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Tentativa de golpe que forteleceu Hugo Chávez faz 20 anos

Entre 11 e 14 de abril de 2002, militares venezuelanos sequestraram o presidente e anularam a Constituição bolivariana. Mas o golpe fracassou e acabou tendo o efeito de fortalecer ainda mais o chavismo.

Por: Mónica Nanjari | Foto: Chico S/Picture alliance

Em 11 de abril de 2002 iniciou-se na Venezuela uma série de acontecimentos que influenciariam a história futura do país. A morte de quase 20 cidadãos em meio a uma manifestação em Puente Llaguno fez que, no dia seguinte, o presidente Hugo Chávez deixasse a sede do Executivo, sendo transferido para diversos locais, até ficar preso na ilha Oricha.

O Estado-Maior anunciou a renúncia do mandatário. Embora isso tenha sido posteriormente desmentido, o empresário Pedro Carmona assumiu como presidente interino e anulou a Constituição bolivariana. Graças à protestos em massa dos venezuelanos, ação de alguns militares leais ao líder e à pressão internacional, Chávez acabou sendo liberado e retornou ao Palácio de Miraflores em 14 de abril.

As ocorrências desses quatro dias estão marcadas por acusações cruzadas e por ações dos golpistas e dos partidos oposicionistas. No fim, o presidente se aproveitou delas para dar à sua figura um status de caudilho, do “herói de que a Venezuela precisava”.

Longe de debilitar ou alienar Chávez, essa tentativa de golpe terminou por fortalecê-lo e torná-lo transcendente, é a visão do historiador Agustín Blanco Muñoz, professor da Universidade de Caracas, segundo quem o “intento golpista se produziu num momento em que havia uma profunda desestabilização da ordem institucional venezuelana”.

“Esse triunfo do comandante Chávez alimentou sua figura de salvador dos venezuelanos. Mas na realidade não é assim: com seu retorno ao poder ele se tornou mais potente e prepotente, na linha do caudilhismo, ele próprio foi-se sentindo, mais libertador. O chavismo conseguiu um espaço aberto desde a intentona de 2002, o que foi posteriormente ratificado pelo referendo revocatório de 15 de agosto de 2004, em que Chávez venceu.”

Golpe profundo para a oposição

Para o politólogo venezuelano Yosbert Vásquez, nenhum governo iniciado nessas condições pode ser bom, já que “atrás de um golpe de Estado sempre há uma crise”. O fracasso golpista se deveu a contradições de seus próprios verdugos e opositores que o líder bolivariano teria utilizado para regressar ao poder.

“O golpe de Estado de 2002 deixou Chávez mais forte, sem dúvida alguma, pois se revisamos as enquetes históricas posteriores, constatamos que sua aceitação entre os venezuelanos cresce, em vez de baixar.”

Vásquez detecta três efeitos da tentativa de golpe: “Primeiro, a debilitação das lideranças mais importantes entre as forças oposicionistas do país. Seu comportamento durante as horas em que Chávez esteve sequestrado fez que eles mesmos caíssem em deslegitimação, o que até o dia de hoje lhes dá um saldo muito negativo.”

“Em segundo lugar, as instituições do Estado venezuelano se converteram mais num braço político do que num braço articulador das necessidades dos cidadãos. E por último, paradoxalmente, esse golpe confere a Hugo Chávez uma transcendência na comunidade internacional.”

Mural com rosto de líder Hugo Chávez, em Barinas, Venezuela
Mural em Barinas, estado natal de Chávez: líder continua presente na política venezuelanaFoto: Matias Delacroix/AP/picture alliance

Legado chavista

O sistema político e econômico deixado por Hugo Chávez na Venezuela após sua morte determinou o destino da nação sul-americana. Há décadas ela enfrenta uma grave crise econômica, que só piora com o passar dos anos e até o momento não tem uma saída definida. Por isso, o legado chavista tem mais obscuridade do que clareza.

Agustín Blanco enfatiza o elemento de complexidade: “É difícil falar de legado em sentido positivo, neste caso. Porque, no contexto desse projeto de socialismo-comunismo, sem ser anticomunista, só posso dizer que, desde o fato histórico do golpe de Estado contra Chávez, nestes 20 anos não se viram melhoras, nem mudanças que se possam considerar acertos ou avanços.”

“O que há, antes, é uma continuação dos males, a começar pela instabilidade institucional, seguida da repressão permanente e da perda diária de liberdades, além de um aumento da insegurança”, analisa o historiador venezuelano.

Por sua parte, o cientista político Yosbert Vásquez observa que “se falamos de legado, tratando de ser justos, do ponto de vista sociopolítico Hugo Chávez levou os venezuelanos a terem maior interesse no sistema político, no poder. Antes de Chávez, havia uma apatia por tudo o que se refere ao Estado.”

“Também creio que impulsionou, ou tentou impulsionar, algumas mudanças na estrutura do Estado venezuelano, com a simplificação da burocracia, a tentativa de outorgar maior organicidade e poder às mãos do cidadão. Porém logo tudo isso se desvirtuou, e a intenção inicial se converteu numa aberração, que terminou numa liderança política nociva à população.”

 

Veja em: https://www.dw.com/pt-br/tentativa-de-golpe-que-forteleceu-hugo-ch%C3%A1vez-completa-20-anos/a-61439906

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