Clipping

Amazônia e o efeito dominó da tragédia climática

Do degelo na Groenlândia à devastação da Amazônia, novo estudo mostra como fenômenos “locais” podem impactar regiões a milhares de quilômetros de distância. Sistema terrestre é complexo – e ações humanas aprofundam a catástrofe

Por Alejandra Martins

A Groenlândia está localizada a mais de 8 mil quilômetros da Amazônia e a mais de 18 mil quilômetros da Antártida.

Mas as mudanças climáticas nestas regiões podem estar profundamente interligadas.

Os cientistas já alertaram que o aquecimento global pode desencadear os chamados pontos de não retorno, ou tipping points, pontos críticos a partir dos quais as mudanças em um sistema podem ser abruptas e irreversíveis.

E agora um novo estudo indica que esses pontos de não retorno no sistema terrestre também podem se desestabilizar entre si, podendo levar a um efeito dominó de consequências climáticas globais.

Os autores do estudo, do Instituto Potsdam de Pesquisa de Impactos Climáticos, na Alemanha, simularam mais de três milhões de cenários possíveis em diferentes temperaturas.

E descobriram não apenas que um terço das simulações mostra efeitos em cadeia de pontos de não retorno, como que esses efeitos dominó também ocorrem com um aumento de temperatura de apenas 2 graus em comparação com a era pré-industrial.

As projeções atuais indicam que, caso não sejam tomadas medidas urgentes, o planeta caminha para um aumento de temperatura superior a 3 °C até o fim do século.

Ações desestabilizadoras

O estudo do Instituto Potsdam considera quatro possíveis pontos de não retorno e suas interações, com efeitos que podem ser desestabilizadores para outro sistema, estabilizadores ou ainda não compreendidos.

“O número e a força das interações desestabilizadoras são maiores do que os vínculos estabilizadores, de acordo com os dados usados ​​no estudo”, explica Nico Wunderling, um dos autores do estudo, à BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC.

O cientista destacou que o modelo computacional é “relativamente simples”, pois considera apenas quatro pontos críticos, mas permitiu realizar milhões de simulações.

Gelo na Groenlândia
O derretimento da camada polar da Groenlândia é um dos possíveis pontos de não retorno que podem desestabilizar outros ecossistemas

Os quatro tipping points estudados são: o derretimento do gelo na Groenlândia, as mudanças nas correntes do Atlântico, as modificações na Amazônia e o derretimento do gelo na Antártida Ocidental.

Antes de explorar suas possíveis interações, vamos ver separadamente o que a ciência diz sobre cada um desses possíveis pontos de não retorno.

1. Derretimento de gelo na Groenlândia

“Atualmente, há evidências com base em observações de que a massa de gelo da Groenlândia está encolhendo a um ritmo acelerado devido a uma combinação do derretimento da superfície e o desprendimento acelerado de icebergs”, explica à BBC News Mundo Tim Lenton, professor de mudança climática e sistemas globais na Universidade de Exeter, no Reino Unido.

Lenton também destacou um estudo deste ano, segundo o qual parte do gelo na Groenlândia está mostrando “sinais iniciais consistentes com a aproximação de um ponto de não retorno” pelo seguinte processo de retroalimentação: o derretimento reduz a altura da massa de gelo, expondo-a ao ar mais quente em altitudes mais baixas, o que por sua vez causa maior perda de gelo.

2. Derretimento do gelo na Antártida Ocidental

“Também há evidências observacionais consistentes com o fato de que parte da plataforma de gelo da Antártida Ocidental — a Geleira da Ilha Pine e a Geleira Thwaites, na região do Mar de Amundsen — pode ter passado potencialmente de um ponto de não retorno no que diz respeito ao retrocesso irreversível da linha de apoio (ponto em que uma massa de gelo ao ser introduzida no mar se separa da rocha e começa a flutuar no oceano)”.

Rachadura de um iceberg que se partiu da geleira da Ilha Pine, na Antártica Ocidental
Esta imagem de fevereiro de 2020 foi capturada pela Agência Espacial Europeia e mostra a rachadura de um iceberg que se partiu da Geleira da Ilha Pine, na Antártida Ocidental

“Os modelos indicam um recuo irreversível com os níveis atuais de aquecimento do oceano e sugerem que a perda desta parte do gelo na Antártida Ocidental pode desestabilizar grande parte do resto.”

3. AMOC, o sistema de correntes do Atlântico

Um elemento-chave do sistema terrestre que pode interligar mudanças a milhares de quilômetros de distância é a Circulação Meridional de Capotamento do Atlântico (AMOC, na sigla em inglês), mais conhecida como corrente termohalina atlântica.

“A AMOC é um sistema de correntes no Oceano Atlântico que transporta águas quentes para o norte e águas frias para o sul”, diz a oceanógrafa física mexicana Alejandra Sánchez-Franks à BBC News Mundo.

A cientista trabalha no programa RAPID MOC do Centro Nacional de Oceanografia do Reino Unido, que monitora esse sistema de correntes.

“Em geral, a corrente flui na superfície, que tem aproximadamente 1000 metros de espessura, e move essas águas quentes e rasas para o norte onde se tornam águas frias e profundas que depois são deslocadas de volta para o sul.”

Saiba mais em: https://outraspalavras.net/outrasmidias/amazonia-e-o-efeito-domino-da-tragedia-climatica/

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