Negligência sanitária do governo e fim do Auxílio Emergencial ampliarão drama dos mais pobres. Pode haver revoltas sociais. Esquerda precisa concentrar-se nos problemas da maioria, em vez de se se entregar aos cálculos eleitorais
Valério Arcary, em entrevista a João Vitor Santos e Patricai Fachin, no IHU Online
O resultado das eleições municipais deste ano, apesar de indicarem a derrota do PT e o enfraquecimento político do presidente Jair Bolsonaro, “não autorizam nem referendam a conclusão de que os extremos foram derrotados”, diz Valério Arcary. Segundo ele, as análises que tentam igualar o desempenho dos candidatos bolsonaristas e dos da esquerda, fazem “uma nivelação e um simplificação” do que ocorreu.
Na entrevista a seguir, concedida por WhatsApp à IHU On-Line, ele afirma que o bolsonarismo, expresso de forma dispersa através de várias candidaturas, saiu enfraquecido, mas o Centrão que apoia o presidente teve uma vitória eleitoral. “Se o bolsonarismo foi política e eleitoralmente derrotado e sai enfraquecido, o Centrão governista teve uma vitória eleitoral: ampliou o número de prefeituras, sobretudo nos pequenos municípios, e elevou sua influência sobre a proporção do eleitorado que é governado por esta floresta de pequenos partidos de aluguel e, portanto, o controle orçamentário”, afirma.
Já a situação eleitoral da esquerda, apesar de o PT não vencer em nenhuma capital, precisa ser analisada em retrospectiva aos dois últimos pleitos. Desta perspectiva, acentua, a esquerda “teve uma recuperação relativa” e, com o protagonismo exercido pelo PSOL, “a relação política de forças no interior da esquerda mudou”, assegura.
Arcary também faz uma breve projeção para o cenário político, social e econômico do país no próximo ano e estima que “2021 será um ano de grandes conflitos sociais no Brasil”, especialmente por conta dos efeitos da pandemia e das incertezas acerca da política pública que irá substituir o Programa Bolsa Família.
Em relação ao futuro político para 2022, ele é categórico: “Qualquer prognóstico para as eleições de 2022 seria precipitado”.
Valério Arcary é graduado em História pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP e doutor em História Social pela Universidade de São Paulo – USP. É professor aposentado do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo – IFSP.
Valério Arcary e Altamir Tojal estarão participando da palestra online intitulada “Eleições 2020. Novidades, perspectivas e impasses tendo em vista as eleições de 2022”, na próxima quinta-feira, 03-12-2020, no canal do IHU no YouTube. Mais informações aqui.
Confira a entrevista
Quais foram os aspectos fundamentais que marcaram o segundo turno das eleições municipais?
Podemos resumir em algumas notas prévias os aspectos fundamentais que merecem ser destacados como conclusões deste segundo turno, lembrando que as eleições locais são diferentes das eleições gerais, quando se elege simultaneamente a presidência da República, o Congresso e os governadores. As eleições locais são muito distintas porque são introduzidos fatores de distorção que correspondem aos conflitos da pequena política local. Por outro lado, também é necessário alertar que um processo de eleição municipal em milhares de municípios, quando os números são totalizados, produz uma distorção porque há um Brasil profundo, ou seja, estamos falando de um país continental, como muito poucos no mundo. O Brasil é muito diferente do Uruguai, do Chile ou da Argentina, por exemplo. Além disso, o Brasil, entre os países periféricos, tem uma taxa de urbanização muitíssimo elevada, acima de 85% da população. Isso faz com que cerca de cem cidades tenham mais de 450 mil habitantes e, dentro delas, há 20 cidades com um milhão ou mais de habitantes e, dentre essas 20 cidades, existem duas grandes regiões metropolitanas que estão entre as dez ou 15 maiores do mundo. Isso posto, vamos entrar nas observações mais importantes.
Saiba mais em: https://outraspalavras.net/outrasmidias/valerio-arcary-esperem-um-2021-quente/
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