne Dyer
Se eu fosse uma ditadora mundial, eu colocaria o Brasil imediatamente em uma quarentena total: ninguém entra, ninguém sai. E eu o manteria isolado até que a) prendessem o presidente Jair Bolsonaro; b) impusessem um lockdown nacional rígido por ao menos dois meses; e c) vacinassem todos no país (todos os 214 milhões deles). E então veríamos.
Teriam que prender Bolsonaro primeiro porque ele se recusa categoricamente a decretar qualquer tipo de lockdown. Ele também considera as vacinas como “coisa de maricas” e não vai apoiar um programa nacional para vacinar a população. Alguns governadores estão tentando comprar vacinas para suas próprias populações locais, mas ele os repreende publicamente como covardes por se preocuparem com uma “gripezinha”.
Bolsonaro é um Donald Trump com pernas de pau, e é amplamente responsável pelo incrivelmente alto número de mortos por covid-19: mais de um quarto de milhão de mortos. Os EUA ainda estão na liderança com meio milhão de mortes – 1.600 por milhão em comparação com os 1.250 por milhão do Brasil – mas a taxa de mortalidade por covid nos EUA está caindo rápido desde que o presidente Biden tomou posse, ao passo que a do Brasil está subindo rapidamente.
Por causa da alta taxa de infecção no Brasil, o país se tornou uma panela de pressão ideal para novas e, às vezes, mais perigosas versões do coronavírus. O país já tem duas “variantes” conhecidas de interesse. A mais recente e mais preocupante, a P.1, provavelmente surgiu em Manaus, e está agora desenfreada pela Amazônia brasileira.
A P.1 também está começando a andar pelo resto do mundo. Seis casos saíram do mesmo voo vindo do Brasil para Londres recentemente, causando um susto nacional até que fossem todos rastreados. O que torna tudo tão assustador é que ela dissemina duas vezes mais rápido do que versões iniciais da covid – e parece ser capaz de infectar novamente as pessoas que já tiveram a covid.
Se pode fazer isso, provavelmente também pode contornar a imunidade conferida por vacinas existentes. Não há evidência de “disseminação comunitária” da P.1 em outros países ainda – isso é, de infecções transmitidas entre pessoas locais que não viajaram para fora – mas é somente uma questão de tempo, a não ser que as pessoas parem de viajar para e do Brasil.
E o que Jair Bolsonaro diz? Enquanto o Brasil registrava o maior número de mortes por covid desde o início da pandemia na última quinta, ele disse: “Chega de frescura, de mimimi. Vão ficar chorando até quando? Até quando vão ficar dentro de casa, até quando vai se fechar tudo? Ninguém aguenta mais isso. Lamentamos as mortes, repito, mas tem que ter uma solução. Tudo tem que ter um responsável”.
E sua solução é “virar homem”, aceitar meio milhão ou até um milhão de mortes – e impor essa solução para todo mundo no mundo também, porque ele certamente não vai proibir viagens ao exterior.
Não dá para conversar com Bolsonaro, e não há de se esperar que os brasileiros o removam do cargo. Como a sã maioria estadunidense na era Trump, eles prefeririam aguentar as trapalhadas e crimes do homem louco até o fim de seu mandato do que usar força contra ele e acabar com a constituição. Mas se a P.1 espalhar, isso pode significar que todo mundo no mundo pode ter que ficar em lockdown até, ao menos, o final do ano.
Ninguém vai invadir o Brasil para remover Bolsonaro, embora ele represente uma grande e muito real ameaça. Mas o que todo mundo pode fazer é isolar o Brasil. Nenhuma lei nacional ou internacional impede que outros países proíbam o pouso de voos vindos do Brasil em seus territórios. Então façamos isso. Agora. Sem exceções.
Felizmente, existem poucas rotas usadas com frequência saindo do Brasil, e os vizinhos do país têm muitos incentivos para fechá-las. O comércio marítimo pode continuar, contanto que cada navio que deixe o Brasil fique, ao menos, duas semanas no mar antes de aportar (ou mais, se algum membro da tripulação desenvolver sintomas de covid).
Até os carregamentos aéreos podem ser permitidos, especialmente se os governadores puderem comprar vacinas do exterior, contanto que não contem com passageiros e a tripulação seja rigorosamente isolada na saída e na chegada do voo. Ninguém quer punir os brasileiros, que já estão sofrendo muito com Bolsonaro. Nós só não queremos que ele mate nossos pais também.
Quanto tempo deveria durar a quarentena? Ao menos até que tenhamos compreendido a real ameaça da P.1 e de outras variantes brasileiras, que tenhamos desenvolvido vacinas que funcionem contra elas, e que tenhamos tido tempo para inocular nossas próprias populações. Então, ao menos até o final do ano, mas consideravelmente mais tempo se os brasileiros não controlarem sua taxa de infecção.
Há um debate legítimo começando a surgir sobre se devemos tentar erradicar esse coronavírus inteiramente (como a SARS e a MERS) ou apenas buscar uma “contenção” de longo-prazo (como a gripe). Não é sobre isso. É sobre evitar um agravamento mortal. O mundo consegue fazer isso facilmente, se quiser, e Bolsonaro não pode fazer nada.
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